Brasil vive uma realidade de “aparências”, e as pessoas se guiam pelas “percepções”

Iotti: inflação mais baixa da história | Pioneiro

Charge do Iotti (Pioneiro)

Luciano Trigo
Gazeta do Povo

Com base exclusivamente no noticiário, é impossível tirar qualquer conclusão categórica, até porque a grande mídia já perdeu a credibilidade há bastante tempo. Mas a aparência é de perseguição, de uso político da Polícia Federal ou, o que seria igualmente nocivo para a democracia, de uma vingança pura e simples em andamento – ou ainda, uma combinação das duas motivações.

É esta a percepção generalizada em metade da população – e, excluídos os cínicos, os ingênuos e os tarados ideológicos, até mesmo uma parcela da outra metade já está incomodada com a sensação de que alguns limites perigosos estão sendo cruzados.

SEM REGRAS CLARAS – Destaquei as palavras “aparência” e “percepção” por precaução, mas não só por isso. Em uma sociedade sem regras claras, sem confiança nas instituições, sem valores compartilhados, onde a democracia e a liberdade de expressão são relativizadas, em suma, em uma sociedade sem limites, o debate político se reduz a um mercado de narrativas, no qual o que importa não são os fatos em si, mas a forma como eles são vendidos ao cidadão comum – as aparências – e a forma como eles são comprados por este cidadão – as percepções.

Em regimes autoritários, é sempre possível controlar as aparências – por meio da censura, da cooptação da mídia, dos grandes empresários, dos intelectuais e dos artistas, do constrangimento da dissidência, da suspensão das liberdades, da imposição de uma narrativa hegemônica nas universidades, da criminalização da oposição etc.

Mas é impossível controlar as percepções. Por medo, cálculo ou conveniência, muita gente pode ficar calada ou até fingir, em público, que continua vivendo em um ambiente de normalidade democrática. Mas a percepção generalizada em metade ou mais da população pode ser bastante diferente.

MAQUIANDO A MÍDIA – A mesma dinâmica se aplica à economia: as estatísticas oficiais e a boa vontade da grande mídia tentam criar a aparência de uma economia pujante, selecionando e dando grande destaque às notícias boas e maquiando as ruins.

O “Entenda por que isso é bom” já virou meme nas redes sociais: entenda por que é bom ter inflação alta, gasolina cara, ter que pagar mais impostos etc.

É notável o esforço para convencer o cidadão comum de que, comparada ao governo anterior, a economia melhorou em todos os indicadores. Mesmo que antes as estatais antes dessem lucro, e hoje deem um prejuízo gigantesco. Mesmo que o Brasil tenha fechado 2023 com um rombo de R$ 230 bilhões, quando a previsão, já assustadora, era de R$ 140 bilhões (enquanto em 2022, o superávit foi de R$ 54,1 bilhões).

OUTRA PERCEPÇÃO – Mas também na economia a percepção generalizada é muito diferente da aparência que se tenta criar, e não apenas em metade da população.

Pode-se até tentar explicar por que os preços sobem enquanto a inflação desce, mas a dona Maria e o seu José não estão interessados em teoria econômica. Se as contas não fecham no final do mês, eles ficam insatisfeitos, e isso independe do voto que deram.

E, por mais que se mantenham as aparências no presente, é impossível quantificar as consequências futuras da insatisfação de milhões de seus Josés e donas Marias, país afora. Seguramente, não serão boas. Pior: não são só os brasileiros comuns que começam a desconfiar que estão sendo enganados;  os investidores também, aí incluídos os investidores estrangeiros, que já ensaiam uma fuga de capitais.

HONRAR COMPROMISSOS – Os investidores talvez pressintam que, como no caso do déficit, outros compromissos não serão honrados – e eles sabem que um país sem compromisso com a responsabilidade fiscal é como um paciente com febre: quebrar o termômetro, sem atacar a raiz do problema, só vai agravar a doença.

Na política é a mesma coisa: em um ambiente no qual a oposição se sente perseguida e as pessoas comuns têm medo de expressar livremente sua opinião, fica impossível medir a temperatura da insatisfação popular.

O problema se agrava porque os institutos de pesquisa também foram tragados no mesmo processo de perda de credibilidade que afeta a grande mídia e as instituições. Ainda assim, os sinais que elas emitem não são bons.

5 thoughts on “Brasil vive uma realidade de “aparências”, e as pessoas se guiam pelas “percepções”

  1. As redes sociais servem para isto, contar o que a mídia mainstream é paga para não contar. Infelizmente muitos milhões ainda preferem acreditar que o rombo nas contas públicas é ruim mas é bom, porque determinada jornalista disse esta besteira, mas ela não disse uma besteira, ela é uma jornalista, será que os jornalistas estão sendo pagos para mentir para a gente?

  2. Segundo os “protocolos kgazarianos”, após locupletas todas as instãnciaa de gananciosos, à plebe de feitos desassemelhados seria conscientizada dessa “injustiça” e a vingarem-se, assaltando-os!
    PS. Quem concede poder para usufruto, sabe cobrar e dar o troco!!

  3. A morte de Marielle me lembra a morte de Quincas Berro D’água, o que morreu duas vezes, segundo Jorge Amado.
    A mídia agora não quer mais saber quem matou a moça.

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