Donald Trump é um oportunista que exibe uma coerente visão do mundo

Um homem sentado em uma mesa no Escritório Oval, com bandeiras dos Estados Unidos ao fundo. Ele tem cabelo loiro e usa um terno escuro com uma gravata amarela. A mesa está decorada com várias fotos em molduras e um objeto decorativo à esquerda.

Trump sabe por que os Estados Unidos estão em declínio

Demétrio Magnoli
Folha

O Japão nos rouba, economicamente, e a Europa aproveita-se de nós fazendo com que paguemos por sua segurança. As duas mensagens apareceram no primeiro anúncio de TV publicado pelo então incorporador imobiliário Donald Trump, nos idos de 1987. A figura que hoje ocupa o Salão Oval é um oportunista de convicções políticas fluidas, mas mantém uma visão de mundo coerente. Dela emana aquilo que deve ser descrito como Doutrina Trump.

A “cidade brilhante no alto da colina” –a expressão, oriunda do sermão laico pronunciado em 1630 por John Winthrop, o puritano fundador de Boston, a bordo do navio Arbella, ressurgiu vezes incontáveis em discursos de presidentes republicanos ou democratas.

VISÃO DE TRUMP – Historicamente, para o bem ou o mal, os EUA exibiram-se a si mesmos e aos estrangeiros como um farol de reforma do mundo. Trump substitui a visão luminosa da cidade profética pela visão sombria de uma fortaleza em declínio, traída e explorada por pérfidos aliados.

“Sejamos sinceros: a União Europeia foi criada com a finalidade de ferrar os EUA. É esse o propósito dela –e fizeram um bom trabalho nisso. Mas, agora, sou o presidente” (Trump, 26/2).

“A ameaça que mais me atormenta não é a Rússia ou a China ou qualquer ator externo. O que me preocupa é a ameaça de dentro: o recuo da Europa de alguns de seus valores mais fundamentais, que são compartilhados com os EUA” (J.D. Vance, 18/2).

DESMANTELAR A UE – Trump e seu vice não enxergam o perigo nas potências autocráticas, rivais de sempre, mas nas sociedades democráticas que alargaram o espaço das liberdades públicas, ampliaram os direitos civis e toleraram a imigração.

Daí, as declarações de apoio de Vance e Musk à AfD alemã, um partido extremista que opera como tentáculo de Putin e flerta com neonazistas. O sonho dourado de Trump é desmantelar a União Europeia e, junto, a aliança transatlântica materializada na Otan.

A ordem edificada no pós-guerra estabeleceu uma economia internacional aberta, que funcionou como moldura para a prosperidade dos EUA. Trump, contudo, a interpreta pelo avesso: o livre comércio seria uma armadilha para nações estrangeiras tirarem proveito do mercado americano.

GUERRA COMERCIAL – “Fomos roubados durante décadas por quase todos os países da Terra e não deixaremos isso acontecer novamente”, proclamou Trump diante do Congresso. Troque o Japão do anúncio de 1987 pela China, o Canadá, o México e a União Europeia – eis a raiz da guerra comercial deflagrada pela Casa Branca.

A ordem do pós-guerra moldou um sistema imperfeito de regras de segurança que evitou uma terceira guerra mundial, alavancou a liderança geopolítica dos EUA e propiciou a cooperação multilateral.

Trump, porém, a interpreta como um esquema destinado a extrair vantagens dos EUA e almeja substituí-la por um sistema de potências dominantes rodeadas por suas esferas de influência.

ACORDOS TRANSNACIONAIS – Sob tal lógica, a paz emanaria de acordos transacionais firmados entre soberanos poderosos: o “triângulo Rússia/China/EUA”, nas palavras do Kremlin.

Putin e Xi Jinping são parceiros potenciais; Zelenski, um estorvo a ser eliminado.

Hastings Ismay, primeiro secretário-geral da Otan, definiu a aliança como meio para conservar os EUA na Europa, os russos fora e os alemães por baixo. A Doutrina Trump tende a deixar os EUA fora, a Rússia dentro e os alemães (da AfD) por cima.

Supremo percebe que encontrou adversários fortes demais nos EUA

Nani Humor: stf

Charge do Nani (nanihumor.com)

Mario Sabino
Metrópoles

Depois de subestimar a movimentação político-jurídica nos Estados Unidos contra as decisões de Alexandre de Moraes de censurar, multar e bloquear redes sociais americanas, o STF se deu conta de que a encrenca não é pequena.

A última má notícia para o Supremo brasileiro veio ontem, mas a imprensa brasileira, com as exceções de praxe, tentou travesti-la de coisa boa.

PARECE, MAS NÃO É… – A juíza americana Mary S. Scriven negou o pedido de liminar do Rumble, suspenso de operar no Brasil, e da TMTG, a empresa de mídia e tecnologia de Donald Trump, que se juntou à rede social na ação, para que ordens de Alexandre de Moraes não sejam cumpridas nos Estados Unidos.

Parece positivo para o ministro brasileiro, mas não é. Na sua apreciação, a juíza enfatizou que negou a liminar por não haver “qualquer evidência de que o governo brasileiro, o governo dos Estados Unidos ou qualquer outra entidade relevante tenha tentado fazer cumprir as ordens emitidas por Moraes” no país.

Mas decidiu que os autores da ação não estão obrigados a seguir as ordens do ministro brasileiro, uma vez que eles não as receberam conforme o estipulado pelos tratados de que os Estados Unidos e o Brasil são signatários.

E A ADVERTÊNCIA – A decisão da juíza termina com um alerta: “Caso uma entidade ou um indivíduo procure fazer cumprir as diretivas ou pronunciamentos nos Estados Unidos, sem que elas estejam em conformidade com as leis e os tratados aplicáveis, este Tribunal estará pronto para exercer a sua jurisdição”.

Na esfera política, o caldo também está engrossando. Altos integrantes do governo americano consideram o ministro brasileiro “autoritário”. Do presidente Donald Trump, cuja empresa de mídia e tecnologia se associou ao Rumble para enfrentar Alexandre de Moraes na Justiça, a Elon Musk, dono do X que se tornou alter-ego de Trump, passando pelo secretário de Estado, Marco Rubio.

Teve ares de recado a saudação do presidente americano a Jair Bolsonaro, na última conferência dos conservadores, em Maryland.

BARRANDO MORAES – Mais: deverá ser votado esta semana, na comissão de Justiça da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, um projeto de lei que, caso vá a plenário e seja aprovado, pode impedir a entrada de Alexandre de Moraes no país.

O projeto de lei, elaborado por trumpistas na esteira da suspensão do X no Brasil, prevê que deixam de ter direito de entrar e permanecer nos Estados Unidos agentes estrangeiros que tenham afrontado o direito à liberdade de expressão de cidadãos americanos em solo americano, como é o caso dos influenciadores bolsonaristas Paulo Figueiredo e Rodrigo Constantino, banidos das redes por Alexandre de Moraes, acusados de serem golpistas. Bastam os votos dos republicanos, do partido de Donald Trump, para que a lei seja adotada.

ADVERSÁRIOS FORTES – Brigar com empresas dos Estados Unidos nunca foi bom negócio, e o STF encontrou adversários fortes demais por lá.

Se essa briga escalar como promete, é preciso que os ministros reflitam se ela não prejudicará os interesses das empresas nacionais.

Não está descartado que, a pretexto de defender empresas americanas, o governo Trump parta para sanções econômicas contra o Brasil, e ninguém quer saber de perder dinheiro por causa de picuinhas. É preciso ter princípio de realidade.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOGO Supremo vinha seguindo Moraes como se ele fosse o Oráculo de Delfos. Agora, os ministros estão caindo na real de que ele se comporta como uma barata tonta. É decepcionante. (C.N.)

