Caso Neymar: Um crime que o mundo viu, menos as autoridades do Brasil

Jorge Béja
 
Neste Brasil e Colômbia, pela Copa do Mundo 2014, na Arena Castelão, em Fortaleza (arena mesmo, como aquelas onde se enfrentavam feras e gladiadores nos antigos anfiteatros romanos), o nosso Neymar foi vítima de crime de lesão corporal, previsto no artigo 129 do Código Penal Brasileiro (CP). E lesão corporal de natureza grave, por ter causado ao atleta “incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias“, circunstância que o § 1º, nº I, do artigo 129 do CP faz alterar a pena que passa a ser “reclusão de um a cinco anos“.

O crime tem autoria mais do que conhecida. Neymar foi gravemente lesionado pelo jogador colombiano Zúñiga. E de forma covarde e intencional. Toda agressão pelas costas é covarde. Mais ainda por impossibilitar que a vítima se defenda. Intencional porque a disputa pela bola aérea ou rasteira, ainda que viril, não justifica a brutalidade cometida contra Neymar. Foi mesmo para derrubar. Para tirá-lo do jogo. Tanto foi que derrubou. E colocou Neymar fora da Copa.

O PROCEDIMENTO LEGAL

Termina a partida, Zúñiga deveria ter sido levado preso à delegacia de polícia da região onde está localizada a Arena Castelão e lá ser autuado por lesão corporal e, em seguida, liberado mediante pagamento de fiança. Isso se a Autoridade Policial não decidisse mantê-lo preso até que o  Juiz, para quem o auto de prisão em flagrante fosse logo enviado, resolvesse ou não, expedir a ordem de soltura.  Décadas atrás, quando era titular da 18ª Delegacia de Polícia, que fica da Rua Barão de Iguatemi (Praça de Bandeira, RJ), o delegado Maurílio Moreira, com sua equipe e a serviço, comparecia ao Estádio do Maracanã para assistir aos jogos.

E não foram poucas as vezes que o Dr. Maurílio, depois do jogo, foi ao vestiário do estádio para prender e conduzir à delegacia jogadores de futebol que, durante a partida, causaram lesão corporal ao atleta da equipe adversária. Certa vez indagado por que agia com tanto rigor, o Dr. Maurílio respondeu:

O Estádio do Maracanã se encontra dentro da área da circunscrição da qual sou a autoridade policial. Eu estava no estádio, vi e agi. Cumpro a lei“. A propósito: quem agride e lesiona outra pessoa, na rua ou em qualquer lugar, e a polícia chega não é conduzido à delegacia da área para ser autuado? 

SEM DIFERENÇA, SEM EXCEÇÃO

As lesões corporais, leves ou graves, que jogadores de futebol sofrem durante uma partida, não estão fora do alcance das leis penais, que não as excepcionam. Para que estivessem, seria preciso que as lesões, em tal circunstância, fossem descriminalizadas. O Direito Penal não deixa de considerar crime condutas censuráveis de atletas que durante uma partida de futebol(ou outro esporte qualquer) infrinjam a lei penal. E sendo a lesão corporal de natureza grave, o crime é de ação pública incondicionada.

Não depende de queixa ou representação do ofendido. Por se constituir crime a que o Código Penal prevê pena máxima superior a dois anos, está fora do âmbito da competência dos Juizados Especiais Penais,  cuja lei (nº 9099/95) exige que a própria vítima Neymar apresentasse queixa à Polícia ou ao Ministério Público (artigo 88). Não foi, nem é o caso.  

Basta que a Autoridade dele tenha tomado conhecimento. E se presenciado o crime, com muito mais razão e obrigatoriedade, prender o infrator. Se não tanto, instaurar o competente inquérito e/ou a ação penal. A lesão corporal de natureza grave que vitimou o nosso Neymar não dependia e continua a não depender, de queixa-crime do próprio Neymar, para que Zúñiga fosse preso e permanecesse no Brasil até final julgamento. Parece que agora é tarde. Pena que o delegado carioca dr. Maurílio Moreira não estava lá no Castelão. Mesmo sendo Autoridade Policial do Rio, ele prenderia o infrator e o conduziria à presença de seu colega do Ceará. Afinal, o Mundo viu, menos as Autoridades do Brasil.    
 
