
Cunha Bueno quer ter acesso às acusações a Bolsonaro
Ana Gabriela Oliveira Lima e Angela Boldrini
Folha
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) criticou o vazamento da íntegra da primeira parte da delação de Mauro Cid e chamou a investigação de “semissecreta”, sem acesso pleno dos advogados às informações. O depoimento do tenente-coronel à Polícia Federal em agosto de 2023 foi obtido pelo colunista Elio Gaspari.
O militar citou 20 nomes que estariam envolvidos na trama golpista, mas nem todos foram indiciados mais de um ano depois pelos crimes de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.
Indignação – Assinada pelos advogados Paulo Cunha Bueno, Daniel Tesser e Celso Sanchez Vilardi, a nota da defesa de Bolsonaro “manifesta sua indignação diante de novos ‘vazamentos seletivos’, assim como seu inconformismo diante do fato de que, enquanto lhe é sonegado acesso legal à integralidade da referida colaboração, seu conteúdo, por outro lado, veio e continua sendo repetidamente publicizado em veículos de comunicação”.
Os advogados afirmam que a divulgação da íntegra prejudica o direito de ampla defesa e que “às defesas é dado acesso seletivo de informações, impedindo o contexto total dos elementos de prova”.
“Investigações ‘semissecretas’ são incompatíveis com o Estado democrático de Direito, que nosso ordenamento busca preservar”, afirmam.
SOB SIGILO – Alguns pontos do primeiro depoimento de Cid já eram conhecidos —inclusive por terem embasado o relatório final da PF sobre a tentativa de golpe no entorno de Bolsonaro (PL)—, mas, até então, não era conhecida a totalidade do documento.
O ex-presidente é citado na delação, em que Cid afirma que Bolsonaro trabalhava com duas hipóteses para reverter o resultado da eleição de Lula. Uma seria encontrar fraudes nas urnas, o que um grupo próximo a Bolsonaro não conseguiu fazer, e outra seria convencer as Forças Armadas a aderirem a um golpe de Estado.
Citada por Cid, ao lado do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), como integrante do grupo mais radical que teria instigado o ex-presidente a dar um golpe de Estado, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro citou, em nota de sua assessoria, um discurso feito em novembro de 2023, quando ironizou a suspeita.
DISSE MICHELLE – “Eu, incitando golpe? Com qual arma? Minha Bíblia poderosa?”, afirmou Michelle na ocasião. “Eu sei dar golpe e quero ensinar para vocês agora: dou golpe, jab, jab, direto, cruzado, up, esquiva”, continuou a ex-primeira-dama, encenando golpes de boxe enquanto falava.
Segundo a nota, todos sabem o motivo para requentarem isso agora. “Esse governo e o sistema vivem de cortinas-de-fumaça para esconder a sua traição contra o povo. Estranho mesmo (e todos fingem que não veem) são esses ‘acessos’ a inquéritos sigilosos sendo que os advogados dos acusados são proibidos de acessar os dados para promoverem a defesa de seus clientes. Uma afronta à Constituição e aos Direitos Humanos”, afirmou.
O deputado Eduardo Bolsonaro, em publicação no X (antigo Twitter), disse que “Mauro Cid fez diversas delações, mudou sua versão várias vezes”.
SENADOR NEGA – Outro citado, o senador Jorge Seif (PL-SC), também se manifestou sobre o caso, dizendo serem “falaciosas, absurdas e mentirosas” as declarações de Cid. Seif foi classificado pelo tenente-coronel como parte da ala mais radical próxima ao ex-presidente, que o teria incentivado a tentar dar um golpe.
“Jamais ouvi, abordei ou insinuei nada sobre o suposto golpe com o presidente da República nem com quaisquer dos citados na delação vazada. O conteúdo do depoimento ilegalmente vazado é apenas uma opinião de “classificação” que me inclui de forma criminosa como parte de um grupo fictício, e não contém nenhum relato de fato específico sobre participação minha que jamais existiu”, afirmou Seif em nota.
Ele negou que tenha, em encontros com Bolsonaro, “abordado ou insinuado decretação de intervenção ou outras medidas de exceção, o que prova que o depoimento vazado é completamente inverídico”.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – É ilegal e revoltante o comportamento de Alexandre de Moraes, ao impedir que a defesa dos indiciados tenha acesso às investigações e às acusações. O pior é que essas ilegalidades ocorrem no Supremo, que se tornou uma vergonha nacional. O direito de defesa não pode ser cerceado por Moraes nem por ninguém. (C.N.)