Ministro vai cobrar Ibama para perfurar perto da Foz do Amazonas

SILVEIRA 19.06.2024 MINISTRO  ALEXANDRE SILVEIRA/AUDIÊNCIA PÚBLICA CÂMARA DOS DEPUTADOS POLÍTICA OE   - O ministro de Minas e Energia (MME), Alexandre Silveira, durante audiência pública da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados em Brasília, realizada nesta  quarta-feira 19 de Junho de 2024. O ministro Silveira  apresenta aos deputados as ações do MME, e fala das políticas de transição energética. FOTO: WILTON JUNIOR/ESTADÃO. Foto: WILTON JUNIOR/Estadão

“Petrobras cumpriu as exigências”, diz Alexandre Silveira

Roseann Kennedy
Estadão

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, decidiu agir pessoalmente para cobrar do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) uma decisão rápida a favor da exploração de petróleo na Margem Equatorial.

Ele disse à Coluna do Estadão que irá à sede do órgão, nesta semana, para falar com o presidente Rodrigo Agostinho, e afirmou estar confiante de que o gestor rejeitará o parecer técnico contrário à perfuração do bloco FZA-M-59 no litoral do Amapá, na Bacia da Foz do Amazonas.

O ministro alega que a Petrobras já atendeu aos requisitos solicitados no processo para a concessão da licença ambiental e avaliou que o parecer técnico não tem solidez porque é discricionário. “O laudo não aponta uma ilegalidade, aponta uma convicção”.

O que o Sr. espera da conversa com o presidente do Ibama?
“Estou muito confiante que o presidente Rodrigo Agostinho vai deixar que os brasileiros e brasileiras façam os estudos para conhecer o potencial daquela região. Eu espero que essa decisão não se arraste mais. As condições estão dadas para uma tomada de decisão. Há dois pareceres jurídicos da AGU (Advocacia Geral da União) atestando a legalidade do procedimento, e a Petrobras cumpriu recentemente a exigência de ter um centro de reabilitação de fauna (para tratar animais marinhos em caso de acidentes na Margem Equatorial). Eu acho que essas duas coisas dão muito conforto para ele pra definir”.

Qual a importância do parecer técnico contrário à exploração?
“Quando é apontado no processo uma ilegalidade não tem jeito. É um obstáculo intransponível. Como lá (no laudo) não tem, é óbvio que Agostinho pode entender diferente daqueles pareceristas do Ibama. Se não existe impedimento legal, a decisão tem um grau de discricionariedade do gestor. O parecer não tem solidez porque ele é completamente discricionário. Ele não aponta uma ilegalidade, ele aponta uma convicção. Não há nenhum estudo que aponte um risco lá no Amapá diferente dos riscos da Bacia de Campos. A Bacia de Campos está muito mais próxima do Rio de Janeiro do que a área de estudo do Amapá.

Qual o prazo para decisão?
“Não tem prazo legal, esse é o problema. O que eu fico cobrando sempre é celeridade. Eu só acho que Agostinho deve fazer o mais rápido possível para que a estabilidade dos investimentos da Petrobras não fique à mercê do tempo dele. Desde 2013 (há essa discussão). O que adiantou demorar 11 anos para licenciar a linha de transmissão Manaus Boa Vista? Deixar as térmicas a óleo de Manaus e Boa Vista? E agora nós vamos entregar. E o óleo queimou durante 11 anos, aumentando o custo de energia para o consumidor do Brasil”.

Quais os riscos de se arrastar a decisão?
“Prejuízo para a maior companhia do País e uma péssima sinalização para a economia nacional por causa da estagnação de investimentos estratégicos. E um crime lesa pátria contra o povo do Amapá”.

O presidente Lula tem criticado a “lenga-lenga” do Ibama…
“Todos os órgãos de governo, quando o Brasil está crescendo como está, naturalmente têm uma limitação de gente, uma limitação de resposta. Mas é muito necessário que a gente tenha celeridade nos licenciamentos. A Margem Equatorial é uma grande fonte do desenvolvimento do Norte e Nordeste do País. Você tem várias licenças ambientais em obras de geração de energia que precisam ser aceleradas. Então, isso é uma realidade que a gente lida no dia a dia.”

Não haverá constrangimento na COP30?
“O Brasil tem que se orgulhar de sua matriz energética. 90% de energia limpa e renovável, o maior pulmão do planeta está na nossa floresta amazônica. O Brasil não tem que se envergonhar de ter também na sua matriz uma fonte de recursos que o mundo demanda por ela, que é o petróleo. Nós não estamos falando de uma vontade de vender. Nós estamos falando de uma necessidade do mundo de comprar. Se não comprar da gente, vai comprar do Oriente Médio. Aí vai enriquecer, aumentar o PIB dos países do Oriente Médio, e vai empobrecer o povo brasileiro”.

E o isolamento da ministra Marina Silva, do Meio Ambiente?
“Marina nunca deu a voz que era a favor ou contra. Nas reuniões nossas várias reuniões com o Rui Costa (ministro da Casa Civil), ela sempre falou ‘isso é de competência do Ibama’. Ela é muito correta com o Davi Alcolumbre (presidente do Senado). Então, independentemente das convicções pessoais, ela tem sido muito coerente em dizer que essa decisão era de exclusiva responsabilidade do gestor do Ibama.

Homens fortes na política não eram gênios em estratégia, diz analista

Strongmen Audiobook | Free with trial

Mussolini foi um dos líderes focalizados pela escritora

Hélio Schwartsman
Folha

“Apesar de ouvirmos com frequência que homens-fortes são gênios da estratégia, poucos deles, ou talvez até mesmo nenhum, seguem um plano diretor. Seus verdadeiros talentos não são os do mestre de xadrez, mas os dos valentões de rua e vigaristas: rapidez para extrair o máximo das oportunidades que lhes são oferecidas, habilidade para fazer com que as pessoas se liguem a eles e acreditem em suas ficções, e a disposição para fazer qualquer coisa para obter a autoridade absoluta pela qual anseiam. A maioria deles termina com muito mais poder do que jamais imaginou”.

O diagnóstico acima é da historiadora americana Ruth Ben-Ghiat (Universidade de Nova York). Ele parece nas páginas finais de “Strongmen” (homens-fortes). O livro pode ser descrito como uma tentativa de entender ditadores e líderes populistas de direita, analisando as características que os unem e, dentro delas, como diferem um do outro. Essas diferenças, é bom frisar, podem ser grandes.

PERSONAGENS – Ben-Ghiat escrutina as trajetórias de Mussolini, Hitler, Franco, Gaddafi, Pinochet, Mobuto Sese Seko, Berlusconi, Erdogan, Putin e Trump. Outros líderes de mesmo jaez, como Bolsonaro, Duterte, Modi e Orbán, fazem aparições mais breves, como coadjuvantes.

A autora mostra como eles ascenderam ao poder, como se utilizaram de nacionalismo, propaganda, virilidade (incluindo catálogos de seus apetites sexuais), corrupção e violência —as ferramentas para exercê-lo— e como eventualmente caíram. Autocracias e ditaduras são sempre mais instáveis do que democracias.

O livro é de 2020. Isso significa que cheguei a ele com um quinquênio de atraso. A demora acabou criando um efeito interessante. Os traços autoritários que ela aponta em Donald Trump são ainda os do primeiro mandato e anteriores à invasão do Capitólio. Se já tínhamos motivos para nos preocupar, temos agora muito mais razões para angústia, pois o que vimos nestas primeiras semanas de segundo mandato são as piores características elevadas ao cubo.

Delfim Netto, eventual conselheiro de Lula, morreu em agosto e faz falta

Lula seguia os conselhos de Delfim e não tem mais guru

Elio Gaspari
O Globo

Diante da carestia dos alimentos, Delfim poderia mostrar a Lula como é possível fabricar quedas artificiais ou momentâneas de preços. Poderia, sobretudo, mostrar que algumas medidas servem para nada.

Confrontados com a carestia, presidentes e hierarcas passam por duas fases. Na primeira, culpam o povo que compra gêneros caros (Lula já queimou essa etapa). Na segunda, acreditam em medidas pontuais (Lula entrou nesse estágio).

SOLUÇÕES MÁGICAS – Delfim alertaria o presidente contra os colaboradores que oferecem soluções mágicas. Nesse ramo, ele superou o grande Houdini, mas não acreditava nos próprios truques. Ele conhecia as limitações do poder de Brasília e por isso tornou-se um valioso conselheiro longe dela.