 

26 thoughts on “Caso Neymar: Um crime que o mundo viu, menos as autoridades do Brasil

  1. Ha pouco eu escrevi que o jogador que lhe lesionou Neymar era um bandido, retiro isso, é regra nos jogadores esses tipos de jogadas. Lembrei-me de quando o nosso heroi Leonardo jogando pela seleçao brasileira, na Copa 94, com uma co?tovelada ele tirou o jogador da seleçao americana do resto da Copa, e a imprensa americana, que a nossa tenta copiar, nao fez esse escandalo todo. Alias foram ate bem equilibrados com o fato, o juiz puniu, Leonardo nao foi condenado a morte nem a prisao perpetua, e a vida seguiu normal., ate a seleçao chegou a ser campeã

  2. O Doutor Jorge Béja em solidariedade a todos que como eu estão torcendo pelo sucesso do Brasil nesta Copa das Copas expressou também seu desabafo. Fico imaginando: Como ficariam os eventos de UFC e assemelhados que fazem tanto sucesso em uma parcela do público no Brasil nos últimos tempos, caso fosse aplicada a lei com o rigor máximo?

  3. Dr. Jorge Béja, o que aconteceu com Neymar, foi o mesmo que
    aconteceu com Hernane do Flamengo. No futebol é comum parar
    uma jogada com falta: quem vem por trás empurra o adversário com
    as mãos ou dá uma peitada para derruba-lo. Vir por trás em velocidade
    e colocar o joelho na frente para atingir o adversário, é má intenção, é
    maldade, é para tirar o jogador de campo, com risco de aleija-lo.
    Independente de qualquer outro procedimento, no caso Neymar, caberia
    a FIFA, no mínimo afastar definitivamente do futebol o Zúñiga, assim também
    a CBF deveria proceder no caso do Hernane

  4. Embora eu não seja chegado ao futebol, por este ter regrinhas idiotas como o impedimento por exemplo, o lance do colombiano foi criminoso.

  5. Com todo o respeito ao Dr Béja, o que aconteceu com o Neymar é prática do futebol. Se fossem tomadas ações policiais, a metade dos jogadores estaria na cadeia. Alás, a saída do Neymar, foi uma perda ou uma grande oportunidade para arrumar o esquema de jogo da seleção, usando um jogador que jogue para o time e não para a torcida?

  6. Opiniões a parte, o que tenho ouvido de comentários absurdos. Inclusive alguns com origem em antigos árbitros.
    Um deles é o uso do braço, da mão e dos agarrões dentro da área, ou fora. Argumentar que futebol é esporte de contato só mostra má fé. Contato não pode ser comparado com agressão, impedir o adversário de jogar.
    No fundo, os nossos árbitros – e alguns de fora também, são licenciosos. Bastaria marcar um pênalti aqui outro ali e “os artistas” parariam de ficar se agarrando. Falta postura aos árbitros.
    Acredito que o correto seria analisar todas as agressões. Por vezes o juiz não está bem colocado e o bandeira “come mosca”.
    Alem dos pontapés, dos carrinhos, as cotoveladas, socos e bofetadas também devem ser coibidas.
    Como em outros esportes, quem deve levar chutes, pontapés, cabeçadas e tudo mais é a bola e não os jogadores.

  7. Caro Jorge Béja,

    “O Direito Penal não deixa de considerar crime condutas censuráveis de atletas que durante uma partida de futebol(ou outro esporte qualquer) infrinjam a lei penal. E sendo a lesão corporal de natureza grave, o crime é de ação pública incondicionada.”

    -Será que terão que acabar com o MMA (vale-tudo), o boxe e as artes marciais no Brasil?

  8. A agressão do jogador colombiano não se compara em nada a cotovelada feita pelo Leonardo, lateral esquerdo da seleção brasileira, no jogador dos EUA, Tab Ramos, em 94. Tantas lamurias agora quando, ao meu ver, a agressão do Leonardo foi muito, mas muito mais acintosa e proposital . É lamentável a falta e o que passa o Neymar. Contudo, o povo está esquecendo das mortes acontecidas na mesma semana que ceifaram vidas sob um viaduto.

