Jorge Folena
O Presidente da Comissão de Reforma do Código de Processo Civil, que tramita no Senado Federal, manifestou que o prazo razoável para conclusão do processo judicial seria de um ano (Consultor Jurídico, 11/08/2010). Será isto possível, sem violar as cláusulas pétreas do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa?
Não há dúvida de que um dos grandes impasses do Judiciário brasileiro reside na longa duração dos processos judiciais, o que, na verdade, se constitui num “assassinato à Justiça”.
É comum ao cidadão o conhecimento de processos judiciais que duram 10, 20 e até mais de 30 anos. Diante desta situação, prejudicial para todos, as pessoas deixam de postular seus direitos, considerando a morosidade da justiça. Os advogados são prejudicados, uma vez que possíveis clientes desistem de contratá-los, tendo em vista a demora da prestação jurisdicional, com a parte aceitando muitas vezes um acordo por valor inferior, haja vista o tempo de resposta para a satisfação do seu direito.
Descumprimento da Constituição
Não resta dúvida de que a lentidão do Judiciário conduz à ausência de justiça. Essa apatia não deveria mais existir diante da Emenda Constitucional nº 45/2004, que estabeleceu que os processos devem ter “razoável duração” e “celeridade em sua tramitação” (art. 5º., LXXVIII, da Constituição). Determinou também que “não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal” (art. 93, II, “e”).
O atual Código de Processo Civil prevê que o juiz proferirá despachos de expediente em 2 dias e decisões e sentenças em 10 dias (artigos 189, 281 e 456). Na prática, isto não é observado. Os juízes dizem que há acúmulo de trabalho e, assim, justificam o não cumprimento da lei e da Constituição. Entretanto, há muitos magistrados que são professores. Será que estes cumprem os prazos determinados na lei?
O advogado que não observa os prazos processuais e causa prejuízos aos seus clientes é passível de punição disciplinar e reparatória de dano. E os magistrados que não cumprem a lei, em qualquer instância, também deveriam ser punidos, não apenas respondendo por perdas e danos, conforme prevê o artigo 133 do Código de Processo Civil, mas com o afastamento do cargo, na medida em que é dever da instituição exigir eficiência, princípio constitucional que também deve ser observado pelo Judiciário (art. 37, caput).
Com a decantada “Reforma do Judiciário”, esperava-se que a Justiça fosse funcionar de forma ininterrupta (art. 93, XII da Constituição), sem recessos natalinos que duram mais de duas semanas. Acreditava-se ainda que os juízes passariam a ter 30 dias de férias como os demais trabalhadores, ao invés de 60 dias, e que, pelo acúmulo de trabalho existente e a necessidade de se promover a celeridade para a conclusão dos processos, como determina a Constituição, os magistrados passariam a se dedicar exclusivamente às suas atividades, deixando de lado a possibilidade de acumularem a carreira de magistério, que estão autorizados a exercer (art. 95, § único, I, da Constituição).
O magistério é carreira nobre, que exige dedicação exclusiva do profissional, pois além das atividades de sala de aula, é necessário preparar planos de trabalho, participar de projetos de pesquisa e extensão, orientar os alunos, ler os seus trabalhos, corrigir as provas etc.
Quem não conhece um magistrado que seja professor? Por exemplo, o anterior presidente do STF, conforme curriculum exibido na página do Tribunal, é professor adjunto de Direito Constitucional da Universidade de Brasília desde junho de 1995.
Será que dá para desempenhar as duas carreiras com prontidão e dedicação, mesmo a Constituição autorizando a acumulação desses cargos? Confesso que tenho dúvidas, mas talvez seja possível para alguns muito bem preparados. Mas para isto, o magistrado deverá observar fielmente os prazos que a lei impõe para o exercício de suas funções. Esta é uma das condições para que o sonho do Presidente da Comissão de Reforma do Código de Processo Civil se torne realidade.
O respeito ao devido processo legal
Assim, não se pode atribuir a responsabilidade pela morosidade da prestação jurisdicional exclusivamente aos advogados, que fazem uso dos recursos inerentes à defesa de seus clientes, conforme assegurado pela Constituição para a efetivação do devido processo legal.
Vale lembrar que a atividade jurisdicional é um serviço prestado pelo Poder Público, que cobra altíssimas taxas da população e, portanto, deve cumprir o preceito constitucional da razoável duração do processo, sem desrespeitar os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, sob pena de violência ao estado democrático de direito, princípio fundamental da República (art. 1.º da Constituição).