Na quinta-feira, o vice-presidente Geraldo Alckmin reuniu hierarcas para anunciar medidas de combate à carestia. Repetiu-se o cenário do anúncio do pacote de contenção de gastos, anunciado por Haddad. Estava todo mundo lá, menos Lula. Como disse um sábio à época, se fosse para dar certo, Lula faria o anúncio.

Lula não dispõe mais dos conselhos de Delfim e está diante de um processo de fritura de Fernando Haddad, seu ministro da Fazenda. Trata-se de uma fritura especial. Há quem traga o óleo e também a frigideira, mas falta o sujeito que controla o fogão e ele é o presidente da República.

EXEMPLO DE PALOCCI – Lula não fritou Antonio Palocci no seu primeiro mandato, apesar dos sinais emitidos por Dilma Rousseff, chefe de sua Casa Civil (hoje, quem está na cadeira é Rui Costa, com sua malquerença em relação a Haddad).

Como ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento, Delfim mandou na economia até 1985. Deixou o governo com a inflação em 224% enquanto cantava-se “o povo está a fim da cabeça do Delfim” (ele tinha na sua sala um Delfim sem cabeça emoldurado).

Depois que ele foi embora, fritaram-se nove ministros da Fazenda, até que Itamar Franco colocou Fernando Henrique Cardoso na cadeira. Ambos sabiam o que fazer, a inflação foi derrubada e o Brasil voltou a ter uma moeda, o real. Fritar ministros era fácil. Difícil era decidir o que fazer.

Graças ao Banco Central, a inflação está contida, mas a carestia está solta e o governo, sem saber o que fazer, mostra que sabe organizar eventos. No de quinta-feira, o som das perguntas falhava.

Bolsonaro tem de escolher um candidato substituto que não o traia

Bolsonaro chora após ser impedido de ir à posse de Trump

Bolsonaro sabe que não terá chances no julgamento do STF

Diogo Schelp
Estadão

Jair Bolsonaro disse que só morto indica outro candidato para disputar a Presidência em 2026. Ele já errou outras vezes em previsões em que atrelou sua morte ao seu futuro político. Em 2021, em um dos muitos momentos em que flertou com a recusa em deixar o cargo, disse que só encerraria o mandato preso, morto ou com vitória.

Não foi preso, não morreu e tampouco foi vitorioso. Optou pelo aeroporto às vésperas da posse de Lula, depois de meses conspirando nos bastidores para precipitar algum tipo de ruptura institucional.

NA PORTA DA PRISÃO – Em 2026, só será diferente em um ponto: é provável que até lá Bolsonaro esteja, de fato, preso. Na melhor das hipóteses, para ele, continuará eleitoralmente morto como está agora, ou seja, inelegível.

Ninguém duvida que acabará indicando um candidato para concorrer à Presidência em seu lugar. A questão é quando fazê-lo. Agora ou na última hora?

Um dos problemas de Bolsonaro é sua incompetência para tomar a melhor decisão no momento certo quando as variáveis são muito complexas. A sua gestão desastrosa da pandemia é a prova disso.

PROBLEMA COMPLEXO – Saber o momento certo de parar de insistir no próprio nome como candidato da direita populista é complexo porque nenhuma das opções é muito boa para Bolsonaro.

Se jogar a tolha agora, ele perde a aura de único líder legítimo do seu nicho eleitoral e, com ela, a possibilidade de elevar o custo político de uma eventual condenação por tentativa de golpe de Estado, entre outros crimes que estão sendo analisados pelo STF. Um líder populista nunca pode deixar de alimentar a ideia de que é insubstituível.

Se, por outro lado, Bolsonaro deixar para a última hora a escolha de um sucessor, acabará criando dois problemas. O primeiro é que haverá menos tempo para trabalhar o nome de sua preferência junto ao eleitorado. O segundo é que isso estimula a fragmentação da direita em diversos pré-candidatos, alguns dos quais já estão querendo demonstrar que não precisam da bênção do ex-presidente.

MENORES CHANCES – Nos dois casos, o efeito é diminuir as chances de vitória de um candidato endossado por Bolsonaro. A popularidade do atual governo está derretendo, mas Lula ainda é a opção mais viável para a esquerda em 2026. E ainda não surgiu um nome moderado forte o suficiente para livrar o País dos extremos políticos.

Há um terceiro cálculo a ser feito, caso Bolsonaro reconheça, pelo menos para si mesmo, que não irá recuperar sua elegibilidade e que há uma grande chance de que venha a ser preso.

A sua melhor opção, nesse cenário, é que o candidato vitorioso na eleição de 2026 seja alguém que aceite lhe conceder a graça presidencial assim que tomar posse, ou seja, que decrete a extinção de eventuais punições que tenham sido impostas a ele.

CUMPRIR PENA – Mas isso significaria admitir a hipótese de passar pelo menos alguns meses na cadeia e exigiria uma confiança muito grande no sucessor escolhido.

Alguém minimamente racional ficaria tentado a pensar que pode ser melhor deixar o mentor na cadeia do que solto, exigindo cargo no governo, fazendo articulações políticas e tomando decisões pelas costas do pupilo. Rei morto, rei posto. Uma alternativa familiar (a esposa Michelle ou o filho Eduardo, por exemplo) parece mais segura, mas um ou uma Bolsonaro do B teria menos chances contra Lula – e daí Bolsonaro continuaria preso.

Além de afirmar que só morto nomearia um candidato alternativo, Bolsonaro também diz que, se existisse um “motivo justo” para ele estar inelegível, “arrumaria uma maneira de fugir”. Entre a cadeia e o perdão, o aeroporto (após um pedido de asilo em alguma embaixada) parece uma opção cada vez mais factível para o ex-presidente.

Washington Post teria se tornado o jornal oficial de Donald Trump?

Fake editions of The Washington Post handed out at multiple locations in D.C.

Jeff Bezos, dono do jornal, abandona a imparcialidade

Juliano Spyer
Folha

A noção de que “um bom jornal é uma nação conversando consigo mesma” deixou de ser verdade para The Washington Post. Desde a semana passada, a publicação aceita apenas artigos opinativos que defendam as liberdades individuais e econômicas. Teria se tornado, como dizem os críticos, o veículo de notícias oficial do trumpismo?

“A sociedade não precisa de jornais, o que precisamos é de jornalismo”, escreveu em 2008 Clay Shirky, professor e pesquisador da Universidade de Nova York. Para ele, o desafio era deixar de pensar em salvar jornais como modelo de negócio para, em vez disso, salvar a sociedade. Isso traria a motivação para reimaginar o jornalismo a partir de outros modelos.

CONTESTAÇÃO – O jornalista e pesquisador russo Andrey Mir, ligado à Universidade de York, no Canadá, aprofunda essa análise. Em seu livro mais famoso, “Post-Journalism and the Death of Newspapers” (Pós-Jornalismo e a Morte dos Jornais), ele argumenta que o trumpismo evoluiu a partir do mesmo contexto que produziu movimentos de contestação como a Primavera Árabe e o Occupy Wall Street.

Mir sustenta que não há uma intenção maliciosa ou uma conspiração por trás da polarização política. O modelo de negócio de veículos tradicionais como o Washington Post dependia da fabricação de consensos para agregar leitores com visões de mundo diferentes.

Mais leitores significavam mais receita publicitária. Mas a horizontalização do acesso à mídia tornou esse modelo obsoleto.

ESTÃO DISPONÍVEIS – Por que pagar por notícias se elas não estão mais limitadas à materialidade do papel, do rádio ou da TV e podem ser copiadas, coladas e redistribuídas infinitamente online? E como competir pela atenção do público com youtubers que entregam seu conteúdo gratuitamente nas redes sociais?

Jeff Bezos, bilionário dono do Washington Post, justifica a mudança na política editorial do jornal com base nessa mesma lógica da abundância de conteúdo. Em nota publicada no X, ele afirmou que, no passado, os jornais ofereciam aos leitores “uma seção de opiniões de base ampla que buscava cobrir todas as visões. Hoje, a internet faz esse trabalho”.

