Atividades de alto custo social, como jogos e drogas, deveriam pagar impostos mais altos

TRIBUNA DA INTERNET

Charge do Iotti (Gaúcha/Zero Hora)

Hélio Schwartsman
Folha

Moralismo não é o meu forte. Não me oponho ao jogo, nem às drogas, nem à prostituição. Desde que as partes não sejam forçadas por terceiros a fazer o que não desejem, não é função do Estado determinar o que as pessoas fazem com seu dinheiro, suas mentes ou seus corpos.

Daí não decorre que o poder público seja um completo desinteressado nessas matérias. Muitas vezes, é a coletividade que paga por decisões individuais que se mostrem custosas. O caso mais notório é o da utilização de drogas. Uma parte dos usuários acaba desenvolvendo problemas mais sérios, que incluem agravos à saúde física e mental e redução da produtividade.

É JUSTO TRIBUTAR – Como não me parece que seja o caso de abandonar dependentes químicos à própria sorte, deixando-os na sarjeta, acho que é mais justo tributar mais fortemente as atividades econômicas que geram esse tipo de problema do que jogar a totalidade dos ônus no caixa geral.

 Não é uma solução perfeita, mas é melhor que os usuários de drogas paguem proporcionalmente mais do que o conjunto da sociedade pelos problemas que elas causam.

Algo parecido vale para o jogo. Apostadores patológicos acabam gerando custos para o erário. É mais justo que a maior fatia dessa conta seja dividida com outros jogadores do que empurrada para o conjunto dos contribuintes, incluindo aqueles que não jogam.

ERRO DE CÁLCULO – Parece-me equivocada assim a MP do governo que estabelece para as apostas esportivas uma alíquota de impostos inferior à cobrada de atividades com menor custo social.

Pela proposta do governo, os jogadores pagarão uma alíquota de 18% sobre as receitas das apostas, descontados os prêmios. Pelo andar da reforma tributária, hospitais privados terão uma alíquota de 25%.

Se a ideia da reforma tributária é imprimir racionalidade ao sistema de impostos, começamos mal. Na maior parte do mundo civilizado, jogos e drogas pagam mais tributos do que atividades essenciais como a saúde.

De olho no futuro, vários partidos já abrem a disputa pela sucessão de Lira em 2025

Lula e Lira se reúnem às véspera de votação de PEC da Transição

Lula sabe que não aprova nada sem ter o apoio de Lira

Tatiana Azevedo
Gazeta do Povo

Partidos já começaram a se articular para a sucessão de Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Câmara dos Deputados, mesmo faltando um ano e meio para a próxima eleição que definirá o comando da Casa. Nomes do Republicanos e do União Brasil já despontam como os mais cotados e a tendência é que Lira consiga fazer um sucessor com apoio do governo petista.

Ninguém ainda fala abertamente sobre o assunto, mas a presidência da Câmara já é tema informal de algumas reuniões e conversas de bastidores, como nas rodas de bate-papo no Salão Verde da Câmara.

DOIS NOMES – Um deputado do Republicanos, que integra o bloco formado com MDB, PSD, PSC e Podemos e é próximo às lideranças, disse à Gazeta do Povo, em condição de anonimato, que já despontam nos bastidores os nomes do presidente do Republicanos, Marcos Pereira (SP), e do líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA), que integra o outro grande bloco formado por PP, União Brasil, Federação PSDB-Cidadania, PDT, PSB, Avante, Solidariedade e Patriota.

Nascimento, segundo ele, seria o preferido de Lira por ser do mesmo bloco partidário e amigo pessoal do atual presidente da Câmara – e do próprio governo.

Além disso, o líder do União foi um dos convidados por Lula para a comemoração realizada no Palácio da Alvorada depois de concluídas as votações da reforma tributária e do Carf.

FORAM PRÉ-CANDIDATOS – Tanto Pereira quanto Nascimento almejam a presidência da Câmara já há algum tempo. Eles se apresentaram como pré-candidatos nas eleições em 2021, mas acabaram apoiando Arthur Lira.

Os dois deputados não são garantia de “apoio” a Lula na Câmara, mas têm feito esforços para se aproximar do governo nos últimos tempos. Nascimento foi fundamental no convencimento da bancada do União horas antes da votação da reforma tributária.

O partido estava no centro da disputa pelo ministério do Turismo, e, depois de um anúncio da permanência de Daniela Carneiro no cargo, ameaçou adiar a votação.

FINAL FELIZ – Mas a resistência foi contornada em seguida pela confirmação da troca da ministra por Celso Sabino (PA), e Elmar Nascimento conseguiu garantir os votos de 48 dos 59 deputados da bancada, em favor da reforma.

E na disputa da sucessão de Lira ainda correm por fora os líderes do MDB, Isnaldo Bulhões (AL), e do PDT, André Figueiredo (CE), que tentam ganhar espaço na corrida pela presidência e são presenças fortes no Centrão.

Para o deputado do Republicanos ouvido pela reportagem, essa divisão de candidatos dentro do mesmo bloco partidário pode acabar gerando um “racha” nos blocos e embolando a disputa.

(Reportagem enviada por Mário Assis Causanilhas)

Livre-debate não pode aceitar participantes que tenham comportamento do tipo “robô”

Cartuns Alpino (cartunsalpino) - Profile | Pinterest

Charge do Alpino (Arquivo Google)

Duarte Bertolini

Contraditório, para mim, é a defesa de ideias diversas, com argumentos e fatos (se possível) ou então com valores e ideias. Aqui na Tribuna há muitos debatedores com um comportamento tipo robô, adotando posicionamento incondicional contra ou a favor de um dos ídolos polarizantes – Lula ou Bolsonaro.

