
Charge do Gilmar Fraga (gauchazh.clicrbs.com.br)
Pedro do Coutto
Enquanto o escândalo dos descontos não autorizados em benefícios do INSS ainda repercute nos corredores de Brasília, o governo parece optar por um desvio burocrático quando o caminho direto está bem diante dos seus olhos. O vice-presidente e atual ministro da Indústria, Geraldo Alckmin, anunciou que a Caixa Econômica Federal está estudando a possibilidade de prestar atendimento presencial aos aposentados e pensionistas prejudicados — uma tentativa de dar resposta à crise que a Operação Sem Desconto revelou ao país.
Segundo as investigações da Polícia Federal em conjunto com a Controladoria-Geral da União, o rombo pode chegar a R$ 6,3 bilhões. Um número assombroso, sustentado por práticas de entidades ditas representativas que, na verdade, agiam como sanguessugas — muitas delas, suspeita-se, criadas apenas para fraudar. Mais grave ainda é a hipótese de conivência de servidores públicos, para quem a propina teria sido parte do esquema.
DADOS MAPEADOS – Agora, diante de dados amplamente mapeados e digitalizados pelo próprio INSS, surge a proposta de usar a rede física da Caixa para mediar um processo que, em tese, poderia ser resolvido em poucos cliques — se o objetivo fosse, de fato, resolver. A justificativa apresentada por Alckmin é de que muitos beneficiários não têm acesso à internet. Até aí, justo. Mas daí a criar um novo protocolo presencial, quando já se tem tecnologia e histórico de movimentação de cada benefício, é transformar agilidade em morosidade.
A Caixa, por sua vez, emitiu aquela nota genérica, reafirmando seu papel como braço operacional do governo, mas sem esclarecer o que fará, quando ou como. Enquanto isso, o INSS corre para devolver R$ 292,6 milhões entre o fim de maio e o começo de junho — uma fração perto do total estimado.
CONTRASSENSO – O que não se diz é que cerca de nove milhões de brasileiros foram afetados. Destes, quatro milhões estariam diretamente ligados a fraudes. E mesmo assim, os beneficiários é que terão de informar se autorizaram ou não os débitos. Um contrassenso. Os sistemas do INSS sabem muito bem quais autorizações existem e quais não. Inventar mais uma etapa — presencial, burocrática, descentralizada — soa mais como estratégia de adiamento do que de solução.
O governo, que deveria ser a instância de reparação, se arrisca a parecer cúmplice pela lentidão. No fundo, o que está em jogo é mais do que ressarcir aposentados enganados. É saber se o Estado brasileiro será capaz de proteger seus cidadãos mais vulneráveis — ou se, mais uma vez, vai empurrar o problema para debaixo do balcão da Caixa.