A teorização de Mir explica a trajetória recente dos jornais — não apenas do Washington Post — de substituir a fabricação de consensos pela escolha de um dos lados do debate político polarizado. Em um cenário em que todos têm acesso à mídia, é o dissenso, e não mais o consenso, que impulsiona a mensagem.

VAQUINHAS ONLINE – Essa mudança, segundo Mir, força o jornalismo a se transformar em “propaganda financiada por vaquinhas online”. O apelo para financiar o serviço passa a ser “defender a democracia” ou “combater o comunismo”.

“Os membros pagantes não pagam para receber as notícias (eles já as conhecem)”, escreve Mir. “Eles pagam para que as notícias sejam distribuídas para outros.”

A polarização não é um efeito colateral, mas uma condição para o sucesso desses negócios. Pessoas mais ansiosas tendem a apoiar mais seu veículo preferido. A perspectiva que Mir apresenta sugere que publicações como o New York Times, que criticaram a decisão de Bezos, estão mais próximas do Washington Post do que admitem.

NOTA DA REDAÇÃO DO BLOGEsse “alinhamento” do jornal a uma determinada corrente de opinião representa a morte do jornalismo e um gravíssimo retrocesso social. Significa abandonar a busca do que é certo e conveniente. A humanidade não merece isso, sinceramente.  (C.N.)

A participação do governo Lula no PIB parece um gol feito com a mão…

PIB é tema das charges desta sexta-feira; confira - Fonte 83

Charge do Quinho (Charge Online)

Mario Sabino
Metrópoles

O PIB do Brasil cresceu 3,4%, o melhor resultado desde o 2021 da imediata pós-pandemia, quando a alta foi de 4,8%, divulgou o IBGE, aquele instituto em vertigem desde que o diligente petista Marcio Pochman assumiu a presidência.

Viva, salve, ainda estamos aqui etc. Mas cresceu e desacelerou no quarto trimestre, com a queda no consumo das famílias, apontando para um 2025 mais difícil. Essa é a versão bem-comportada do noticiário econômico.

REPELENTE DE LEITOR – Parêntese. No jornalismo, sinal de porcentagem funciona como repelente de leitor, mas não há o que fazer: de vez em quando, nós nos vemos obrigados a abordar assuntos matemáticos. Fecha parêntese. Persista, por favor.

Depois da leitura da notícia, fui espiar a imprensa americana — e eis que há uma notícia sobre Produto Interno Bruto por lá. Donald Trump quer mudar a forma de calcular o PIB e o crescimento econômico.

O secretário de Comércio do governo americano, Howard Lutnick, disse à Fox News que, “historicamente, os governos têm brincado com o PIB. Eles contam as despesas governamentais como parte do PIB. Vamos então, separar as duas partes (o que é governo e o que é mercado) e tornar isso transparente”.

FALSO CRESCIMENTO – “Se o governo compra um tanque, isso é PIB”, afirmou Lutnick. “Mas pagar mil pessoas para pensar em comprar um tanque não é PIB. Isso é ineficiência, dinheiro desperdiçado.”

A transparência não é o maior interesse de Donald Trump. Com as demissões de dezenas de milhares de funcionários e demais cortes nos gastos do governo que ele está promovendo por meio do Departamento de Elon Musk, o crescimento do PIB dos Estados Unidos pode sofrer desaceleração.

Donald Trump quer, assim, atenuar o eventual efeito negativo da comparação com o PIB sob Joe Biden, mostrando que o crescimento da economia do país na administração do antecessor se deveu, em boa parte, ao empurrão proporcionado pela expansão das despesas governamentais.

CONFIRA A REALIDADE – Feita a observação, volte-se aos números. Nos Estados Unidos, em 2023, a participação dos gastos do governo no PIB foi de 36%, segundo o Fundo Monetário Internacional; no Brasil, foi de 45%, e essa porcentagem deve estar agora em 47%, por aí, por causa da aposta no Bolsa Família, do aumento das despesas assistenciais e previdenciárias e do salário mínimo acima da inflação.

Aonde quero chegar? Já cheguei: na versão mal-comportada do noticiário econômico, a participação do governo Lula no PIB parece gol de mão, e nossa economia não é handebol.

Dúvida cruel! Onde há mais democracia hoje: nos EUA ou no Brasil?

Presidente norte-americano Donald Trump em sessão no Congresso dos Estados Unidos

Trump não ameaça em nada a democracia americana

J.R. Guzzo
Estadão

É curioso, na excitação nervosa que ferve nas classes civilizadas quando mencionam os nomes “Donald” e “Trump” na mesma frase, observar a condição indispensável que exigem para começar qualquer conversa a respeito: é proibido pensar. Você aceita, logo de cara, que Trump é a maior calamidade que o gênero humano já conheceu?

 Então podemos começar o debate. Você acha mais correto examinar primeiro os fatos, e fazer um raciocínio lógico sobre as ações concretas do novo presidente americano até agora, e só depois dar o seu julgamento? Aí não tem debate.

NA IGREJA ANTIGA – É como na Igreja de outras eras. Ou o sujeito é católico, acredita nos santíssimos sacramentos e obedece ao que diz o padre, ou não. Se proceder de acordo com essas condições contratuais, pode aspirar à salvação. Tem sido assim com Trump. É proibido fazer perguntas objetivas no assunto, como era proibido perguntar sobre o funcionamento objetivo da Santíssima Trindade. É questão de fé e de doutrina; não mexa com essas coisas.

Se fosse possível lidar com a “questão Trump” de maneira racional, seria interessante, por exemplo, começar perguntando o seguinte: como, e por que, um país que tem Alexandre de Moraes pode estar preocupado com as ameaças que, segundo o pensamento oficial, Trump estaria trazendo à democracia nos Estados Unidos e no mundo?

O governo, a esquerda e nossas classes culturais se dizem apavoradas com Trump. Tudo bem, mas onde há mais democracia nesse preciso momento – nos Estados Unidos ou no Brasil?

ATOS DE TRUMP – O presidente americano tem falado sobre aumento nas taxas de importação – mais falado do que feito, aliás. É intolerável, dizem nossos pensadores. Mas não é permitido perguntar como seria, em cima de fatos e números da vida real, essa anunciada destruição da economia global.

Trump quer cortar 20% dos gastos do governo com a eliminação de despesas inúteis e fraudulentas. E se o Brasil fizesse a mesma coisa? Seria bom ou ruim?

Mais: alguém acredita que os desperdícios e ladroagens do governo brasileiro sejam de apenas 20% do orçamento público? E os imigrantes ilegais – por acaso o Brasil aceita imigração ilegal?

SINUCA DE BICO – Na questão da Ucrânia, uma das que mais enfureceu os comunicadores do time civilizado até agora, formou-se uma sinuca de bico. O presidente da Ucrânia é descrito com um herói por defender os interesses da Ucrânia.

Por que o presidente americano não pode defender os interesses americanos? Ele acha que a população do seu país não vai ganhar nada se continuar jogando centenas de bilhões de dólares numa guerra que não pode ser vencida.

O Brasil aceitaria isso? Não. Mas pensar, em relação a Trump, não é uma opção.

Comparado com novos 007s, Connery se veria como um Bond “shakespeariano”

Um dia para ver o James Bond de Sean Connery - Blog de Hollywood

Sean Connery tentou fugir do personagem, mas não conseguiu

Ruy Castro
Folha

Um romance policial de 1967, “A Dandy in Aspic”, de Derek Marlowe, conta a história de um espião inglês encarregado de matar um colega de serviço secreto suspeito de estar a soldo do inimigo. Até aí, é uma trama comum da ficção de espionagem. O problema é que o agente de que se suspeita é ele próprio, disfarçado, fazendo-se passar por um operador a serviço de uma potência estrangeira. E tão bem que nem seus superiores sabiam. É como se Sean Connery tivesse de matar James Bond.

