Uma mulher muito especial, que fez Ferreira Gullar entender tudo

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Thereza Aragão, Gullar e a amiga Mary Ventura

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, crítico de arte, teatrólogo, biógrafo, tradutor, memorialista, ensaísta e poeta maranhense José Ribamar Ferreira, o famoso Ferreira Gullar (1930-2016), no poema “Menos a Mim”, confessa que conhecia tudo, menos ele próprio. Todavia, depois que encontrou uma mulher muito especial, descobriu que nada conhecia.

MENOS A MIM
Ferreira Gullar

Conheço a aurora com seu desatino
Conheço o amanhecer com o seu tesouro
Conheço as andorinhas sem destino
Conheço rios sem desaguadouros
Conheço o medo do princípio ao fim
Conheço tudo, conheço tudo
Menos a mim.

Conheço o ódio e seus argumentos
Conheço o mar e suas ventanias
Conheço a esperança e seus tormentos
Conheço o inferno e suas alegrias
Conheço a perda do princípio ao fim
Conheço tudo, conheço tudo
Menos a mim.

Mas depois que chegaste de algum céu
Com teu corpo de sonho e margarida
Pra afinal revelar-me quem sou eu
Posso afirmar enfim
Que não conheço nada desta vida
Que não conheço nada, nada, nada
Nem mesmo a mim.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG Somente quem conheceu Ferreira Gullar pode entender a força desses versos. A gente marcava o ponto toda noite no restaurante Calipso, em Ipanema, que ficava ao lado do Zeppelin. Ninguém dizia “vamos sentar na mesa do Ferreira Gullar”. A gente falava “vamos sentar na mesa da Thereza Aragão”, a mulher dele. A mesa era redonda, não tinha cabeceira, mas era Thereza quem comandava a roda e iluminava a noite. (C.N.)

Conheça a mais forte das armas, na concepção poética de Fagundes Varela

VIDA DE FAGUNDES VARELA | SecchinPaulo Peres
Poemas & Canções

O poeta Luís Nicolau Fagundes Varella (1841-1875), nascido em Rio Claro (RJ), indaga qual é a mais forte das “Armas”, a mais firme, a mais tremenda, e nos surpreende com a conclusão a que conseguiu chegar.

ARMAS
Fagundes Varela

– Qual a mais forte das armas,
a mais firme, a mais certeira?
A lança, a espada, a clavina,
ou a funda aventureira?
A pistola? O bacamarte?
A espingarda, ou a flecha?
O canhão que em praça forte
faz em dez minutos brecha?
– Qual a mais firme das armas? –
O terçado, a fisga, o chuço,
o dardo, a maça, o virote?
A faca, o florete, o laço,
o punhal, ou o chifarote?
A mais tremenda das armas,
pior que a durindana,
atendei, meus bons amigos:
se apelida: – a língua humana.

Uma sátira de Sérgio Ricardo à ditadura de 64, que está valendo até hoje 

Pinturas de Sérgio Ricardo

Sérgio Ricardo, um artista multimídia

Paulo Peres
Poemas & Canções

O cineasta, artista plástico, instrumentista, cantor e compositor paulista João Lutfi (1932-2020), que adotou o pseudônimo de Sérgio Ricardo, na letra de “Semente” faz uma sátira à ditadura militar vigente no Brasil de 1964 a 1985. A música está no LP Sérgio Ricardo, gravado, em 1973, pela Continental.