  9. O renomado advogado e jurista Jorge Beja analisou a jogada desleal do jogador colombiano com maestria pelo ângulo do Direito Penal. Sob esse arrazoado, nenhuma dúvida acerca das medidas penais contra o jogador. O lateral foi para jogada com o joelho levantado, logo, em momento nenhum visou a bola e sim parar o nosso maior craque, objetivo plenamente alcançado.

    Lógico, que não sendo burro, o lateral jamais admitirá que a joelhada foi uma fatalidade, talvez uma circunstância do futebol, jogo de trancos e esbarrões. No entanto, causa espécie, a atitude do árbitro, que sequer deu o cartão amarelo, pois cabia no ato um cartão vermelho.

    Dizem, que a FIFA orientou os árbitros a economizar nos cartões e os juízes estão cumprindo direitinho. Foram cometidas mais de 60 faltas em 90 minutos.

    Não há que se comparar a cotovelada do jogador Leonardo, que foi punido com o vermelho e o jogador lesionado não ficou fora do jogo, ao contrário de Neymar, que está fora da COPA e por pouco a joelhada deixou de atingir a coluna do craque.

    Se alguém espera alguma atitude da FIFA, perca a esperança. A entidade puniu o jogador Suarez do Uruguai, pela mordida, porque o fato foi acintoso demais.

    Este caso é emblemático, atestando que, o importante no Mundial de Futebol é o espetáculo, a fantasia, o comércio. Os atletas não passam daqueles gladiadores romanos, que iam para arena sabendo que ou matavam ou morriam.

    O jovem craque precisa ficar mais atento nas partidas e principalmente evitar as provocações, pois sempre haverá um adversário disposto a quebrar suas pernas e seu calcanhar para que ele saia da disputa. Essa é a tônica das partidas, notadamente após as oitavas de final.

    • Roberto, o Tab Ramos ficou algumas semanas no hospital. A cotovelada o tirou da Copa e por muito tempo do futebol, houve fratura no cranio e na face, ele ficou 6 meses em recuperaçao
      Hoje ele faz parte da comissao tecnica da seleçao treinada pelo alemão Klinsmann, esteve nesa Copa aqui no Brasil.

  10. Quando o Zidane deu a cabeçada no italiano houve igual idéia. O Povo francês não aceitou. Ocorreria o mesmo com a Colômbia.

    Os juízes devem ser mais rigorosos, e conduzir as partidas de modo a expulsar e dar cartões amarelos com mais frequência. E darem punições severas para os atos nos quais houvesse intenção premeditada de prejudicar. No caso do Luís Suarez, penso que não houve premeditação.

  11. Caro Dr. Beja, concordo com Vª Sª em toda a estensão do texto. Quando garoto jogava minhas peladas com os colegas e com times de outros bairros , e se acontecesse algo desse tipo no jogo , era fim de jogo mesmo pois a porrada comia solto, todo mundo brigava,e iriam querer quebrar o autor de tamanha covardia. Não faltava no final do embrólio gente machucada e sangrando indo pra casa , muitas vezes depois de chamarem a policia. Ja vi gente saindo de camburão em campo de varzea. Portanto hoje a covardia campeia , podendo levar um jogador ao óbito … tudo pelo dinheiro. O Sr. esta corretíssimo , cana neles.

  12. Pingback: JOGADOR QUE LESIONA ADVERSÁRIO DEVERIA SER PRESO PELO DELEGADO DE POLÍCIA DA CIRCUNSCRIÇÃO DO ESTÁDIO DO CASTELÃO EM FORTALEZA, O CASO NEYMAR | www.baraunanoticia.com.br

  13. Quanta bobagem, parece que nunca viu futebol! O próprio Neymar deu uma cotovelada no primeiro jogo. Para implicar com os inocentes eu costumo afirmar que o futebol é mais violento do que o boxe! O oponente é pego invariavelmente distraído! A vingar esta ideia de criminalização da violência em campo, todo time teria que entrar no “verde esmeraldino” com um habeas corpus preventivo e uma banca de advogados!
    PS: A entrada criminosa do Zuniga não foi nem no Neymar, foi no Hulk, um golpe no joelho “wireless”: Desferido no jogador e que eu senti o calafrio!