Pois não é que, na vida real, isso aconteceu? Connery, revelado como Bond em “O Satânico Dr. No” (1962) e consagrado nos filmes seguintes (“Moscou Contra 007”, 1963; “007 contra Goldinger”, 1964; e “007 Contra a Chantagem Atômica”, 1965), não queria tornar-se sinônimo do personagem. Em sua cabeça, ele é que consagrara Bond, não o contrário. O problema é que não era ninguém antes de “Dr. No” e só foi escolhido porque a mulher de Harry Saltzman, coprodutor da série, admirou-o sem camisa num filme e cabalou por ele com o marido. Saltzman aceitou: Sean era barato, e ninguém sabia que James Bond seria uma mina de ouro.

TENTOU FUGIR – Connery tentou fugir de Bond, mas em vão. Teve de voltar a ele em “Com 007 Só Se Vive Duas Vezes” (1967),  e”007 Os Diamantes São Eternos” (1971), porque seus filmes fora da série, alguns bons, não tinham a bilheteria dos 007s.

Uma biografia, “The Measure of a Man”, de Christopher Bray, revela um Connery não tão admirável: inseguro, invejoso (não suportava que Clint Eastwood cobrasse mais do que ele para trabalhar) e violento (agrediu sua primeira mulher, Diane Cilento, respeitada atriz shakespeariana).

Connery, que morreu em 2020 aos 90 anos, nunca foi superado como Bond, mas também não o superou. Porém tudo isso promete mudar porque, com a venda de seus direitos para a Amazon, 007, já há muito corrompido pelos efeitos especiais, agora é que não será mais o mesmo.

Comparado com os 007s que vêm por aí, Sean Connery se veria como um James Bond quase shakespeariano.

Ao atacar o agronegócio, Lula consegue desautorizar Haddad, Alckmin e Fávaro

Lula em discurso em um assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Campo do Meio (MG)

A cada discurso, Lula prejudica o governo e seus ministros

Eliane Cantanhêde
Estadão

Ao ameaçar o agronegócio com “medidas drásticas”, caso os preços dos alimentos não caiam, o presidente Lula não apenas deu uma de Donald Trump como desautorizou o seu vice, Geraldo Alckmin, e o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, que se esfalfaram para dar garantias para a sociedade, produtores, distribuidores, atacadistas e redes de supermercados de que não haveria “soluções heterodoxas”. Todo o esforço foi jogado no lixo.

Neste momento tenso no Brasil e no mundo, Lula subiu no palanque justamente num evento do MST e no dia do anúncio de um PIB animador para, mais uma vez, matar a boa repercussão do PIB e conquistar manchetes amargas por toda parte, reforçando a percepção de que insiste em repetir os erros de Dilma Rousseff e descambar perigosamente para uma esquerda sem rumo.

MÉDIDAS DRÁSTICAS – Acenar com “medidas drásticas” é desmentir Alckmin e Fávaro, que vinham negando categoricamente taxação, que remete ao desastre do Pix e às loucuras de Trump; controle de preços, que traz de volta o fantasma dos “fiscais de Sarney”; e cotas de importação, que os produtores não querem nem ouvir falar. E onde fica Fernando Haddad, que tem muito a ver com o comemorado crescimento de 3,4% em 2024?

Lula tem razão ao reclamar dos preços de café, ovo, milho…, como qualquer um faz, mas dizer que “não quer brigar com ninguém” é coisa de quem está exatamente buscando briga. E logo com quem?

Ora, com o agronegócio, que historicamente já tem um pé atrás com ele e o PT, sofreu bastante com seca, cheias, fatores externos e disparada do dólar em 2024 e, depois de ser a “pièce de résistance” nas duas recessões de Dilma e na pandemia, recuou 3,2% no PIB de 2024. Desta vez, o bom desempenho da economia foi graças à indústria e a serviços.

ARMAS LIMITADAS – É verdade que o governo tem instrumentos limitados para conter a inflação da mesa do brasileiro, mas zerar o imposto de importação de café, carnes e açúcar, por exemplo, não deve mudar nada, só atrai dúvidas de especialistas quanto à eficácia e mais animosidade entre produtores, preocupados com a competição.

O Brasil é grande exportador e o impacto de corte de impostos em importações modestas tende a ser pequeno, mas serve para alimentar as críticas do agro.

E, assim como no debate sobre o pacote da segurança de Ricardo Lewandowski, os governadores de oposição também jogaram na fogueira da polarização a proposta de Alckmin de zerar o ICMS (imposto estadual) de alimentos. O que está na mesa não é a comida do povo e nem mesmo as alegadas dificuldades econômicas dos Estados, é principalmente a disputa eleitoral e as ambições de 2026.

BATER DE FRENTE – Para reforçar a imagem de esquerda, Lula não se satisfaz em potencializar as recentes medidas populares, como a própria proposta para alimentos, impedir o aumento de 6% na conta de luz no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, liberar o FGTS de quem tinha optado pelo saque-aniversário e a isenção do IR para renda até R$ 5 mil. Ele precisa também bater de frente com o agro, o mercado, a “turma de cima”. O que lucra com isso?

Nesta segunda-feira, Gleisi Hoffmann volta ao Planalto, agora na Articulação Política, e Alexandre Padilha, ao Ministério da Saúde. Ela foi chefe da Casa Civil e ele ocupou o mesmo cargo no governo Dilma, de onde conduziu o “Mais Médicos”, que a categoria rejeitou e retaliou depois ao apoiar maciçamente Jair Bolsonaro em 2022 – depois de todas as suas manifestações e decisões macabras na pandemia.

Lula despachou Dilma para o banco dos Brics para mantê-la bem longe, mas Dilma nunca esteve tão próxima.

Conclave do Vaticano é o próximo grande objetivo político de Trump

Quem é J.D. Vance, novo vice-presidente dos EUA

Trump e Vance querem incluir também na política da Igreja

Jamil Chade
do UOL

Permeado por católicos ultraconservadores e tradicionalistas, o governo de Donald Trump colocou o conclave como seu próximo grande objetivo político. Com a participação da diplomacia americana, de deputados da base mais conservadora e uma rede de entidades religiosos, a Casa Branca tenta influenciar a direção que pode tomar a escolha do novo papa, caso Francisco tenha de renunciar ou não sobreviva a seus problemas de saúde.

Fontes em Washington confirmaram ao UOL que os trabalhos já começaram. Ainda em dezembro, Trump anunciou a escolha de Brian Burch como o embaixador dos EUA na Santa Sé. No Vaticano, o gesto foi considerado como uma declaração de guerra contra o papa Francisco e sua linha de atuação.

ACUSAÇÕES AO PAPA – Nos últimos anos, Burch acusou o papa de populismo, e de “criar confusão” ao permitir que padres abençoem casais do mesmo sexo e de flexibilizar na doutrina. Ele ainda tem sido um crítico da decisão de Francisco de destituir líderes católicos conservadores de seus cargos, entre eles o arcebispo Carlo Maria Vigano, excomungado.

Um sentimento de indignação ainda tomou conta dos mais radicais quando o papa afastou o bispo Joseph Strickland de sua diocese no Texas ou quando houve a retirada de benefícios do cardeal Raymond Burke.

Mas é nos bastidores que sua atuação é mais esperada neste momento. O cálculo do governo americano é de que, mesmo que o pontífice não morra no curto prazo, os próximos quatro anos serão decisivos para influenciar a escolha do novo papa. Trump terminará seu mandato com um papa que, se vivo, terá 92 anos.

DIVULGAR NOMES – Preparar o conclave, portanto, se transformou em um objetivo político da Casa Branca. Ainda que o voto seja exclusividade de cardeais e que muitos deles tenham sido nomeados por Francisco, a percepção é de que se pode criar um “clima” de pressão e, desde já, articular nomes que poderiam se apresentar como alternativas a uma continuação da gestão de Francisco.

Do lado político, reconquistar o Vaticano seria estratégico para permitir que a agenda ultraconservadora americana ganhe a benção e a chancela diplomática da Santa Sé para ser difundida pelo mundo.

Ao anunciar seu embaixador em Roma, Trump escancarou a relação entre a política, a fé e sua escolha. “Brian é um católico devoto, pai de nove filhos e presidente da CatholicVote. Ele recebeu inúmeros prêmios e demonstrou uma liderança excepcional, ajudando a construir um dos maiores grupos católicos de defesa de direitos do país”, anunciou o republicano.