SEMENTE
Sérgio Ricardo

Cada verso é um semente
No deserto do meu peito
E onde rompe a grama verde
Vou deitando o desalento

No largo de alguma boca
No rasgo de algum sorriso
No gesto de algum lampejo
Na rima de um improviso
Nas curvas de uma morena
Na reta do meu desejo
Na relação entre corpos
Na paz do último beijo

Cada verso é uma semente
No deserto do meu peito
E onde o verde não verdeja
Não deito o meu desalento

Na rasgo dos grandes feitos
No largo de um só caminho
No brilho dos castiçais
No canto do passarinho
No garfo do deus-diabo
Na faca dos divididos
Na taça dos taciturnos
No prato dos oprimidos

Cada verso é uma semente
No deserto do meu peito
Mas se do ventre do verde
Não verdece algum rebento

No rasgo do meu poema
No largo de imagens mortas
Num gesto claro de outono
Na rima de folhas soltas
Na curva de novos versos
Na reta da revivência
Na relação dos desertos
Eu cravo a minha insistência

Hoje o verso é uma semente
Do meu peito num deserto
Verde que te quiero verde
Mas não há verde por perto

A produção em série da pobreza, diante de governantes cruéis e patéticos 

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Criança carente é um drama que se perpetua

Paulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, administrador de empresas e poeta carioca Evanir José Ribeiro da Fonseca (1955-2017), no poema “Hipocrisia”, fala de uma realidade que a cada dia cresce mais.

HIPOCRISIA
Evanir Fonseca

Um no colo, outro no ventre, 
produção independente que nunca para,
incentivada e “alimentada”
pelo Governo que, cretinamente…,

faz campanhas:
– Campanha da fome!

– Campanha da criança carente!
– Criança que, antes de ser gente,
   já emprenha e dela nascem mais…

Um no colo, um no ventre
e outro estendido no chão:
deitado doente, abandonado, atirado!

Menor delinquente: morto, ou drogado, tudo igual…
na frutificação da produção em série, ininterrupta,
patrocinada pelos “Governantes”, cruéis…
diante da pobre sofreguidão

Uma viagem sonora pelo Brasil rural, num sonho acalentado por Sérgio Natureza 

Continue Ajudando o Sergio Natureza | Vaquinhas online

Sérgio Natureza, grande compositor

Paulo Peres
Poemas & Canções

O compositor, poeta e letrista carioca Sergio Roberto Ferreira Varela, conhecido como Sérgio Natureza, na letra de “Interiores”, em parceria com Cristóvão Bastos, faz uma viagem alucinada, ao soltar seu pensamento pela paisagem, até conseguir despertar. A música faz parte do CD “Um pouco de mim – Sérgio Natureza e amigos”, gravado, em 2005, pelo Selo Sesc.Som.

INTERIORES
Cristóvão Bastos e Sérgio Natureza

Sentei na pedra lisa sem musgo ou capim
O mundo inteiro tinha o cheiro de jasmim
Saí de mim, fui passear pelo sem fim
Meu pensamento viajante flutuou
No voo elétrico, infantil, do beija-flor
Por um Brasil rural, sutil pintura zen
Na tela viva, líquida, que estranha cor
Que o lago refletia essa paisagem

Ali fiquei, corpo em tensão
Mas libertei meu eu da prisão
Passei a tarde com tamanha liberdade
Que nem sei se foi verdade ou fantasia
Mas foi bom

O que me importa é que a porta
Se entreabriu
Meu coração tão oprimido reagiu
A reação num raio tênue de intuição
Bálsamo bento bem no centro da aflição

Tão de repente a certeza de que ali
A Natureza percebeu que eu percebi
Juntou-se o nada,
A água, a terra, o fogo e o ar
E eu consegui, por puro instinto
Despertar

A razão do poema, que é só palavra, na visão única de Eurídice Hespanhol

EURÍDICE HESPANHOL MACEDO DECLAMANDO POESIA NA IV FLIM 2013 EM MADALENA -  YouTube

Eurídice Hespanhol num sarau de poesias

Paulo Peres
Poemas & Canções

A professora e poeta Eurídice Hespanhol, nascida em Santa Maria Madalena (RJ), registrou em versos sua versão sobre o que realmente significa um poema, ou melhor, ela explica qual é “A Razão do Poema”.

A RAZÃO DO POEMA
Eurídice Hespanhol

Do que é feito o poema?
Barro de essência invisível?
Nuvem de tons arcoirizados?
Elementos dispersos,
Pelo poeta magnetizados?
Ou densa identidade
de expressão incontida?