Interessante é que todos os que não se alinham automaticamente a uma dessas duas maravilhosas opções a que chegamos no Brasil são imediatamente acusados de serem do outro lado, conforme a facção de quem está fazendo a crítica.

BARCA FURADA – Já disse muitas vezes. Eu era militante ativo do PT. Quando percebi a barca furada em que estava (pós 2002/2003) fui gradativamente abandonando a participação alinhada ao petismo, suas ideias e ideais.

Em 2018, votei em Bolsonaro pela convicção de que era necessário parar a soberba, a arrogância e a voracidade do PT. Foi outro erro de igual calibre, mas, pelo menos, interrompeu a consolidação da estrela no firmamento brasileiro.

Mas eis que na sua volta redentora, em 2022, tive a ilusão de que o PT e sua turma poderiam estar mudados e representar um prejuízo um pouco menor do que a continuação trágica de Bolsonaro.

NÃO APRENDEU NADA – Porém, como dizia Maluf, o PT “não esqueceu nada e não aprendeu nada”. A arrogância, a soberba, a militância agressiva e feroz, tudo isso continua ativo, e agora talvez mais azeitado, mais deplorável.

Bolsonaro está com seus direitos políticos cassados e, em consequência, com pouco poder e margem de manobra. Inclusive é réu de vários processos. Já condenado em um deles e com direitos políticos suspensos, é carta fora do baralho, pois a Justiça, a Polícia Federal e a imprensa não dão sossego, buscando lhe imputar os crimes praticados e também os imaginados…

Flávio Dino é ministro da Justiça e homem forte nessa política de vingança e terra arrasada contra quem ousou enfrentar a onda “democrática”. Seu papel é o de vingar Lula e livrar o PT de todos os dissabores, como se o ministro também fosse refém do passado petista. É pena.

Se for condenado, Trump não poderá ser candidato; uma questão moral de bom senso

Trump tentou  impedir a proclamação da vitória de Biden

Pedro do Coutto

Comentaristas da política americana têm levantado dúvidas se mesmo condenado pela Justiça (processos não faltam), o ex-presidente Donald Trump poderá concorrer às eleições de novembro de 2024 e ser eleito para um novo mandato na Casa Branca. Baseiam-se no fato de a Constituição dos Estados Unidos não prever a hipótese de tal impedimento.

Mas isso conduz a um universo interpretativo baseado num princípio moral de bom senso que impede que o homem que tentou fraudar as eleições de 2020 e impedir a proclamação da vitória de Joe Biden, possa novamente disputar a Presidência da República. Um absurdo completo que é facilmente identificado no princípio substantivo do bom senso e do direito comparado, pois se um criminoso comum é privado da liberdade, como proporcionar a um condenado incomum a liberdade de governar o país?

BOM SENSO – Não faz o menor sentido quando se pensa objetivamente sobre a atmosfera que envolveria a maior economia do planeta sob o comando de alguém que poderia encontrar-se recolhido à prisão. Direito, como disse há pouco, é uma questão de bom senso e que, naturalmente, fixa limites no comportamento humano. Não é possível, portanto, que um prisioneiro da Justiça encontre-se livre para dialogar – aqui vai apenas um exemplo – com presidentes de outros países. Como será possível um presidente prisioneiro encaminhar a mensagem anual ao Congresso do país?

Portanto, passando da hipótese não prevista na Constituição a que tal lacuna possa ser preenchida na prática, equivaleria, sem dúvida, a permitir a qualquer condenado judicialmente a ser candidato a algum cargo político. Não tem cabimento. Os leitores e as leitoras certamente já sentiram a atmosfera que seria gerada não só nos Estados Unidos, mas no mundo inteiro, se Donald Trump, condenado e preso, concorresse pelo partido Republicano e vencesse as eleições.

A sua posição no partido Republicano é bastante sólida. Pesquisas apontam um índice de aceitação de 61%. Mas, mesmo na hipótese de vencer a convenção partidária, levaria para a campanha eleitoral uma divisão capaz de derrotá-lo no caminho das urnas. Há divisões no Partido Republicano que poderiam abrir uma dissidência nas eleições que ele, Trump, ambiciona.

ACUSAÇÃO – Mas não é apenas este o caso. A questão é que Trump é acusado de buscar na Geórgia – estado de Jimmy Carter, que já foi presidente dos Estados Unidos –  votos fraudados para levá-lo a conquistar esse colégio importante para o desfecho final das eleições. A mais grave acusação contra ele está na invasão do Capitólio e no esforço para impedir a diplomação do vencedor, Joe Biden. No episódio, é bom lembrar, morreram cinco pessoas e o ato causou um repúdio geral nos países democráticos, exceção do Brasil, de Jair Bolsonaro à época, cujas correntes repetiram a investidas dois anos depois em nosso país.

Por todos esses fatores, sou de opinião que nem tudo que não está escrito na Constituição e nas leis pode ser praticado. Não há dispositivos, tampouco poderia haver, destinados a impedir crimes de morte, de roubo, de peculato, de assaltos. Não está escrito, mas as penas existem. Logo, o impedimento está caracterizado pelo fato em si, não pelo texto legal que os impede. Se assim não fosse, as Constituições dos países seriam livros intermináveis, estabelecendo minuciosamente todas as impossibilidades que caracterizam as sociedades organizadas e civilizadas.