OPTARAM POR TRUMP – O presidente lembrou que Burch “me representou bem durante a última eleição, tendo obtido mais votos católicos do que qualquer outro candidato presidencial na história”. Os dados de fato confirmaram que os católicos optaram por Trump por uma margem de 20 pontos e foram decisivos nos estados decisivos no Cinturão da Ferrugem e no Sudoeste.

Burch sinalizou que sua missão no Vaticano iria muito além de representar Trump e, em sua declaração pública, omitiu qualquer referência ao papa. “Estou comprometido em trabalhar com líderes dentro do Vaticano e com a nova administração para promover a dignidade de todas as pessoas e o bem comum”, disse.

Nos bastidores, sua entidade CatholicVote tem sido fundamental para solidificar a aliança entre as alas mais conservadoras dos EUA e os republicanos. Desde 2009, o grupo fez doações de US$ 2 milhões para as campanhas de mais de 40 deputados do partido de Trump.

COM BANNON – Ele se aliou, em 2018, a Steve Bannon para rastrear dados de localização de celulares para enviar mensagens a pessoas que estavam nas igrejas para que fossem votar. A CatholicVote também foi usada para mobilizar o voto católico em 2024.

Nos corredores do Congresso e nos governos estaduais, a entidade é uma organização de lobby que luta contra o direito ao aborto, contra o movimento LGBT e apoia o fechamento de fronteiras.

Sua entidade ainda abriu processos judiciais contra bispos, contra o governo de Joe Biden e até contra aliados do papa. Em 2023, a CatholicVote arrecadou cerca de US$ 500 mil para tentar alterar a Constituição do Kansas para que o direito ao aborto fosse removido. O processo fracassou.

UMA DAS PEÇAS – Fontes em Washington explicaram ao UOL que Burch é apenas uma das peças da engrenagem, ainda que crítica. Dentro do governo, os católicos mais tradicionais contam com representantes de peso, entre eles Tom Homam, o “czar das fronteiras”, Karoline Leavitt, a porta-voz da Casa Branca, e JD Vance, o vice-presidente.

Também são católicos Linda McMahon, secretária de Educação, Elise Stefanik, embaixadora para a ONU e que afirmou que Israel tem “direito bíblico” sobre as terras palestinas. A lista ainda inclui Marco Rubio (Departamento de Estado), Sean Duffy (Transporte), o diretor da CIA, John Ratcliffe, e Robert F. Kennedy Jr., na Saúde.

Ao mesmo tempo, a Casa Branca cortou o financiamento de entidades ligadas ao papa Francisco, como a Catholic Relief Service.

O PAPA REAGE – Vaticano respondeu, mudando de última hora a escolha do arcebispo de Washington DC e colocando o cardeal Roberto McElroy no cargo. O religioso tem sido um dos principais críticos da política de Trump. Se não bastasse, Francisco enviou uma carta aos bispos americanos, atacando medidas de deportação do novo presidente.

A reação da Casa Branca foi imediata. Homam sugeriu que o papa se ocupasse de sua própria instituição, enquanto JD Vance disse que o argentino “precisa se olhar no espelho”.

No último dia 28, num encontro com católicos, coube justamente ao vice-presidente liderar uma oração pela saúde do papa. Mas ele concluiu sua fala indicando as discordâncias entre o papa e seu governo.

Rumble “ignora” a ordem de Moraes e mantém Allan dos Santos no ar

Para se manter, Allan dirige Uber nos Estados Unidos

Andreza Matais
do UOL

Duas semanas depois da ordem do STF (Supremo Tribunal Federal), a plataforma de compartilhamento de vídeos Rumble continua sem cumprir as determinações para voltar a operar no Brasil.

O ministro Alexandre de Moraes ordenou às operadoras de internet, em 21 de fevereiro, que bloqueassem o acesso à rede social enquanto não nomeassem um representante legal no Brasil e suspendessem a conta do blogueiro bolsonaristas Allan dos Santos, que está foragido nos Estados Unidos.

CONSPIRADOR – Santos é acusado de conspirar contra o regime democrático para manter Jair Bolsonaro (PL) no poder a despeito da derrota eleitoral. Ele teve a prisão decretada em 2021 por obstrução de Justiça, ameaça e crimes contra a honra. Desde então, está foragido e segue atuando por meio da Rumble, rede utilizada principalmente pela extrema direita e conservadores por não ter filtros.

O ministro também determinou pagamento de multa de R$ 50 mil por dia até que a plataforma regularize sua atuação. O valor cobrado da Rumble já chega a cerca de R$ 800 mil.

“Determino a suspensão imediata, completa e integral, do funcionamento do ‘Rumble INC.’ em território nacional, até que todas as ordens judiciais proferidas nos presentes autos — inclusive com o pagamento das multas — sejam cumpridas e seja indicada, em juízo, a pessoa física ou jurídica representante em território nacional”, disse Moraes na decisão.

OUTRA BRIGA – Como antecipado pela coluna, a ordem de bloqueio foi acatada até mesmo pela Starlink, de Elon Musk. O empresário trava um embate público com Moraes ao lado de Donald Trump, presidente dos EUA. Trump acusa o ministro brasileiro de censurar empresas norte-americanas. A Rumble também assina a ação.

O gabinete de Moraes entende que a ordem para retirar os posts de Allan dos Santos foi cumprida quando a plataforma foi retirada do ar por sua decisão. A rede segue, contudo, bloqueada por ignorar a determinação de Moraes para nomear representante no Brasil.

No ano passado, a Starlink foi ameaçada por Moraes de ter suas atividades suspensas e de ser multada, caso não bloqueasse o acesso ao X, também de Musk. Desta vez, a aceitação imediata tem, contudo, outra razão. A Starlink tenta aumentar sua área de atuação no Brasil e precisa da aprovação do órgão regulador.

MAIS SATÉLITES – Inicialmente, a empresa recebeu autorização para utilizar 4.408 satélites no Brasil até 2027. O pedido para expansão (7.500 satélites) e para utilizar equipamentos de segunda geração já teve aval da área técnica da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), mas o relator tem segurado o processo.

Representantes da empresa de Musk têm feito um périplo em Brasília para a agência votar a demanda. Estiveram com os presidentes da Câmara e do Senado. O deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) chegou a procurar a Anatel para se inteirar sobre o assunto.

Há uma expectativa sobre se o relator Alexandre Freire levará nesta semana o tema à pauta no plenário da Anatel.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
– Ninguém acessa Rumble no Brasil, porque ele não existe aqui. Os brasileiros acessam é o Rumble canadense,  facilmente captável aqui. Mas parece difícil que Moraes entenda isso. Ele ainda pensa (?) que existe Rumble no Brasil. É quixotesco, no sentido de ridículo. (C.N.)

A genial disparada política de Geraldo Vandré e Théo de Barros

Veja fotos de Geraldo Vandré, aos 88 anos - 10/06/2023 - Ilustrada - Fotografia - Folha de S.Paulo

Em setembro, Vandré vai completar 9o anos

Paulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, cantor e compositor paraibano Geraldo Pedroso de Araújo Dias, mais conhecido como Geraldo Vandré, e seu parceiro Théo de Barros, na letra de “Disparada”, fazem uma crítica à ditadura vivida na época e, consequentemente, apresenta uma comparação entre a exploração das classes sociais pobres pelas mais ricas e a condução das boiadas pelos boiadeiros, entre a maneira de se lidar com gado e se lidar com gente. 

Em 1966, a música “Disparada”, defendida por Jair Rodrigues, participou do II Festival de Música Popular Brasileira (TV Record), dividindo o primeiro lugar com “A Banda” de Chico Buarque, defendida por Nara Leão. Nesse mesmo ano, a música foi gravada pelo próprio Jair Rodrigues no LP “O Sorriso de Jair”, pela Philips.

