Desejo e cobiça, quando reprimidos, sempre têm uma vida mais longa

A imagem apresenta uma composição abstrata com figuras humanas estilizadas, onde duas faces se entrelaçam. As figuras têm olhos grandes e expressivos, e estão cercadas por linhas que sugerem movimento e conexão. As cores predominantes são tons de rosa, vermelho, amarelo e azul, criando um contraste vibrante. O fundo é de um tom avermelhado, que destaca as formas e as expressões das figuras.

Ilustração de Ricardo Cammarota (Folha)

Luiz Felipe Pondé
Folha

Suspeito que o desejo, sexual ou qualquer outro, quando reprimido, tem vida mais longa e consistente do que quando é liberado de forma geral. A máxima “é proibido proibir”, como aliás quase tudo que é fruto da contracultura, é infantil. A contracultura foi um surto de regressão cognitiva e afetiva erguida em comportamento de consumo.

Um comportamento antissocial oculto, praticado por adultos interessados em sexo fácil e no direito de serem preguiçosos sem culpa.

POBREZA DE ESPÍRITO – O desejo respira melhor quando acossado. Entendo que o que acaba de ser dito, provavelmente, será compreendido pelos inteligentinhos digitais como uma defesa da repressão contra uma sexualidade livre.

Inteligentinhos digitais são um perfil específico dentro da comunidade inteligentinha que se constitui a partir da semântica miserável das redes. Pobreza de espírito sob uma chuva colorida de purpurina.

Falar de desejo e repressão como pares necessários à vida do desejo é assunto, exclusivamente, para adultos. Adolescentes biológicos, psicológicos ou morais nada têm a dizer aqui.

REVOLUÇÃO SEXUAL – A conhecida “revolução sexual” foi um dos primeiros grandes produtos de comportamento de consumo. Muitas mulheres sempre fizeram sexo antes de se casar, às vezes com aquele que viria a ser o próprio marido, ou não. Quer ver? Pergunte às suas avós.

A simples ideia de que as mulheres passaram a fazer sexo com a “revolução sexual” é parte da commmodity do comportamento contracultural. Os anos 1960 marcaram o nascimento do marketing de comportamento.

E se as “meninas de família” não faziam sexo papai e mamãe, faziam sexo oral e anal adoidado. A contracultura é responsável por muitas das baboseiras que hoje viraram mainstream na cultura, no mercado, na política e no mundo jurídico no século 21. A infantilidade do século 21, até agora, é fruto direto da vagabundagem contracultural e seus produtos.

DESEJO CIDADÃO – A melhor forma de matar o desejo é “oficializá-lo como cidadão”. Existe ideia mais brocha do que desejo cidadão? As “políticas do desejo” são um modo ou de querer legitimar suas próprias taras ou de tornar o desejo inofensivo. A proibição do desejo é um estímulo profundo do desejo.

Voltemos à concupiscência. A palavra é usualmente entendida como cobiça ou busca de prazer descontrolado. O cristianismo entendeu isso muito bem. Paulo, falando em Gálatas 5 e santo Agostinho, falando das três concupiscências —carne, espírito e vontade—, depois de Paulo, fundaram a reflexão sobre a concupiscência.

Em Gálatas 5, as “obras da carne” descrevem exemplos dos frutos da concupiscência da carne. Aqui ele extrapola claramente o entendimento mais comum de concupiscência da carne como desejo sexual. Vai de lascívia a inveja, de prostituição a idolatria, vai de heresias a homicídio.

REPRIMIR É INTENSIFICAR – O desejo descontrolado pelo sexo é a forma mais comum de se entender a concupiscência da carne. Nada como reprimir o desejo sexual por alguém para que esse desejo se torne mais intenso.

“Sem querer”, o cristianismo deu a rota para a intensificação do imaginário sexual. Ao contrário do que a dita revolução sexual que nos levou ao estado de inanição sexual em que vive o mundo contemporâneo, principalmente entre os jovens, muito limpinhos, livres e corretinhos —mas quando se olha as redes vemos a violência babando pelos lábios.

Mas o melhor significado de concupiscência é cobiça. Por exemplo, como nos dez mandamentos se fala “não cobiçarás a mulher do próximo”. Entretanto, cobiça pode ter toda uma gama de objetos variados do desejo.

COBIÇA-SE TUDO – Vivemos num mundo organizado ao redor da cobiça. Ela move o mundo. Poderíamos nos referir ao nosso contrato social como um contrato de concupiscência. Todo o esforço social, político e econômico que fazem as sociedades para não mergulharem no mundo hobbesiano pré-Estado, na barbárie absoluta, é um esforço para equilibrar as concupiscências entre as pessoas, instituições, empresas, nações.

Santo Agostinho estava coberto de razão quando pensava numa espécie de contrato de concupiscência como modelo da vida em sociedade. A cobiça pelo dinheiro, pelo sucesso, por seguidores, por uma melhor versão de si mesmo, pelo poder político, pelo sexo, pela corrupção, pela melhor mentira, enfim, a cobiça é o motor da sociedade.

O capitalismo não sobreviveria sem a cobiça. O socialismo histórico, ao contrário do que pensou Karl Marx, tampouco eliminou a cobiça. Vivemos numa luta contínua contra a hegemonia da cobiça, apesar de todas as mentiras que se contam hoje sobre os seres humanos.

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