A candidatura de Donald Trump torna-se impossível, não apenas em face do que o Partido Republicano vier a decidir, mas sim em função do que a Suprema Corte inevitavelmente venha a resolver. Os conflitos humanos são de uma amplitude enorme, mas as suas soluções dentro da lei têm que ser decididas pelo Poder Judiciário. Não é porque a lei não impede isso ou aquilo que homens e mulheres possam se julgar imunes aos princípios morais e éticos que regem o relacionamento entre as pessoas e também o relacionamento entre o poder e a sociedade. Trump infringiu e ultrapassou os limites do impossível. Com isso, tornou a sua nova candidatura inviável.  

CRÉDITO ROTATIVO – Numa reportagem na edição desta sexta-feira do Estado de S. Paulo, Bianca Lima focaliza divergências entre os bancos e as lojas comerciais de varejo quanto às taxas cobradas (absurdas) pelo sistema bancário. Os cartões de crédito chegaram este ano a cobrar juros de 437% por 12 meses. Não há quem consiga pagar dívidas assim.

Os casos de inadimplência se multiplicam, abrangendo 74 milhões de homens e mulheres. O governo tenta mediar o assunto, mas nessa escala de juros qualquer acordo torna-se impossível. É perder tempo. Medidas executivas têm que ser colocadas em prática.

Campos Neto é o melhor gestor público do Brasil e isso é insuportável para Lula

Campos Neto já ganhou reconhecimento internacional

J.R. Guzzo
Gazeta do Povo

O Banco Central decidiu reduzir a taxa de juros em 0,50 ponto percentual, depois de uma longa e paciente caminhada para combater as ameaças de disparada da inflação que apareceram junto com a Covid. Foi um combate extremamente bem-sucedido – pela primeira vez na história, a inflação anual do Brasil, em 2022, ficou abaixo da inflação dos Estados Unidos, da Alemanha e de outros exemplos mundiais de seriedade econômica.

Hoje está menor ainda. Pode haver uma prova mais clara de competência na gestão de um Banco Central? Os números mostram que não.

APROVAÇÃO MUNDIAL – A comunidade financeira mundial, que tem um julgamento neutro sobre as questões de estabilidade da moeda – e trabalha apenas com realidades, não com demagogia – deu aprovação unânime e vigorosa a tudo o que o Brasil tem feito para enfrentar a inflação.

Seu presidente, Roberto Campos Neto, foi eleito em 2022 como o melhor presidente de banco central da América Latina, por seu desempenho diante da desgraça geral da pandemia, da guerra da Ucrânia e outros traumas da economia global. O real é hoje uma das moedas mais estáveis do mundo, e as reservas internacionais do Brasil em divisas, atualmente em 350 bilhões de dólares, estão entre as dez maiores do planeta.

No Brasil de Lula, do PT e dos “economistas de esquerda”, porém, Campos é amaldiçoado todos os dias como o responsável único e direto por todos os problemas que possam existir na sociedade. Não há, naturalmente, fundamento técnico nenhum para essas agressões. O que há, desde o primeiro dia, é a desonestidade, a má fé e o uso deliberado da fraude como método de ação política que estão na alma de todos os governos Lula.

O JUDAS DO BRASIL – Lula decidiu, e o cardume de bajuladores-raiz que tem em volta de si foi atrás automaticamente, que o presidente do Banco Central tinha de ser o judas do Brasil. Jogam em cima dele todas as culpas por sua própria incompetência – e a sua incapacidade fundamental em resolver qualquer das dificuldades do Brasil, sobretudo as que eles próprios criaram.

Está ruim? A culpa não é nossa. É “do Campos”. Nunca tiveram a menor intenção de fazer um debate sério em relação aos juros, ou de apresentarem uma única ideia útil para a política monetária.

Em vez de discordar com respeito e com a sugestão de alternativas, o que seria a obrigação elementar de um presidente da República, Lula e o PT só fizeram insultos. Campos, a um momento, foi chamado de “este cidadão” por Lula.

CULPEM O CAMPOS NETO – No Brasil de Lula, do PT e dos “economistas de esquerda”, porém, Campos é amaldiçoado todos os dias como o responsável único e direto por todos os problemas que possam existir na sociedade

O problema do presidente do Banco Central é que ele é hoje, disparado, o melhor gestor público do Brasil – e não foi nomeado por Lula, não precisa dele para nada e, por lei, trabalha com autonomia em relação ao governo.

O rancor básico que comanda a cabeça de Lula, e a inveja rasteira que faz parte do seu DNA, o levaram a surtar de novo, no mesmo dia em que o BC baixava os juros – aliás, com o voto decisivo de Campos a favor na redução.

ENTENDER DE BRASIL? – O presidente da República acusou o presidente do BC de não entender nada “de Brasil” e “do povo”; disse, também, que não sabe quais os “interesses” que ele “defende”.

O presidente do Banco Central, para o interesse do cidadão, não tem de entender “de Brasil”. Tem de entender de estabilidade monetária – é esse o seu trabalho, e ele está fazendo seu trabalho melhor do que ninguém.

“O Banco Central brasileiro conseguiu um feito que tem sido perseguido por todas as autoridades monetárias globais: um pouso suave da economia, com controle da inflação”, disse a Goldman Sachs, um termômetro básico do consenso financeiro mundial. Lula não suporta ouvir essas coisas.

(Artigo enviado por Celso Serra)

Para que Lula faz governo “coração de mãe”, no qual sempre cabe mais um partido?

Charge do JCaesar | VEJA

Charge do JCaesar | VEJA

William Waack
Estadão

Lula 3 caminha para ser o governo coração de mãe, onde sempre cabe mais um. No caso, mais um partido numa mega composição governista em linha com a essência da política brasileira: a acomodação dos mais variados interesses privados e setoriais via cofres públicos.