DISPARADA
Théo de Barros e Geraldo Vandré

Prepare o seu coração
Pras coisas
Que eu vou contar
Eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão
E posso não lhe agradar…

Aprendi a dizer não
Ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo
A morte e o destino, tudo
Estava fora do lugar
Eu vivo pra consertar…

Na boiada já fui boi
Mas um dia me montei
Não por um motivo meu
Ou de quem comigo houvesse
Que qualquer querer tivesse
Porém por necessidade
Do dono de uma boiada
Cujo vaqueiro morreu…

Boiadeiro muito tempo
Laço firme e braço forte
Muito gado, muita gente
Pela vida segurei
Seguia como num sonho
E boiadeiro era um rei…

Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E nos sonhos
Que fui sonhando
As visões se clareando
As visões se clareando
Até que um dia acordei…

Então não pude seguir
Valente em lugar tenente
E dono de gado e gente
Porque gado a gente marca
Tange, ferra, engorda e mata,
Mas com gente é diferente…

Se você não concordar
Não posso me desculpar
Não canto pra enganar
Vou pegar minha viola
Vou deixar você de lado
Vou cantar noutro lugar

Na boiada já fui boi
Boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém
Que junto comigo houvesse
Que quisesse ou que pudesse
Por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu
Querer ir mais longe
Do que eu…

Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E já que um dia montei
Agora sou cavaleiro
Laço firme e braço forte
Num reino que não tem rei

Para não cumprir cadeia, Bolsonaro pedirá asilo em alguma embaixada

Bolsonaro foi escanteado e logo será esquecido, diz Ricardo Kotscho

Envelhecido, Bolsonaro aguarda seu julgamento no STF

Elio Gaspari
O Globo

Alguns militares presos por conta do golpismo de 2022/23 acreditavam que seriam libertados depois da denúncia da Procuradoria-Geral. Ela veio, e nada. Quanto a Jair Bolsonaro, se for condenado, o ex-presidente não pagará um só dia de cadeia. Irá para uma embaixada e pedirá asilo diplomático.

Em fevereiro de 2024, ele já dormiu uma noite na embaixada da Hungria, mas não pediu asilo. Se pedisse, corria o risco de ficar lá por algum tempo, até que o governo brasileiro lhe concedesse um generoso salvo-conduto, pois a Hungria (como os Estados Unidos) não é signatária da Convenção de Havana de 1928, que regula o asilo diplomático.

Se resolver ir para a embaixada da Argentina, a concessão do asilo é certa e o salvo-conduto não deverá demorar. O asilo diplomático é uma especiaria latino-americana e pode ser concedido ao cidadão que entra numa embaixada de país signatário da convenção e se declara perseguido político.

PRESSÃO SOBRE TARCÍSIO – Pelo andar da carruagem, o PP do senador Ciro Nogueira se afastará de Lula e terá candidato a presidente em 2026. Nogueira não esconde sua preferência pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.

Mas Tarcísio insiste em dizer que pretende disputar a reeleição. Aliados como Nogueira acreditam, mas estão certos de que ele não resistiria num cenário em que teria uma forte base de apoio, bafejada por pesquisas a seu favor e adversas para o governo.

Primeira Turma do STF tentará fechar os julgamentos até o final do ano

Charge reproduzida do Arquivo Google

Merval Pereira
O Globo

Qualquer defesa tem que tentar salvar seu cliente. No entanto, em relação a provas e evidências, a denúncia da Procuradoria-Geral da República está clara e será aceita, considerando que houve tentativa de golpe não apenas planejamento de golpe, que não constitui crime.

Os advogados terão que se virar no julgamento, mas não conseguirão barrar logo de cara o processo, anulando delações premiadas, como querem as defesas dos generais Augusto Heleno e Braga Netto. Suas argumentações não terão nenhum efeito.

PROCESSOS LENTOS – É uma ação judicial, com 34 réus e julgamentos individualizados, que leva muito tempo. Lembrem que o julgamento do mensalão durou quatro meses, depois de anos de debate. Mas na Primeira Turma do STF pode ser mais rápido.

Acredito que conseguirão terminar até o final do ano, para não entrar em período eleitoral. Mas a luta da defesa vai ser prorrogar o máximo possível, para Bolsonaro tentar sair elegível; e discutir a inelegibilidade apenas no TSE e não como condenado na justiça.

Tenho a impressão que o ânimo do STF é julgar e condenar até o final do ano. Vamos aguardar.

Ferocidade primitiva de Trump expõe diversas vulnerabilidades brasileiras

Trump toma posse na presidência: quais os contrapesos para poder 'absoluto' do republicano em seu 2° mandato - BBC News Brasil

Brasil não tem estratégia para enfrentar a ira de Trump

William Waack
Estadão

Donald Trump ouviu as preces, vindas também do Brasil, e está empenhado em destruir a pax americana (“pax” nesse contexto significa “ordem”). Azar nosso, pois ironicamente o mundo que está indo embora servia melhor a uma potência média e vulnerável como o Brasil se comparado à situação que está se desenhando rapidamente.

O problema que se apresenta já não é mais manter a necessária equidistância entre China e Estados Unidos, sendo bastante conhecida nossa dependência de mercados na Ásia e de insumos vindos de países ocidentais.

LIÇÃO DE TRUMP – Uma das lições centrais deixadas por Trump no tratamento da questão da Ucrânia é a de que ele considera que as potências “menores” não têm opções – só as que ele determina.

Assim é a ordem dos “fortões” e a implícita divisão tripartite do planeta, com seus ecos distantes de Yalta. Não está muito claro ainda o que Trump designou para “seu” pedaço do bolo, que parece ser o hemisfério das Américas (a Europa e Eurasia é problema de Putin e a Ásia de Xi Jinping). Mas está claro que não há “caminhos próprios” para os menores. Não importa quais sejam.

Isso pode parecer primitivo ao extremo, mas Trump é primitivo ao extremo — o que inclui sua falta de compreensão para o fato de que superpotências são fortonas pois presidem um sistema de alianças, com um mínimo de reciprocidade em várias instâncias e o reconhecimento de algum grau de interdependência.

PREÇO ALTÍSSIMO – É bastante provável que “America First” acabe pagando um preço altíssimo por conta de tamanha ignorância, mas isto está um pouco adiante ainda.

Por motivos comerciais e ideológicos, o Brasil aumentou como alvo aos olhos de Washington. E se uma guerra comercial entre os Estados Unidos e a China eventualmente abre oportunidade de curto prazo para exportações do agro brasileiro, a evolução da situação geopolítica, tal como a verificamos agora, tende a fechar oportunidades para o Brasil.

Esse resultado não se deve apenas a Trump. Está associado em larga medida ao fato de que, em termos de política externa, nos últimos anos a vida foi nos levando.

SEM ESTRATÉGIA – O Brasil foi sendo levado sem que tivesse desenvolvido qualquer coisa remotamente parecida a uma “estratégia”, ou sequer um debate abrangente sobre o que o País quer ser e qual seu lugar no mundo.

Durante décadas fizemos a opção preferencial de olhar para nosso umbigo.

O que Trump está expondo brutalmente é o fato de que somos altamente vulneráveis ao que outros pretendem decidir sobre nossos destinos. E é limitada nossa capacidade de reação ao que possamos considerar inaceitável ou indigno. Ou contrário aos nossos interesses. Quais, mesmo?

Não basta a promessa de reparar os danos causados pela extrema direita

Lula chega à metade do mandato com 28% das promessas concluídas #charge  #cartum #cartoon #humor #política #humorpolitico #desenho #art #caricatura  #caricature #jornal #opovo #jornalismo #illustration #ilustração  #editorialcartoon #politicalart ...

Charge do Clayton (O Povo/CE)

Maria Hermínia Tavares
Folha

Ao se despedir da vida pública em 2024, o octagenário Ricardo Lagos, político socialista que presidiu o Chile entre 2000 e 2006, conclamou seus conterrâneos a perseguir novos sonhos. Àquela altura, já se desfizera a Concertação de Partidos pela Democracia, frente que liderara a consolidação do sistema representativo, depois de 17 anos de ditadura, e alçara Lagos ao La Moneda.

Da mesma forma, seu PPD (Partido pela Democracia), que desempenhara papel essencial na transição, caminhava para a irrelevância.