O poema é amante,
Sentimento levitante
Viagem santa e atrevida
Pulso de um sonho em prece
Aborto, parto, nascente.
O poema é só palavra
E o poeta: inconsequente…

Quando a noite desce e somente as estrelas podem entender o poeta…

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Moura retrata Ciro dos Anjos (foto: Wilson Baptista)

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, professor e poeta mineiro Emílio Guimarães Moura (1902-1971) revela no poema “Como a Noite Descesse” sentir-se só, apavorado diante dos horizontes, onde apenas as estrelas poderiam lhe entender.

COMO A NOITE DESCESSE

Emílio Moura

Como a noite descesse e eu me sentisse só,
só e desesperado diante dos horizontes que se fechavam,
gritei alto, bem alto: ó doce e incorruptível Aurora!
e vi logo que só as estrelas é que me entenderiam.
Era preciso esperar que o próprio passado desaparecesse,
ou então voltar à infância.
Onde, entretanto, quem me dissesse
ao coração trêmulo:
– É por aqui! Onde, entretanto, quem me dissesse
ao espírito cego:
– Renasceste: liberta-te!

Se eu estava só, só e desesperado,
por que gritar tão alto?
Por que não dizer baixinho, como quem reza:
– Ó doce e incorruptível Aurora…
se só as estrelas é que me entenderiam?

Uma canção de Sérgio Bittencourt que revisita o passado como um país distante  

Sérgio Bittencourt - LETRAS.MUS.BR

Sérgio Bittencourt, sempre inspirado

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, cronista, apresentador de TV e compositor carioca Sérgio Freitas Bittencourt (1941-1979), filho do grande músico e compositor Jacob do Bandolim, revisita o passado como se fosse um país distante.

O PASSADO É UM PAÍS DISTANTE
Sérgio Bittencourt

O passado é um país distante
que distante é a sombra da voz
o passado é a verdade contada
por outro de nós

Estranho som
o da memória a recordar
ao longe reconheço a casa
e a língua familiar
estranho, o som da língua
na frase familiar
o mar
galgou numa outra língua, o mar
nunca será demais lembrar
é um outro olhar para outro olhar

Estranha sombra
a que por vezes cobre o olhar
dir-se-ia que escurece só
pra então iluminar
as sombras a retalho
na face familiar
o mar
galgou por sobre a sombra, o mar
nunca será demais lembrar
é um outro olhar para outro olhar

Estranho sono
O passado é um país distante
que distante é a sombra da voz
o passado é a verdade contada
por outro de nós

Sentido apenas num olhar, o amor e irrefreável quando realmente surge

Efigênia Coutinho | Oceano de Letras

Felicidade é um dom, diz Efigênia Coutinho

Paulo Peres
Poemas & Canções

A artista plástica e poeta Efigênia Coutinho, nascida em Petrópolis (RJ), afirma que “Felicidade é Dom” e trabalha poeticamente esta tese.

FELICIDADE É DOM
Efigênia Coutinho

O amor em que eu acredito,
É sentido apenas num olhar,
Traz o azul da cor do mar…
Por teu olhar seja bendito.

Pois a felicidade é um dom,
Que dois seres une pra vida
Que traz na essência vivida
Os acordes de doce som.

Marejo os olhos de emoção,
Constatando tal realidade.
Então diante desta festividade,
Entrego-te todo meu coração.

Para que juntos sonhamos,
As ordens do Deus Cupido,
Selando o desejo cumprido
Dos sonhos que almejamos! 

Teus olhos castanhos, profundos, estranhos, que mistério ocultarão, mulher?

elenco brasileiro: Sadi Cabral

Sadi Cabral, grande ator e compositor

Paulo Peres
Poemas & Canções

O ator e compositor alagoano Sadi Sousa Leite Cabral (1906-1986) e seu parceiro Custódio Mesquita imploram o amor de uma “Mulher”, tendo em vista a beleza mágica que o corpo dela irradia. Este clássico fox-canção foi gravado por Silvio Caldas, em 1940, pela RCA Victor, com extraordinário sucesso.