Essa fórmula de amplo espectro nada tem a ver com um “pacto” ou uma “concertación” nacional diante de crises ou desafios importantes para o País. Ela espelha uma enorme dispersão de projetos, impulsos, problemas a serem resolvidos e linhas de atuação, sem uma clara direção central.

SALADA INÚTIL – Lula 3 quer gastar mais sem tributar mais, reindustrializar via Estado sem ter recursos suficientes, corrigir distorções sem mexer nelas, atender a interesses contraditórios (como na transição energética) sem antagonizar nenhum. As negociações com o Centrão expressam exatamente essa salada de linhas de atuação, sem que se possa esperar o “triunfo” decisivo de qualquer uma delas (incluindo as do PT).

Em linhas gerais, é o resultado permitido pelo sistema político brasileiro. Medido pela capacidade de gerar crescimento e prosperidade, esse sistema merece uma péssima nota.

O Brasil exibe produtividade estagnada há décadas e renda per capita na mesma distância em relação às economias avançadas há uns 40 anos.

É IMPOSSÍVEL MUDAR – Embutido nesse sistema político, o sistema de governo na prática impede qualquer “atuação transformadora”. Nesse sentido, Lula 3 e seus arranjos de governabilidade são um retrato nítido da incapacidade geral das instâncias políticas no Brasil de romper a paralisia e encontrar impulsos convergentes em torno de estratégias mais ou menos definidas.

Mas sobra distração política, e não se trata apenas da persistente polarização das bolhas e seus “fatos” políticos que só os adeptos de cada lado reconhecem. As demoradas tratativas para a distribuição de pedaços do governo Lula 3 entre mais de uma dezena de partidos sugerem que dessas minuciosas negociações sairia algo “decisivo” ou “definidor” por um bom tempo.

PARA QUÊ? – Essa ilusão se desfaz, porém, bastando perguntar “para quê?” Para que o partido “x” pretende o ministério “y”? Para que o partido “z” almeja os cargos de autarquias e estatais? A resposta é óbvia e não se trata necessariamente da oportunidade de praticar ilícitos.

Essas agremiações apelidadas de partidos consideram que participar de governos é o que garante em primeiro lugar a própria sobrevivência.

Esses acertos de participação e apoio em geral não envolvem discussões sobre ideias, plataformas, projetos ou políticas públicas. Por isso é sempre tão fácil achar lugar para mais um.

Ferreira Gullar avisava que determinadas coisas importantes não cabem em seu poema

Artes Depressão on Twitter: ""A arte existe porque a vida não basta"  Ferreira Gullar #ArtesDepressão #RIPGullar https://t.co/bvEUBUQG1H" /  TwitterPaulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, crítico de arte, teatrólogo, biógrafo, tradutor, memorialista, ensaísta e poeta maranhense José Ribamar Ferreira, o famoso Ferreira Gullar (1930-2016), explica por que “Não Há Vagas” para os dramas diários.

NÃO HÁ VAGAS
Ferreira Gullar

O preço do feijão
não cabe no poema.
O preço do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão.

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.

Como não cabe no poema
o operário
que esmerilha seu dia
de aço e carvão
nas oficinas escuras.
– porque o poema, senhores,
está fechado: “não há vagas”

Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço

O poema, senhores,
não fede
nem cheira.

O que impede que democracias consensuais não degenerem em corrupção e desgoverno?

Fortalecer a diversidade é fortalecer a democracia | Educamídia

Fortalecer a diversidade política significa fortalecer a democracia

Marcus André Melo
Folha

A Reforma Tributária enviada ao Congresso pelo regime militar, em 4 de novembro de 1965, foi promulgada 26 dias após sua apresentação. A natureza autoritária do regime foi essencial para o desfecho, mas não explica tudo; a Reforma Tributária brasileira — como a Previdenciária britânica — do governo Thatcher, foi aprovada em semanas. Em outros modelos de democracias, as reformas são processos negociados e morosos.

No Reino Unido, a proposta não poderia ter sido substancialmente alterada pelos relatores ou comissões congressuais.

OUTRO REGIME – A oposição no Reino Unido não conta com instrumentos de ação disponíveis em países com Legislativo descentralizado (ex. Brasil, EUA). A obstrução também não poderia vir de membros de coalizões governativas: o voto distrital leva ao bipartidarismo. E, por construção, o primeiro-ministro tem maioria.

Tampouco poder-se-ia questionar sua constitucionalidade (não há revisão constitucional) ou recorrer à uma Suprema Corte (porque inexistia tal instituição no país até 2009); o país sequer tem Constituição escrita.

O premiê britânico não é um “ditador parlamentar”: seu poder é institucional e partidário e o mandato não é fixo: quando Thatcher se tornou altamente impopular foi desafiada internamente e acabou levando o cartão vermelho do partido. Os conservadores ainda se mantiveram no poder. Majoritários na opinião pública, ganharam as eleições.

ALTA VOLATIVIDADE – Os sistemas políticos com autoridade política concentrada —modelos majoritários de democracia— exibem alto grau de “decisividade” (McCubbins): a capacidade de tomar decisões.

Mas há um trade off envolvido no desenho institucional: decisividade robusta está associada à alta volatilidade, que é incompatível com a previsibilidade necessária em certas áreas de política (regimes regulatórios, fiscais etc); “resolutividade”, nos termos daquele autor.

Assim, o ideal normativo de governança democrática combina capacidade de mudança e de estabilidade institucional ancorada em consenso sobre objetivos de longo prazo (algo presente no Reino Unido).

