Carlos Chagas
Pelo menos 40 cidadãos estão tremendo mais do que se tivessem malária. No caso, de medo. São os mensaleiros, réus em julgamento no Supremo Tribunal Federal. Se a mais alta corte nacional de justiça, por nove votos a um, manteve a prisão de um governador, não haverá como supor que, existindo provas e evidências, deixará de punir os responsáveis por uma das maiores lambanças praticadas nos últimos anos por políticos e penduricalhos. Foram eles, os mensaleiros, que deram início a esse festival de corrupção desabrida, agora chegando a Brasília. Importa menos se entre eles estão deputados com mandato, sem mandato, ex-ministros, banqueiros e bagrinhos. Se um governador em pleno exercício de suas funções foi arcabuzado, porque não os outros?
Encontra-se em fase de tomada dos últimos depoimentos de testemunhas de defesa o processo contra os 40 mensaleiros, rotulados de “quadrilha” pelo Procurador Geral da República. Caberá ao ministro Joaquim Barbosa propor a punição ou a absolvição para cada um deles, devendo o plenário do Supremo iniciar em seguida os julgamentos.
O Judiciário faz justiça, diria aquele antigo personagem de nossa História, o Conselheiro Acácio. E não haverá que duvidar, importando menos se José Roberto Arruda era do DEM e os mensaleiros, ecléticos, são filiados ao PT, ao PMDB e outros partidos. Que tremam…
Só como farsa
Karl Marx falou primeiro e Lenin repetiu: a História só se repete como farsa. Seria bom, assim, que certos políticos e alguns cronistas parassem com essa moda de supor Minas e São Paulo em conflito. O que aconteceu nos idos de 1932 não se reproduz mais. A batalha do túnel, vencida pelos mineiros, encerrou o sonho constitucionalista, que muitos rotularam como separatista, sem a certeza de ter sido.
É bobagem imaginar que Minas rejeitará José Serra, paulista, porque Aécio Neves, mineiro, retirou-se da disputa. O governador de São Paulo poderá muito bem perder a eleição, mas terá sido por razões muito menos geográficas do que políticas. Pior ainda parece imaginar que os mineiros votarão em Dilma Rousseff porque ela nasceu em Belo Horizonte. A candidata dispõe de excelentes condições para vencer, mas por motivos diversos, o maior deles pela indicação do presidente Lula. Aliás, Dilma é tão mineira quanto o Lula é pernambucano.
Em suma, não dá para pretender uma nova batalha entre Minas e São Paulo causada por um bairrismo arcaico e inconseqüente. Até porque, se os dois estados se apresentarem unidos numa chapa única, os adversários que saiam de baixo.
Quem sofreu na trincheira
Para ficarmos no passado entrevero de 1932, quem conta delicioso episódio é o candidato do PSOL à presidência da República, o paulista e socialista histórico, Plínio de Arruda Sampaio. Mal engatinhava, naquele tempo, mas teve um tio desde logo engajado na guerra civil, soldado do contingente avançado de São Paulo, na trincheira diante de Minas. Ninguém sabia ao certo o que aconteceria e, à noite, as tropas utilizavam senhas para certificar-se de o inimigo não estar se infiltrando. No meio de um buraco bem à frente dos mineiros, o tio de Plínio ouviu um ruído ininteligível e imediatamente pediu a senha. A resposta foi um estranho “múu” e ele não teve dúvida: mandou bala.
Logo soldados de lá e de cá empenhavam-se em monumental tiroteio, sem que nenhum dos lados se movesse. De manhã, com o sol iluminando o campo de batalha, o tio arriscou avançar alguns metros para saber se havia atingido o adversário, aquele que não sabia a senha dos paulistas. Surpreendeu-se, porque tinha matado uma vaca mineira…
Chovendo na horta de Ciro
A quem beneficiará a queda de José Serra e a ascensão de Dilma Rousseff? Por mais que as pesquisas não tenham revelado, logo poderá ser a Ciro Gomes. Talvez surja aí a chance que ele esperava. Porque as preferências que antes faltavam à ministra, e hoje começam a faltar ao governador, ironicamente fluirão para uma terceira opção. Basta que o ex-ministro e ex-governador do Ceará fique firme. Porque os setores capazes de desistir de votar em Serra não votarão em Dilma. E se os números virarem, será vice-versa. Dilmistas não se transformarão em serristas.
Abre-se outra via, no mínimo em condições de chegar ao segundo turno. Hipótese que se encarregará de afastar o caráter plebiscitário da eleição, entre o governo Lula e o governo Fernando Henrique. O eleitorado pode muito bem fixar-se no futuro.