MULHER
Custódio Mesquita e Sadi Cabral

Não sei que intensa magia, teu corpo irradia
Que me deixa louco assim, mulher
Não sei, teus olhos castanhos, profundos, estranhos
Que mistério ocultarão, mulher

Não sei dizer
Mulher, só sei que sem alma
Roubaste-me a calma e aos teus pés eu fico a implorar

O teu amor tem um gosto amargo
e eu fico sempre a chorar nesta dor
Por teu amor, por teu amor, mulher

“Eupoema” — conheça a biográfica poesia do revolucionário Décio Pignatari

O monstro-moinho chamado Brasil: entrevista com Décio Pignatari

Décio Pignatari, um grande agitador cultural

Paulo Peres
Poemas & Canções

O publicitário, ator, professor, tradutor, ensaísta e poeta paulista Décio Pignatari (1927-2012), um dos maiores agitadores culturais do Brasil  contemporâneo, autodefiniu-se intelectualmente e pessoalmente ao escrever o “Eupoema”.

EUPOEMA
Décio Pignatari

O lugar onde eu nasci nasceu-me
num interstício de marfim,
entre a clareza do início
e a celeuma do fim.

Eu jamais soube ler:
meu olhar de errata
a penas deslinda as feias
fauces dos grifos e se refrata:
onde se lê leia-se.

Eu não sou quem escreve,
mas sim o que escrevo:
Algures Alguém,
são ecos do enlevo.

Um hino de amor ao Rio, na parceria de Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli

Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli O Barquinho

Menescal e Bôscoli, dois parceiros geniais

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, produtor musical e compositor carioca Ronaldo Fernando Esquerdo e Bôscoli (1928-1994), na letra de “Rio”, parceria com Roberto Menescal, fala do Rio de Janeiro, a eterna Cidade Maravilhosa. A música faz parte do CD Bossa Nova gravado por Leny Andrade, em 1991, pela Eldorado.

RIO
Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli

Rio que mora no mar
sorrio pro meu Rio
que tem no seu mar
lindas flores que nascem morenas
em jardins de sol
Rio, serras de veludo
sorrio pro meu Rio que sorri de tudo
que é dourado quase todo dia
e alegre como a luz

Rio é mar
eterno se fazer amar
o meu Rio é lua
amiga branca e nua

É sol, é sal, é sul
são mãos se descobrindo
em tanto azul
por isso é que meu Rio
da mulher beleza
acaba num instante
com qualquer tristeza
meu Rio que não dorme
porque não se cansa
meu Rio que balança
Sorrio, só Rio, só Rio…

Reflexões de Dante Milano sobre o cotidiano de quem vive debaixo de uma ponte 

Paulo Peres
Poemas & Canções

O poeta Dante Milano (1899-1991), nascido em Petrópolis (RJ), considerado um dos mais importantes nomes do modernismo, mostra que uma ponte no cais pode ter um cotidiano triste, embora poético em sua concepção.

A PONTE
Dante Milano

O desenho da ponte é justo e firme, calmo e exato.
Nada poderá perturbar as suas linhas definitivas.
A sua arquitetura equilibra-se no ar
Como um navio na água, uma nuvem no espaço.
Embaixo da ponte há ondas e sombras.
Os mendigos dormem enrodilhados nos cantos.
Não têm forma humana. São sacos no chão.
Por momentos parece ouvir-se o choro de uma criança.
A água embaixo é suja,
O óleo coagula, em nódoas luminosas, reflexos lacrimejantes.
Um vulto debruçado sobre as águas
Contempla o mundo náufrago.
A tristeza cai da ponte
Como a poesia cai do céu.
O homem está embaixo aparando as migalhas do infinito.