EXCESSO DE BARGANHAS – O nosso modelo institucional híbrido — que combina elementos majoritários e consensuais — exibe patologias como discutido aqui na coluna. Não é totalmente paralisante nem vertical. Mas é marcado por altos custos de transação e movimentos contraditórios.

Por um lado, imobilismo pelo excesso de barganhas oportunistas e comportamento rentista. Por outro, voluntarismo majoritarista, que se manifesta nas iniciativas curto-prazistas voltada para a blindagem de políticas, estruturas burocráticas e indivíduos, criando rigidez e ineficiências crônicas.

O que impede que democracias consensuais não degenerem em corrupção e desgoverno? Eis o nosso dilema institucional.

Empresa diz que pagou em dinheiro vivo à filha de Marco Buzzi, ministro do STJ

Montagem de fotos da advogada Catarina Buzzi e do pai dela, o ministro Marco Aurélio Buzzi, do STJ - metrópoles

Catarina, filha do ministro Buzzi, cobrou R$ 1,1 milhão

Luiz Vassallo
Metrópoles

Uma construtora sediada em Brasília acionou a Justiça do Distrito Federal para cobrar a devolução de R$ 1,1 milhão que afirma ter pago à advogada Catarina Buzzi, filha do ministro Marco Buzzi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por uma “consultoria jurídica” que não teria sido prestada.

No processo, obtido pelo Metrópoles, a Indústria de Mineração e Construção Brasil afirma que parte do pagamento, no valor de R$ 220 mil, foi feita em dinheiro vivo, no escritório de Catarina, em Brasília. O restante teria sido transferido para duas contas bancárias: a de uma administradora empresarial e a da banca de advocacia de uma parceira da filha do magistrado.

COMPRA DE IMÓVEL – A construtora diz que contratou Catarina para a “prestação de serviços de assessoria e consultoria jurídica” em uma disputa por um imóvel de R$ 6,3 milhões comprado dos Correios em leilão. O caso tramita na Justiça Federal de Minas

O ministro Marco Buzzi, pai da advogada, julga outras causas relacionadas a sócios da construtora. Em uma delas, da qual ele é relator, o magistrado foi acionado pelo time de advogadas da empresa, recentemente, para que se declarasse suspeito por causa da suposta dívida de sua filha.

A empresa ainda acusa a filha do ministro do STJ de fazer um “contrato verbal”, sem informar que ainda não tinha a carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Esse documento é exigido por lei para quem exerce a profissão de advogado. A negociação teria ocorrido em novembro de 2022. Aos 35 anos, Catarina só foi aprovada na OAB em janeiro deste ano. A empresa diz que vai fazer uma representação junto à entidade por exercício ilegal da advocacia.

OS PAGAMENTOS – A ação de cobrança foi ajuizada em julho, na 6ª Vara Cível de Brasília. Nela, a construtora anexou prints de mensagens de WhatsApp nas quais Catarina e uma parceira dela tratam do contrato e dos pagamentos.

O valor acertado — R$ 1,1 milhão — corresponde a 19% do valor da causa para a qual a empresa alega tê-la contratado. Todo o pagamento foi feito adiantado, segundo a empresa.

Para o mesmo serviço, após o distrato com a filha do ministro, um advogado foi contratado por R$ 20 mil. Ele só receberá mais R$ 1 milhão se tiver êxito na ação em Minas Gerais.

AGRADECE O DINHEIRO – Nos prints anexados ao processo, uma mensagem atribuída a Catarina mostra a filha do ministro agradecendo o envio do comprovante de uma transferência bancária no valor de R$ 300 mil: “Amém Jesus. Temos que ver como o senhor não explicar isso depois” (sic).

Em seguida, ela diz: “E o restante em dinheiro, o senhor me manda quando?”. O representante da empresa propõe que o valor seja pago na segunda-feira seguinte, por TED, ou na terça, em dinheiro. Ela responde: “Não. Terça em dinheiro tá ótimo”. A empresa afirma ter levado R$ 220 mil em dinheiro vivo para o escritório da filha do ministro.

Segundo a construtora, Catarina estava “ajudando” a empresa “para não dar problema”, o que justificaria a transferência de “valores maiores” à advogada. Em março de 2023, a empresa passou a dizer que nenhum serviço foi prestado e fez uma cobrança extrajudicial. No mês passado, acionou a Justiça.

DIVERSAS CAUSAS – Empresas da família dona da construtora têm diversas causas no Superior Tribunal de Justiça. Pelo menos três estão na Quarta Turma do STJ, responsável por julgar casos empresariais e de direito privado.

Em duas das causas, de 2022 e 2023, o pai de Catarina negou os recursos impetrados pela construtora. Ele ainda não decidiu se está suspeito, ou não, para julgar o processo que resta, movido pela ex-esposa do dono da empresa.

Procurado pelo Metrópoles, o empresário Wellington Chaves, filho do dono da Indústria de Mineração e Construção Brasil, afirma que Catarina e a sócia “receberam pelo que não fizeram” e admite que, embora o contrato tenha sido feito para uma atuação na Justiça Federal em Minas Gerais, eles conversaram também sobre processos no STJ, órgão do qual o pai da advogada é ministro.

SEM CONTRATO – “Sobre processos que envolvem o STJ, foi conversado e não se evoluiu nada. Qual era o primeiro serviço que ela tinha conosco, com a empresa do meu pai? Era esse que ela recebeu. Ficou de mandar o contrato e ficou o contrato verbal e o contrato nas mensagens. Nenhum outro processo evoluiu”, disse.

“Mandamos o dinheiro conforme ela pediu. Nesse modelo de negócio, não tem ninguém favorecendo ninguém. Foi contratado um serviço advocatício, o serviço não foi cumprido, e elas receberam pelo que não fizeram”, completa.

