
Charge do Cazo (Blog do AFTM)
Amanda Klein
do UOL
O governo anunciou primeiro a “bondade” — a contenção de despesas acima do estimado — e esperou o encerramento das negociações para anunciar a “maldade” — aumento de imposto. O ânimo inicial no mercado — com queda do dólar e alta da Bolsa — logo se traduziu em cautela. Dólar fechou em alta de 0,33%, aos R$ 5,66. E Ibovespa caiu 0,44%.
Parece que o governo não aprendeu nada. Dobrou a aposta na mesma estratégia do ano passado, quando anunciou simultaneamente ajuste fiscal aquém do esperado e isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil. Hoje, em vez de surpreender positivamente com mais transparência nas contas públicas, embalou no pacote o remédio amargo de aumento de imposto.
FICÇÃO E REALIDADE – Primeiro, veio a notícia boa: congelamento dos gastos bem acima do esperado. O mercado projetava de R$ 10 a R$ 15 bilhões. O governo entregou R$ 31,3 bilhões.
“O relatório bimestral de receitas e despesas foi muito mais realista que o orçamento para 2025. A LOA (lei orçamentária anual) era uma peça de ficção, com inflação e Selic abaixo do estimado pelos economistas e preço do petróleo acima”, explica João Pedro Leme, analista de contas públicas da Tendências Consultoria.
“Agora, o governo adotou uma peça sóbria e trouxe qualidade pro debate. Todo mundo sabe o quanto é impopular um corte de gastos dessa ordem.”
DURA REALIDADE – Mas o duro é que a realidade não é nada boa. Para Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, apesar do congelamento maior que o esperado, o fato é que se incluirmos precatórios, o déficit primário continuará em R$ 75 bilhões. “Não consigo ver isso como uma política fiscal crível”, relata.
Já o aumento do IOF procurou fechar lacunas de engenharia tributária, mas encareceu o crédito, com potencial para gerar R$ 20 bilhões em 2025. Prova de que a equipe econômica continua tratando o ajuste fiscal pelo lado da receita, sem corte de gastos relevantes. O pós-mercado está nervoso. O dólar futuro bateu a máxima de R$ 5,71.
“Basicamente o governo vai usar IOF para fazer política monetária. Segura e encarece o crédito. O IOF pega todo mundo. Pega operações de crédito de pessoa jurídica, de empresa pequena e empresa grande e unifica o IOF do câmbio. Ao pegar todo o setor empresarial, é restritivo”, afirma Paulo Gala, professor de economia da FGV.
ABRIR CAMINHO? – João Pedro Leme explica que a medida “é para limpar o canal de crédito e desaquecer esse mercado de empréstimos para facilitar a convergência da política monetária”.
Foi o que disseram os secretários da Fazenda na abertura da coletiva: o aumento do IOF foi coordenado com a política monetária e o intuito é abrir caminho para o Banco Central reduzir juros lá na frente.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Em tradução simultânea, aumentar o IOF significa criar uma espécie de nova CPMF, porque atinge todas as operações financeiras, exceto depositar e sacar. Com isso, o ministro Haddad apenas pretende irrigar a campanha de Lula e do PT, nada tem a ver com política monetária propriamente dita. Nessa conjuntura, surge a pergunta que não quer calar: o que Simone Tebet está fazendo neste governo? (C.N.)