A ponte é sombria como as prisões.
Os que andam sobre a ponte
Sentem os pés puxados para o abismo.
Ali tudo é iminente e irreparável,
Dali se vê a ameaça que paira.
A ponte é um navio ancorado.
Ali repousam os fatigados,
Ouvindo o som das águas, a queixa infindável,
Infindável, infindável…
Um apito dá gritos
A princípio crescendo em uivos, depois mantendo bem alto o apelo desesperado.
Passam navios. Tiros. Trovões.
Quando virá o fim do mundo ?
Por cima da ponte se cruzam
Reflexos de fogo, relâmpagos súbitos, misteriosos sinais.
Que combinam entre si os astros, inimigos da Terra?
Quando virá o fim dos homens ?
A ponte pensa…

 

E na poesia de Cruz e Sousa surge “o Louco, da loucura mais suprema”

Cruz e Sousa | Cruz e sousa, Lições de vida, CruzPaulo Peres
Poemas & Canções

O poeta João da Cruz e Sousa (1861-1898) nasceu em Desterro, atual Florianópolis, tornou-se conhecido como o “Cisne Negro” de nosso Simbolismo, seu “arcanjo rebelde”, seu “esteta sofredor”, seu “divino mestre”. Procurou na arte a transfiguração da dor de viver e de enfrentar os duros problemas decorrentes da discriminação racial e social. Este poema refere-se ao próprio poeta (o Louco da imortal loucura, o louco da loucura mais suprema), o grande “Assinalado”, nos versos inesquecíveis de Cruz e Sousa

O ASSSINALADO
Cruz e Sousa


Tu és o Louco da imortal loucura,

o louco da loucura mais suprema.
A terra é sempre a tua negra algema,
prende-te nela extrema Desventura.

Mas essa mesma algema de amargura
mas essa mesma Desventura extrema
faz que tu’ alma suplicando gema
e rebente em estrelas de ternura.

Tu és o Poeta, o grande Assinalado
que povoas o mundo despovoado,
de belezas eternas, pouco a pouco.

Na Natureza prodigiosa e rica
toda a audácia dos nervos justifica
os teus espasmos imortais de louco!

Poucos conseguem ser felizes. Assim, queremos felicidade para todos nós

Expoente do Clube da Esquina, Ronaldo Bastos tem parceiros ligados a vários  estilos musicais (foto: Leo Pereda/divulgação)

Rpnaldo Bastos. membro do Clube da Esquina

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, produtor musical e compositor Ronaldo Bastos Ribeiro, nascido em Niterói (RJ), na letra de “Felicidade Urgente”, em parceria com Cláudio Zoli, aponta para uma questão discutida e defendida por Clément Rosset, no livro “Alegria”: a força maior: a alegria não difere da alegria de viver. Ou seja, quem é alegre não precisa de motivos (externos) para estar alegre. A música intitulou o LP gravado por Elba Ramalho, em 1991, pela Ariola.

FELICIDADE URGENTE
Cláudio Zoli e Ronaldo Bastos

Nunca mais eu vou voltar
Essa estrada é meu destino
Vou seguir a minha vida
Vou achar o meu lugar

Louco pra viver em paz
Eu procuro paraísos
Em lugares esquecidos
Em viagens ao luar
Eu vi a cor, sonhos
E sei de cor o que é melhor pra mim

A vida me faz desse jeito
O mundo é tão imperfeito
Pouca gente tem direito a ser feliz
O tempo passa de repente
Felicidade urgente para todos
Para todos nós

Quero te fazer feliz
Quero ser feliz também
Com você ta tudo bem?
Ta tudo bem?