Procurada pelo Metrópoles, a advogada Catarina Buzzi afirmou que a história é fantasiosa. “As ilações apresentadas são inverídicas e infundadas. Serão todas desmentidas na Justiça. Lamentamos que esse tipo de denúncia vazia, destinada a constranger a honra e a imagem de advogados, continuem a repercutir”, afirmou.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Como dizia Tom Jobim, é a lama, é a lama, é a lama… (C.N.)

Nova denúncia é caso jurídico mais grave contra Donald Trump, que pode ser eleito

O ex-presidente Donad Trump durante campanha pela indicação do Partido Republicano em 2024

Trump tornou-se ameaça concreta à democracia americana

Deu em O Globo

A denúncia apresentada em Washington pelo procurador especial Jack Smith contra Donald Trump na terça-feira — a terceira que o tem como alvo desde o início do ano — é até agora o caso legal mais grave enfrentado pelo ex-presidente e pré-candidato republicano ao pleito de 2024. Paradoxalmente, o efeito nas intenções de voto dos americanos tem sido nulo, quando não favorável a Trump.

De acordo com as pesquisas mais recentes, ele ampliou nos últimos meses seu apoio entre os republicanos: foi de 49% para 54% dos eleitores prováveis das primárias na sondagem Siena publicada pelo New York Times. Seu principal rival, o governador da Flórida, Ron DeSantis, caiu de 26% para 17%.

EMPATE COM BIDEN –  Enquanto isso, na disputa presidencial contra o presidente Joe Biden, provável candidato democrata, Trump continua há meses empatado, num embate que, se confirmada a candidatura de ambos, promete ser decidido cabeça a cabeça.

Em tempos normais, qualquer político na situação de Trump não teria a menor chance de concorrer à Presidência outra vez. Pois ele não apenas deverá sair candidato, como tem chance de vencer. É uma incógnita o que acontecerá se for eleito e estiver condenado, já que não há nos Estados Unidos uma lei como a da Ficha Limpa.

Apenas se for julgado por violar a 14ª Emenda da Constituição, que pune quem se envolver em rebelião ou insurreição contra autoridades e leis federais, estará impedido de concorrer. É uma acusação rara, até agora não levantada contra Trump. Segundo algumas interpretações, porém, ela poderia derivar de uma condenação pela denúncia apresentada por Smith nesta semana.

CONSPIRAÇÃO – Para o procurador, Trump participou de conspiração para fraudar os Estados Unidos, obstruir a homologação oficial dos resultados da eleição de 2020 e privar os cidadãos de direitos civis previstos em lei.

É a primeira denúncia relativa ao período em que Trump estava na Presidência, mais especificamente entre a eleição, em 3 de novembro de 2020, e a invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021.

Nas duas denúncias anteriores, ele é acusado de falsificar registros relativos ao suborno à atriz pornô Stormy Daniels na campanha de 2016 e de irregularidades na guarda de documentos sigilosos depois de sair da Presidência.

AMEAÇA À DEMOCRACIA – A denúncia desta semana é considerada mais relevante por ter relação com a ameaça que Trump representa à democracia. Os trumpistas consideram, porém, tudo parte de uma “caça às bruxas” promovida para evitar a volta dele à Casa Branca e alimentam uma narrativa de vitimização que tem contribuído para sustentar sua popularidade.

Embora a sentença nos dois primeiros casos esteja prevista para o início do ano que vem, é certo que Trump recorrerá de qualquer condenação.

Portanto o julgamento das urnas deverá acontecer primeiro. É dele que, no fundo, dependerá o futuro da democracia americana.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Se Trump reassumir a Presidência e for preso durante o mandato, seus eleitores vão se revoltar e muita gente pode morrer nos embates. Quem poderia imaginar que isso pudesse ocorrer nos Estados Unidos? O problema é agravado pela oposição dos americanos à imigração, como ocorre também na Europa, um problema sem solução. (C.N.)

Tentativa de Cid vender o Rolex presenteado exibe o baixo nível da educação de Bolsonaro

Tudo joia, Bolsonaro?

Ilustração reproduzida do blog do Esmael

Lauriberto Pompeu
O Globo

O deputado Rogério Correia (PT-MG) fez um requerimento para convocar Maria Farani Rodrigues, ex-assessora da Presidência durante a gestão de Jair Bolsonaro. Ela aparece em uma troca de e-mails em que o tenente-coronel Mauro Cid tenta negociar a venda de um relógio da marca Rolex. Pelas mensagens não fica claro se ela é a destinatária final das mensagens ou se está intermediando o diálogo com alguém. A convocação não é unanimidade na base do governo.

Maria Farani foi assessora do Gabinete Adjunto de Informações do Gabinete Pessoal do presidente da República, em 2022, e, até junho deste ano, trabalhava no gabinete da senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que é integrante titular da CPI do 8 de Janeiro e foi ministra de Bolsonaro.

CONVERSA EM INGLÊS – O endereço de e-mail dela aparece em mensagens trocadas com Cid, que foi ajudante de ordens de Bolsonaro. A conversa é feita em inglês.

“Obrigado pelo interesse em vender seu rolex. Tentei falar por telefone, mas não consegui”, consta em uma mensagem enviada pelo e-mail Maria Farani no dia 6 de junho de 2022.

“Quanto você espera receber por ele? O mercado de rolex usados está em baixa, especialmente para os relógios cravejados de platina e diamante, já que o valor é tão alto. Eu só quero ter certeza que estamos na mesma linha antes de fazermos tanta pesquisa”, também escreveu Farani.