  14. Perfeito, Béja. Mas a pergunta do Francisco Vieira, até que procede, como curiosidade.

    “Será que terão que acabar com o MMA (vale-tudo), o boxe e as artes marciais no Brasil?”

    É lógico que o propósito das artes marciais é outro e o “esporte” tem, por definição, estraçalhar com os adversários. Mas como a Lei age ou deveria agir nesses casos?

    • Obrigado Ricardo Froes por ter lido o artigo e formulado a pergunta. Luta de Boxe, Luta Livre, Judô e outras práticas esportivas, inclusive o futebol, podem causar lesões à integridade corporal e até mesmo a morte dos contendores. Haverá crime se o participante cometer excesso, ou quando agir intencionalmente, sem obedecer as regras esportivas. Genericamente não há crime. Particularmente, sim.
      Jorge Béja

        • Nobre Francisco de Assis. É justamente pelo fato de o Código Penal não fazer diferenciação, que toda lesão corporal é crime. E crime de ação pública incondicionada. A vítima nem precisa representar, se queixar, perante a Autoridade Policial. Basta que a Autoridade tenha conhecimento da ocorrência do crime para que o Estado intervenha. No caso em que a lesão deixe a vítima impedida de trabalhar por mais de 30 dias, a lesão corporal passa a ser grave. O Código Penal não excepciona, não descriminaliza a lesão corporal decorrente da prática de competição esportiva, que não se constitui excludente. Porém, é preciso que a lesão tenha sido intencional, como se avista no caso do Neymar. Ou que tenha sido fruto da inobservância das regras do esporte praticado.
          Muito grato por ter lido o artigo.
          Jorge Béja

  15. Endeusaram um jogador, como é hábito no Brasil, e não a equipe inteira. Ao fazerem isto, colocam em risco não somente a integridade do atleta, mas o desdém pelos demais componentes da equipe. Como inventaram o termo “inteligência emocional”, eu diria que tal atitude coletiva revela burrice emocional.
    É claro e evidente que o jogador colombiano parece haver sido instruído pelo técnico de sua equipe para proceder como procedeu. Mais ou menos assim: “vamos neutralizar o tal “craque” que eles tanto endeusaram, que eles se transformarão em um time sem chance.”
    Mas os brasileiros, de tão emotivos que são, não aprendem. Já haviam endeusado e vitimado o ministro Joaquim Barbosa, do STF.
    E não aprendem mesmo. Agora estão aflitos para encontrar um “craque” que substitua, ou mesmo supere, o que tombou. Tem gente que nunca aprende.

  16. Aprende sim Lucelia, acontece que sempre teremos um percentual de obtusos que endeusarão um Joaquim um Neymar, uma rainha Elizabeth, um rei Juan Carlos, um rei Pele, um rei Roberto Carlos, essas pessoas vivem de um tipo de dependencia emocional ou, como voce bem define, burrice emocional. Eu admiro um Pele, um Roberto, um Chico Buarque, um Lula, um Getulio, um Zerbine, um Jatene, mas longe de mim endeusa-los, sao figuras excepcionais, que um Neymar esta muito longe de chegar perto ainda, que um Joaquim nem serve para engraxar-lhes os sapatos. Mas tem quem a ambos endeusam

  17. Dr Béja, suas informações são precisas e preciosas. Entendo também que se a lesão corporal for dolosa (ressalvadas as artes marciais, dentro das regras) é cabível que seja utilizado o código Penal, independente de qualquer outra punição pelos tribunais esportivos. O delegado Maurílio Moreira agia assim mas quantos de seus pares faziam e fazem o mesmo? E ainda, caro Béja, estando o Mineirão dentro da área sob a Lei Geral da Copa, haveria conflito de interesses entre as autoridades locais e as demandadas pela FIFA? Como poderia agir o delegado citado no episódio Neymar se no Maracanã percebi que até os PMs fardados (de variadas patentes) tinham que usar um grande crachá pendurado no pescoço. Essa é minha questão: o delegado Maurílio poderia ser barrado? Saudações

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