Não vou mais olhar pra trás
No caminho do infinito
Encontrei uma razão
E me perdi no teu olhar

Eu sempre quis muito mais
Mais do que era preciso
Quis milagres absintos
E delírios de prazer
Eu vi a cor, sonhos
Eu sei de cor o que é melhor pra mim

A vida me fez desse jeito
O mundo é tão imperfeito
Pouca gente tem direito a ser feliz
O tempo passa de repente
Felicidade urgente para todos
Para todos nós

Cora Coralina escreveu versos amargos durante o Ano Internacional da Criança, em 1979

Pin De Lucas Oliveira Em Mensagens Lindas | Frases De Cora | Frases  inspiracionais, Citações inspiracionais, Citações sábiasPaulo Peres
Poemas & Canções

A poeta Cora Coralina, pseudônimo de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas (1889-1985), nasceu em Goiás Velho. Mulher simples, doceira de profissão, tendo vivido longe dos grandes centros urbanos, alheia a modismos literários, produziu uma obra poética rica em motivos do cotidiano, conforme este poema em que Cora transmite o seu sofrimento com a situação do menor abandonado.

MENOR ABANDONADO
Cora Coralina

Versos amargos para o Ano Internacional da Criança, 1979.

De onde vens, criança?
Que mensagem trazes de futuro?
Por que tão cedo esse batismo impuro
que mudou teu nome?

Em que galpão, casebre, invasão, favela,
ficou esquecida tua mãe?…
E teu pai, em que selva escura
se perdeu, perdendo o caminho
do barraco humilde?…

Criança periférica rejeitada…
Teu mundo é um submundo.
Mão nenhuma te valeu na derrapada.

Ao acaso das ruas – nosso encontro.
És tão pequeno… e eu tenho medo.
Medo de você crescer, ser homem.
Medo da espada de teus olhos…
Medo da tua rebeldia antecipada.
Nego a esmola que me pedes.
Culpa-me tua indigência inconsciente.
Revolta-me tua infância desvalida.

Quisera escrever versos de fogo,
e sou mesquinha.
Pudesse eu te ajudar, criança-estigma.
Defender tua causa, cortar tua raiz
chagada…

És o lema sombrio de uma bandeira
que levanto,
pedindo para ti – Menor Abandonado,
Escolas de Artesanato – Mater et Magistra
que possam te salvar, deter a tua queda…

Ninguém comigo na floresta escura…
E o meu grito impotente se perde
na acústica indiferente das cidades.

Escolas de Artesanato para reduzir
o gigantismo enfermo
da criança enferma
é o meu perdido s.o.s.

Estou sozinha na floresta escura
e o meu apelo se perdeu inútil
na acústica insensível da cidade.
És o infante de um terceiro mundo
em lenta rotação para o encontro
do futuro.

Há um fosso de separação
entre três mundos.
E tu – Menor Abandonado,
és a pedra, o entulho e o aterro
desse fosso.

Quisera a tempo te alcançar,
mudar teu rumo.
De novo te vestir a veste branca
de um novo catecúmeno.
És tanto e tantos teus irmãos
na selva densa…

E eu sozinha na cidade imensa!
“Escolas de ofícios Mãe e Mestra”
para tua legião.
Mãe para o amor.
Mestra para o ensino.

Passa, criança… Segue o teu destino.
Além é o teu encontro.
Estarás sentado, curvado, taciturno.
Sete “homens bons” te julgarão.
Um juiz togado dirá textos de Lei
que nunca entenderás.

– Mais uma vez mudarás de nome.
E dentro de uma casa muito grande
e muito triste – serás um número.

E continuará vertendo inexorável
a fonte poluída de onde vens.

Errante, cansado de vagar,
dormirás como um rafeiro
enrodilhado, vagabundo, clandestino
na sombra das cidades
que crescem sem parar.

Há um fosso entre três mundos.
E tu, Menor Abandonado,
és o entulho, as rebarbas e o aterro
desse fosso.

Acorda, Criança,
hoje é o teu dia… Olha, vê como brilha lá longe,
na manchete vibrante dos jornais,
na consciência heróica dos juízes,
no cartaz luminoso da cidade,
o ano internacional da criança.

