Novos ares no Banco Central despertam “jus esperneandi” da turma da Faria Lima

TRIBUNA DA INTERNET | O que Lula precisa fazer para conseguir baixar os  juros cobrados pelos bancos

Charge do Léo Correia (bicadura.com)

André Roncaglia
Folha

A mais recente reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) trouxe novos ares ao Banco Central, com a estreia dos diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Gabriel Galípolo (Política Monetária) e Ailton Aquino (Fiscalização).

A decisão do Copom de reduzir a Selic em 0,5 teve placar apertado (5 x 4) e fez um racha entre diretores mais moderados — em favor de reduzir a Selic mais rapidamente — e aqueles mais ortodoxos, que defendiam corte menor (0,25%).

METAS FUTURAS – A minuta e a ata da reunião mostram, de fato, uma diretoria mais arejada. A ata fez uma bem-vinda reflexão sobre a incerteza que afeta as estimativas de hiato do produto, o indicador do ignorado mandato de fomentar o pleno emprego.

Pela primeira vez desde 2017, saiu do balanço de riscos a preocupação com a incerteza fiscal e entrou o efeito da reforma do regime de metas que substituiu a meta ano-calendário pela meta contínua. Citar agora essa regra — a qual passa a valer apenas em 2025 — tem aparência de um recibo ao governo, pela manutenção das metas futuras de inflação em 3%.

Com um toque de oportunismo, Campos Neto, presidente do BC, deu o votou de desempate em favor do corte de 0,5. (60% dos agentes de mercado esperavam um corte de 0,25). Como fiador da intransigência monetária que ainda asfixia o setor produtivo, ele sabe que cortes de mesma magnitude até o final do ano levarão a Selic a 11,75%, um nível ainda bastante restritivo.

MÁS CONDUTAS – Em seu cálculo político deve ter pesado a previsão de publicação da reportagem da revista Piauí (agosto/23) expondo duas condutas suas que justificariam demissão em outros países.

A primeira foi a elaboração de um modelo estatístico para prever os resultados eleitorais, com vazamento direcionado a gestores da Faria Lima e à campanha de Bolsonaro, durante a eleição de 2022.

A segunda é a mais preocupante: em reunião com empresários do grupo Esfera, em maio deste ano, Campos Neto teria assegurado que os juros não cairiam na reunião de junho. Se ele é apenas um voto no conselho, como se arriscou a antecipar algo assim de forma privativa?

PASSOU EM BRANCO – O manual de conduta do Banco Central aconselha seus servidores a avaliar a legalidade de suas ações, bem como o dano potencial a outros e o constrangimento que estas causariam caso fossem noticiadas no jornal. Não houve qualquer indignação por parte de comentaristas quanto a essa violação da boa conduta.

Não surpreende, portanto, a indicação do presidente do IBGE mobilizar mais a imprensa do que as repetidas quebras de decoro por parte de Campos Neto. Afinal, o monetarismo farialimer tem sócios fiéis no jornalismo econômico.

Após a reunião, ventilou-se, levianamente, que o “erro do Copom” faria disparar o câmbio e as taxas de juros nos contratos longos. Houve até publicação com os perfis profissionais dos diretores ortodoxos, alimentando a porta giratória escancarada que recompensa o conservadorismo dos diretores do BC.

SERVIDORES SERVIS – O livro “Os Mandarins da Economia”, organizado por Adriano Cordato e Matheus de Albuquerque (Edições 70), analisa as capturas econômica e cultural de presidentes e diretores do BC por parte da Faria Lima. O livro ajuda a entender as deficiências da lei complementar 179/2021.

A autonomia do BC precisa de regulação detalhada sobre a conduta da diretoria, em particular as reuniões privativas com agentes de mercado, garantir a diversificação das fontes que informam o relatório Focus, bem como maior transparência sobre os custos fiscais da política monetária, entre outras mudanças.

É hora de o BC farejar, como diz Belchior, “o cheiro de nova estação” e incorporar a democracia em seus cálculos e condutas. Afinal, “o novo sempre vem”.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
É preciso oxigenar a equipe econômica e evitar que tenha dirigentes ligados ao mercado financeiro. Desde sempre os sucessivos governos entregam o galinheiro do Banco Central ao domínio das raposas da Faria Lima. Depois reclamam quando o governo tem péssima atuação, porque não consegue controlar a economia. Bem, este é o maior desafio brasileiro e precisa ser abertamente discutido. (C.N.)

15 thoughts on “Novos ares no Banco Central despertam “jus esperneandi” da turma da Faria Lima

  1. O populismo econômico voltou com força total. Da primeira vez a bomba estourou no colo da Dilma. Resta saber qual o próximo presidente, ou mesmo atual segurara a bomba.

    Parece que segurar os erros herdados é um bom negócio.

    https://www.cnnbrasil.com.br/economia/saiba-de-quanto-sera-o-salario-de-dilma-no-banco-dos-brics/

    O que vai saudar em Xangai. Lá não se cultiva mandioca.

    https://www.cnnbrasil.com.br/economia/saiba-de-quanto-sera-o-salario-de-dilma-no-banco-dos-brics/

    • Desculpem a repetição. É que quando tem mais e link vem uma mensagem de que o texto estava em análise, mas acabou sendo aceito, depois que o havia enviado por partes.

  2. Enfim, os juros são altíssimos porque o país é o mais perigoso do mundo.

    Não há o mínimo de segurança jurídica, a estrutura de poder é patrimonialista, os privilégios são absolutistas e os cargos do Judiciário e MP são a ineficiência seletiva e midiática dos proprietários de títulos de nobreza feudais que não servem a sociedade.

    • Isso mesmo. Os juros são uma variável que depende de inúmeros fatores.

      Torná-los como sendo o desejo do Príncipe, é um desastre.

      Acredito que essa rusga com o Campos Neto é de carácter puramente político, pra agradar a massa ignara que adoram seu totem e querem ver sangue, num ridículo movimento de exterminar os que lhes se opõem (algo herdado do fascismo e nazismo). Mas agora temos a chacina do bem, o patrimonialismo do bem, a corrupção e até os juros do bem. Trata-se de um maniqueísmo que mais parece brincadeira de crianças. No link abaixo, os juros do bem.

      http://noticias.r7.com/brasilia/lula-reclama-da-selic-mas-taxa-atingiu-o-maior-patamar-do-seculo-no-primeiro-mandato-petista-08022023

      Creio que se trata mais de querer acabar com a independência do BC, com o objetivo de controlar o Estado e seus poderes, como temos infelizmente assistido. Além de se criarem cargos para a militância profissional (no mal sentido).

    • Até a Rússia prática juros reais menores, somos mais perigosos que a Rússia?
      Então em vez de atacarmos as causas da nossa insegurança aos olhos dos investidores, vamos financiar lucros fabulosos aos abutres do sistema financeiro, drenando os investimentos para atividades que não geram nenhum emprego ou benefício para o país?

      • Estamos em um ciclo de queda e Campos Neto, saindo aos seus, anunciou com orgulho um pouso suave no lugar de uma recessão.

        Olho vivo neste governo remake.

        A queda nos juros é uma tendência secular, mas segue ciclos e o Brasil passou por um filme de terror recente de mais de uma década de crises após crises.

        Não há defensores dos juros altos.

        Mas há defensores da autonomia do Banco Central.

        O ciclo de queda forçada do Pombini no pesadelo Dilma (Freddy x Jason: Bolsonaro também o foi) desenhou um desastre.

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