PRESENTE OFICIAL – Em resposta, Mauro Cid disse que o rolex nunca foi usado e citou que foi presente recebido durante viagem oficial.

“Nós não temos o certificado do relógio, já que foi um presente recebido durante uma viagem oficial”, afirmou. “Eu posso garantir que o relógio nunca foi usado. Pretendo vender por aproximadamente $ 60.000,00 (R$ 300 mil na cotação atual)”.

Um Rolex cravejado de diamantes aparece na relação de presentes recebidos pelo então presidente Jair Bolsonaro, em 2019. Pela troca de mensagens não há como saber se realmente se trata do mesmo relógio. Ele foi devolvido pela defesa de Bolsonaro em abril deste ano, após a Polícia Federal instaurar uma investigação para apurar outro conjunto de joias da Arábia Saudita, avaliado em R$ 5 milhões, retido pela Receita Federal no aeroporto internacional de Guarulhos (SP), conforme revelou o jornal O Estado de S. Paulo. O ex-presidente nega qualquer irregularidade.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG –
Em Provérbios 18:16, a Bíblia diz que “um bom presente desobstrui a passagem para aquele que o entrega, e o conduz à presença das pessoas que decidem”.  E qualquer pessoa com um mínimo de educação sabe que vender um presente é uma atitude deselegante e antiética. Portanto, pessoas como Jair Bolsonaro e Mauro Cid não têm a menor noção de ética, educação e elegância. São pessoas com almas desgarradas, que merecem desprezo absoluto. (C.N.)

CPI do 8 de Janeiro ouvirá Anderson Torres na terça e o hacker Delgatti na quinta-feira

Preso, Anderson Torres fala em Deus e apela à tática da vitimização

Petistas acham que Torres poderá trair Bolsonaro

Lauriberto Pompeu
O Globo

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro vai ouvir na próxima quinta-feira o hacker Walter Delgatti Neto. Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, irá prestar depoimento na terça-feira. A decisão foi tomada ontem pelo presidente da CPI mista, deputado Arthur Maia (União-BA).

Delgatti foi alvo de um mandado de prisão preventiva na última quarta-feira por suspeitas de tentativa de fraude nas eleições. Ele disse à Polícia Federal que o ex-presidente Jair Bolsonaro lhe perguntou se era possível invadir a urna eletrônica. O questionamento teria sido feito pelo então presidente no Palácio do Alvorada em um encontro ocorrido em agosto de 2022, conforme o depoimento de Delgatti.

A deputada Carla Zambelli (PL-SP), que foi alvo da mesma operação, manteve reuniões com o hacker. Endereços ligados à parlamentar foram alvos de mandados de busca e apreensão.

VAZA JATO – O hacker se notabilizou em 2019, após ser apontado pela PF como um dos responsáveis por invadir o conteúdo de mensagens dos celulares de autoridades dos Três Poderes.

Suplente da CPI, o ex-juiz responsável pela Lava Jato e senador Sergio Moro (União-PR), além de procuradores da força-tarefa da operação, estavam entre aqueles que tiveram suas mensagens divulgadas.

O episódio ficou conhecido como “Vaza Jato” e contribuiu para abalar a credibilidade da operação.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Nada de novo no front ocidental. Nenhum dos dois depoentes vai revelar algo de novo.  A CPI ouvirá o que todos já sabem e que nada tem a ver diretamente com os acontecimentos de 8 de janeiro. Assim, a política se consolida como espetáculo e o show tem de continuar. (C.N.)  

Oposição quer imagens para saber se Dino estava no seu ministério durante a invasão

O que diz Flávio Dino sobre a possibilidade de ser ministro do STF –  CartaExpressa – CartaCapital

Fica parecendo que Dino esta escondendo alguma coisa…

Francisco Leali
Estadão

O ministro da Justiça, Flávio Dino, foi procurado pela CPMI do 8 de Janeiro. Instado a liberar as imagens gravadas pelo circuito interno de câmeras do Palácio da Justiça na Esplanada dos Ministérios no dia dos ataques golpistas na capital federal, Dino esquivou-se.

Ao invés de entregar as gravações, avisou à comissão que era melhor pedir a outra autoridade porque os crimes praticados pelos extremistas no início do ano estão sob investigação.

TIPO JUIZ – O político Dino preferiu agir como juiz. Lançando mão de um artigo no Código de Processo Penal, seu ministério alegou que se o caso está em sigilo, a CPMI deveria pedir à autoridade que investiga se pode ou não divulgar as gravações.

Sabe-se que Dino é jurista há três décadas. Por 12 anos, foi juiz federal. Logo, pode dizer que de leis entende. Já na política partidária, entrou em 2006, quando foi eleito deputado federal. Depois virou governador de Estado e depois senador. Logo, na vida política também não é um neófito.

Esses silogismos simples não dão conta de como uma requisição aparentemente corriqueira da comissão parlamentar pode se transformar num problema maior do que deveria.

EM OUTRA PORTA – Ao dizer à CPMI algo do gênero “vá bater em outra porta”, Dino criou um caso que fez o presidente da comissão ameaçar recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para obrigar o ministro a entregar o que preferiu esconder dos parlamentares.

Talvez o motivo para a negativa disfarçada na frase “o requerimento deverá ser encaminhado à autoridade responsável pelos inquéritos policiais” esteja na autoria dos pedidos de informação despachados pela comissão ao Ministério da Justiça.

São cinco requerimentos, todos assinados por parlamentares da oposição. Os textos são siameses, para não dizer um copia e cola com os mesmos argumentos a dizer que o Ministério da Justiça tem uma posição privilegiada na Esplanada e as imagens gravadas ali ajudarão na investigação dos atos pela CPMI.