Uma canção de Geraldo Vandré, quando estava à procura da felicidade

Em livro, escritor diz que entrevista forjada foi condição para Geraldo Vandré voltar ao Brasil - Rede Brasil Atual

Vandré, um grande compositor e cantor

Paulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, cantor, compositor e poeta paraibano Geraldo Pedrosa de Araújo Dias, o Geraldo Vandré, além de suas músicas de protesto, que o fizeram famoso desde a década de 80,  compunha também canções românticas e regionais, sobre a vida no interior do país. Em parceria com Hilton Accioly, ele compôs “Ventania”, na qual afirma ter andado por vários lugares procurando um local melhor onde pudesse morar, mas desistiu porque a vida é sempre igual em qualquer canto.

VENTANIA
Hilton Accioly e Geraldo Vandré

Meu senhor, minha senhora
Vou falar com precisão
Não me negue nessa hora
Seu calor, sua atenção
A canção que eu trago agora
Fala de toda a nação
Andei pelo mundo afora
Querendo tanto encontrar
Um lugar prá ser contente
Onde eu pudesse mudar
Mas a vida não mudava
Mudando só de lugar

“Que a morte que eu vi no campo
Encontrei também no mar
Boiadeiro, jangadeiro iguais
No mesmo esperar
Que um dia se mude a vida
E em tudo e em todo lugar”

Prá alegrar eu tenho a viola
Prá cantar, minha intenção
Prá esperar tenho a certeza
Que guardo no coração
Prá chegar tem tanta estrada
Prá correr meu caminhão
Já soltei o meu cavalo
Já deixei a plantação
Eu já fui até soldado
Hoje muito mais amado
Sou chofer de caminhão

Já gastei muita esperança
Já segui muita ilusão
Já chorei como criança
Atrás de uma procissão
Mas já fiz correr valente
Quando tive precisão
Amor prá moça bonita
Repeito prá contramão
Saudade vira poeira
Na estrada e no coração
Riso franco, peito aberto
Sou chofer de caminhão

Se você não vive certo
Se não ouve o coração
Não se chegue muito perto
Não perdôo ingratidão.
Riso franco, peito aberto
Vou cantar minha canção
De setembro a fevereiro
O que vir não vou negar

Rodando país inteiro,
Norte, sul, sertão e mar
Aprendi ser tão ligeiro
Que ninguém vai segurar
Fui vaqueiro e jangadeiro
No campo e no litoral

Cantador serei primeiro
Cantando não por dinheiro
Por justo anseio geral
Cantador serei primeiro
Cantando não por dinheiro
Por justo anseio geral.
Cantando por justo anseio geral 

As múltiplas perguntas que viviam angustiando a vida de Clarice Lispector

O tempo corre, o tempo é curto: preciso... Clarice Lispector - PensadorPaulo Peres
Poemas & Canções

A escritora, jornalista e poeta Clarice Lispector (1920-1977), nascida na Ucrânia e naturalizada brasileira, definia-se como uma pergunta: Por quê?