NOVAS DEMANDAS – Mais de uma vez, com certo fatalismo, ele explicou a mudança política que o atingia —e aos seus companheiros— como o resultado natural da vida política democrática: conquistas sociais geravam novas demandas —”novos sonhos”, dizia— que as lideranças estabelecidas, por progressistas que fossem, nem sempre conseguiam discernir ou encarnar.

A observação de Lagos ajuda a enquadrar os problemas atuais do PT e do seu governo. Na festa dos 45 anos do partido do presidente Lula, as comemorações do passado prevaleceram sobre as propostas para o futuro.

Só mais do mesmo no recente rearranjo ministerial, na página PT – Partido dos Trabalhadores no Youtube, e nas postagens no perfil Lulaoficial, que registra a agenda do presidente no Instagram, agora sob a administração do ministro Sidônio Palmeira.

ATÉ OS INTELECTUAIS – Também os intelectuais do partido, outrora importantes no debate público, parecem recolhidos ao conforto de suas bolhas, onde o entrechoque de ideias — de onde nasce o novo — é mercadoria e escassa.

Despertados pelo choque das pesquisas que captam os humores dos brasileiros, o chefe de governo e os líderes de sua legenda enfim reconheceram que a sociedade mudou e que é preciso dar respostas inovadoras a suas demandas.

Não basta que as forças ora no poder cumpram o compromisso de reparar os danos infligidos ao país durante a destrutiva passagem da extrema direita pelo Planalto.

NAU SEM RUMO – Até agora, porém, as propostas, além de raras, parecem insuficientes para dar rumo claro ao governo. Tudo indica que a sua principal aposta é conquistar os cidadãos-eleitores pelo bolso, com benefícios econômicos — cuja viabilidade fiscal falta comprovar —, como a expansão do crédito consignado aos trabalhadores do setor privado e a isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5.000.

Se acompanhada de medidas que redistribuam de forma mais justa os tributos sobre os ganhos, a segunda medida representaria inegável avanço.

OUTROS DESAFIOS – Mas ficam de fora outros desafios igualmente importantes para dar feição política definida ao compromisso dos progressistas com a equidade, neste novo século.

Enfrentá-los requer lidar com a questão —nada trivial— da eficiência do Estado no provimento de saúde, educação e segurança para os cidadãos; em encontrar regras que protejam os que trabalham, levando em conta a diversidade das situações de emprego; e, por último, mas não menos importante, mostrar como a garantia das franquias básicas —a começar da liberdade de expressão— e o respeito às regras da democracia condicionam tudo mais.

Se a esquerda só tiver um belo passado pela frente, em lugar de sonhos, o país mais uma vez viverá o pesadelo da volta ao governo da direita tacanha e primitiva.

Ciro Nogueira diz que pressão para PP deixar o governo aumenta no partido

Ciro Nogueira defende que André Fufuca deixe o cargo de ministro no governo Lula

Nogueira pede que Fufuca deixe logo o cargo de ministro

Geovani Bucci
(Broadcast)

Durante entrevista à GloboNews nesta quinta-feira, 6, o presidente nacional do Progressistas e senador pelo Piauí, Ciro Nogueira, afirmou que “pressão” dentro do partido está aumentando para que o ministro do Esporte, André Fufuca, deixe o governo federal. “Para mim, Fufuca não deveria nem ter aceitado o ministério. Não quero mais postergar essa decisão”, declarou.

Nogueira ressalta que não há compatibilidade entre o seu partido e o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo ele, foi feito um convite pessoal do petista para o deputado federal, de modo que não houve uma aderência ao governo federal.

CASO DE BOULOS – O senador também critica a possibilidade do deputado federal mais votado de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL), entrar no governo, o que sinalizaria que o presidente estaria caminhando para o “extremo”.

“Não digo nem para deixar o governo, porque nós nunca entramos. […] Ultimamente, tem criado certo constrangimento essa situação. Existe pressão da bancada para tomar essa decisão”, continuou o senador. “Vou conversar sobre isso com algumas lideranças, como o deputado Arthur Lira.”

Embora Fufuca faça parte do governo federal, Nogueira é aliado ferrenho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele foi ministro da Casa Civil durante a gestão do capitão reformado, momento que desembarcou do petismo e alinhou-se ao bolsonarismo.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Só no Brasil, mesmo”! O partido tem um ministro, mas não apoia o governo Lula. Quem pode entender uma maluquice dessas. (C.N.)

Após ataques russos, Trump diz que ‘considera’ sanções contra o Kremlin

Donald Trump — Foto: REUTERS/Evelyn Hockstein

Trump ficou furioso com o ataque russo na negociação

Jamil Chade
do UOL

Após deixar a Ucrânia desprotegida contra ataques russos, o presidente Donald Trump anunciou nas redes sociais que considera adotar sanções contra Moscou. A iniciativa foi divulgada horas depois de as cidades ucranianas sofrerem um dos maiores ataques em meses, com mais de 260 mísseis e drones.

“Com base no fato de que a Rússia está absolutamente ‘batendo’ na Ucrânia no campo de batalha, agora estou considerando fortemente sanções bancárias, sanções e tarifas em larga escala sobre a Rússia até que um cessar-fogo e acordo final de paz sejam alcançados. À Rússia e à Ucrânia, sentem-se à mesa agora mesmo, antes que seja tarde demais. Obrigado”, escreveu Trump na rede social Truth Social.

JÁ HÁ SANÇÕES – Os EUA já aplicam amplas sanções contra os russos e não foi esclarecido pela Casa Branca o que significa a iniciativa de Trump.

A ideia foi anunciada dias após o presidente interromper a troca de inteligência com Kiev, o que deixou o governo de Volodimir Zelensky vulnerável diante dos ataques russos. Trump ainda suspendeu repasses financeiros para os ucranianos, armas e humilhou o presidente há uma semana no Salão Oval.

Trump foi acusado por democratas e europeus de ter tomado o lado da Rússia na guerra, exigindo de Zelensky que ceda parte do território e que renuncie a um projeto de entrada na Otan, exigências do Kremlin para interromper o conflito.

ATAQUES MASSIVOS – Zelensky condenou os ataques da Rússia durante a noite e pediu que a proposta da França de uma trégua limitada nos céus e no mar fosse estabelecida. “Ontem à noite, o exército russo realizou outro ataque maciço à nossa infraestrutura de energia. Várias instalações foram atacadas em diversas regiões — Odesa, Poltava, Chernihiv e Ternopil”, disse.

“No total, os russos usaram quase 70 mísseis, tanto de cruzeiro quanto balísticos, além de quase 200 drones de ataque. Tudo isso foi direcionado contra a infraestrutura que garante a vida normal”, explicou o ucraniano.

“Atualmente, os trabalhos de reparo e restauração estão em andamento sempre que necessário. Infelizmente, edifícios residenciais comuns também foram danificados. Em Kharkiv, um míssil russo atingiu um prédio de apartamentos. As pessoas ficaram feridas. Elas estão recebendo a assistência necessária”, completou.

CAÇAS EM AÇÃO – Zelensky também afirmou que caças F-16 e aviões Mirage fornecidos pela França foram usados “para proteger os céus ucranianos”.

“Em especial, os Mirage interceptaram com sucesso os mísseis de cruzeiro russos. Muito obrigado! Também quero reconhecer o desempenho de nossas forças de mísseis antiaéreos, da aviação do exército, de todas as nossas unidades de guerra eletrônica e dos grupos de fogo móveis”, disse.

O presidente da Ucrânia ainda cobrou uma solução que passe por uma atitude russa. “Os primeiros passos em direção à paz real devem incluir forçar a única fonte dessa guerra, a Rússia, a interromper esses ataques contra a vida”, insistiu.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG –
Sem o dinheiro e o apoio militar dos Estados Unidos, que acompanhavam por satélite e comunicavam toda movimentação das forças russas, a Ucrânia não tem a menor condição de manter a guerra. Isso ficou claro agora. É provável que Moscou aceite logo o cessar-fogo, mas o Ocidente precisa desbloquear os vultosos investimentos externos russos. A próxima semana é decisiva para a paz. (C.N.)