SOU UMA PERGUNTA
Clarice Lispector

Quem fez a primeira pergunta?
Quem fez o mundo?
Se foi Deus, quem fez Deus?
Por que dois e dois são quatro?
Quem disse a primeira palavra?
Quem chorou pela primeira vez?
Por que o Sol é quente?
Por que a Lua é fria?
Por que o pulmão respira?
Por que se morre?
Por que se ama?
Por que se odeia?
Quem fez a primeira cadeira?
Por que se lava roupa?
Por que se tem seios?
Por que se tem leite?
Por que há o som?
Por que há o silêncio?
Por que há o tempo?
Por que há o espaço?
Por que há o infinito?
Por que eu existo?
Por que você existe?
Por que há o esperma?
Por que há o óvulo?
Por que a pantera tem olhos?
Por que há o erro?
Por que se lê?
Por que há a raiz quadrada?
Por que há flores?
Por que há o elemento terra?
Por que há a gente quer dormir?
Por que acendi o cigarro?
Por que há o elemento fogo?
Por que há o rio?
Por que há a gravidade?
Por que e quem inventou os óculos?
Por que há doenças?
Por que há saúde?
Por que faço perguntas?
Por que não há respostas?
Por que quem me lê está perplexo?
Por que a língua sueca é tão macia?
Por que fui a um coquetel na casa do Embaixador da Suécia?
Por que a adida cultural sueca tem como primeiro nome Si?
Por que estou viva?
Por que quem me lê está vivo?
Por que estou com sono?
Por que se dão prêmios aos homens?
Por que a mulher quer o homem?
Por que o homem tem força de querer a mulher?
Por que há o cálculo integral?
Por que escrevo?
Por que Cristo morreu na cruz?
Por que minto?
Por que digo a verdade?
Por que existe a galinha?
Por que existem editoras?
Por que há o dinheiro?
Por que pintei um jarro de vidro de preto opaco?
Por que há o ato sexual?
Por que procuro as coisas e não encontro?
Por que existe o anonimato?
Por que existem os santos?
Por que se reza?
Por que se envelhece?
Por que existe câncer?
Por que as pessoas se reúnem para jantar?
Por que a língua italiana é tão amorosa?
Por que a pessoa canta?
Por que existe a raça negra?
Por que é que eu não sou negra?

Por que um homem mata outro?
Por que neste mesmo instante está nascendo uma criança?
Por que o judeu é raça eleita?
Por que Cristo era judeu?
Por que meu segundo nome parece duro como um diamante?
Por que hoje é sábado?
Por que tenho dois filhos?
Por que eu poderia perguntar indefinidamente por quê?
Por que o fígado tem gosto de fígado?
Por que a minha empregada tem um namorado?
Por que a Parapsicologia é ciência?
Por que vou estudar matemática?
Por que há coisas moles e coisas duras?
Por que tenho fome?
Por que no Nordeste há fome?
Por que uma palavra puxa a outra?
Por que os políticos fazem discurso?
Por que a máquina está ficando tão importante?
Por que tenho de parar de fazer perguntas?
Por que existe a cor verde-escuro?
Por quê?
É porque.
Mas por que não me disseram antes?
Por que adeus?
Por que até o outro sábado?
Por quê?

Não há nada melhor do que a amizade sincera, um grande amigo

Vinil Renato Teixeira, Dominguinhos MPB - Bossa - Instrumental

Renato e Dominguinhos, parceiros e amigos

Paulo Peres
Poemas & Canções

O cantor e compositor paulista Renato Teixeira de Oliveira, um dos mais destacados cantores da música regionalista, mostra o que considera o real significado de uma “Amizade Sincera”.A música faz parte do CD/DVD Amizade Sincera, gravado por Renato Teixeira e Sérgio Reis, em 2010, pela Som Livre.

AMIZADE SINCERA
Dominguinhos e Renato Teixeira

Amizade sincera é um santo remédio
É um abrigo seguro
É natural da amizade
O abraço, o aperto de mão, o sorriso
Por isso se for preciso
Conte comigo, amigo disponha
Lembre-se sempre que mesmo modesta
Minha casa será sempre sua
Amigo, os verdadeiros amigos
Do peito, de fé
Os melhores amigos
Não trazem dentro da boca
Palavras fingidas ou falsas histórias
Sabem entender o silêncio
E manter a presença mesmo quando ausentes
Por isso mesmo apesar de tão raros
Não há nada melhor do que um grande amigo

Alguns rostos significam vida plena, na poesia de Vicente Limongi Netto

Autógrafos de Pedro Rogério | Portal Anna Ramalho

Limongi (dir.), com o amigo Pedro Rogério

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista e poeta amazonense Vicente Limongi Netto, radicado há anos em Brasília, no poema “Água Benta”, mostra a percepção que certos rostos expõem.

ÁGUA BENTA
Vicente Limongi Netto

Alguns rostos significam
vida plena
têm água benta
comovem oceanos
pintam as cores do céu
caminham na imensidão dos rios
são devotos dos peixes
adormecem nas margens de Deus