ELE ESTAVA LÁ? – Dino sabe que o alvo dos parlamentares oposicionistas é ele mesmo. Os bolsonaristas alimentam a teoria de que, lá do seu gabinete, o ministro assistiu tudo no 8 de janeiro e nada fez. Carente de comprovação fática, a suposição até então falaciosa levou os congressistas a buscar as imagens para tentar expor o ministro, crentes de que ele fora gravado chegando ao prédio no dia em que as sedes dos três poderes foram invadidas e depredadas.

Ainda que o ministro da Justiça tenha sido visto mais tarde nas imagens do Planalto gesticulando para o ministro da Defesa, José Múcio, como a cobrar pela inação das tropas naquela data, a oposição prefere dar vazão ao desejo de ver o subordinado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva num cenário ainda imaginário.

A CPMI deu prazo para o Ministério da Justiça entregar as imagens. Na quinta-feira, 8, Dino respondeu. Insistiu que não podia atender ao pedido. “O envio de documentos por esta pasta diretamente ao Poder Legislativo é impossível e poderá resultar no descumprimento de decisão do Supremo Tribunal Federal e comprometer investigações, gerando possível responsabilização deste remetente”, escreveu Dino.

CONSULTAR O SUPREMO – O ministro alegou, no entanto, que “por deferência” ao Congresso, foi consultar o STF para saber se pode entregar as gravações.

Assim, o tema foi arrastado para o campo jurídico por Dino que preferiu fechar os olhos ao que já é público e notório. Enquanto o ministro fala em cumprir o rigor da lei e não violar o segredo da investigação dos atos extremistas, a Presidência da República, o Congresso e o próprio STF não criaram caso algum sobre as imagens.

No dia 26 de junho, por exemplo, a chefia de gabinete da presidência seguiu caminho diverso de Dino. O que foi gravado pelo sistema de câmeras do Planalto e está no inquérito que apura os crimes de 8 de janeiro foi liberado para a CPMI, como, aliás, já tinha sido para a imprensa.

SEM SIGILO – A resposta da presidência não está em sigilo. Qualquer um pode ler o documento reproduzido acima. Está ali escrito que a comissão pode ter acesso às imagens por meio do drive https://drive.presidencia.gov.br/public/615ba7. O link ainda está ativo e quem quiser baixar é só clicar e esperar porque o arquivo está na casa dos gigabites.

A liberação dos vídeos pelo Planalto e até mesmo pelo próprio STF parece não coincidir com a lógica jurídica de Dino. Do contrário, alguém poderia questionar se essas duas instâncias agiram ao arrepio da lei.

Mas se as razões e não razões do ministro da Justiça para deixar de entregar as imagens são apenas políticas talvez tenham contribuído mais para alimentar a imaginação dos que advogam teorias do que para clarear as coisas.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG –
Vai ser interessante se nas imagens o ministro aparece assistindo a invasão da Praça dos Três Poderes, tomando uma cerveja e fumando um charuto. Vamos aguardar. (C.N.)

Lula agora enfrenta o desafio de ajustar contas públicas, sem reclamar dos juros

Charge: Batendo na taxa de juros - Blog do AFTM

Charge do Cazo (Arquivo Google)

Fernando Canzian
Folha

Confrontando a autonomia do Banco Central desde que assumiu a Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conseguiu o que queria: o início do processo de queda da Selic, reduzida em 0,5 ponto percentual nesta quarta-feira (2), para 13,25% ao ano.

Mas caberá ao seu governo prover as condições para que a queda nas próximas reuniões do Copom seja sustentada, sem que o descontrole atual das contas públicas siga colocando em risco a estabilização dos preços e da economia como um todo.

DENTRO DA META – Em desaceleração há vários meses, o IPCA registrou queda de 0,08% em junho, na primeira deflação de 2023, acumulando 3,16% em 12 meses. O indicador está dentro da meta para a inflação deste ano —de 3,25%, com tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.

Mas ainda há desafios não desprezíveis à frente: o acumulado em 12 meses para a inflação de serviços (setor que representa dois terços do PIB) foi de 6,21%, o dobro do IPCA.

Entre maio e junho, o núcleo de serviços acelerou de 0,32% para 0,53%, excluindo da conta passagens aéreas. Itens de peso como alimentação fora do domicílio também seguem pressionados.

NÚCLEO DA INFLAÇÃO – Segundo o último relatório do BC, o núcleo da inflação — que exclui preços que tiveram grande volatilidade em determinado período— segue acima de 6%, além do teto da banda de tolerância para o IPCA deste ano (4,75%).

Há, no entanto, alguns motivos para esperar um comportamento mais benigno para a inflação, com queda, ou pelo menos acomodação, nos preços de várias commodities — o que justifica a queda no juro real (acima da variação dos preços).

No caso do petróleo, no entanto, a Petrobras está operando com defasagem. Ou seja, os preços estão artificialmente contidos, o que mascara a desaceleração da inflação como um todo.

ALTA DEFASAGEM – No final de julho, a defasagem no preço médio da gasolina vendida nas refinarias da estatal em comparação com os preços internacionais chegou a 24%. Já o óleo diesel estava 21% abaixo, segundo a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis.

Há sinais também de que a economia pode perder tração neste segundo semestre. Por um lado, isso ajuda a conter a inflação. Por outro, pode implodir as perspectivas otimistas do Ministério da Fazenda em relação à redução do déficit fiscal e azedar as expectativas dos agentes econômicos

Dólar voltando ao patamar de R$ 4,80 e o índice Bovespa patinando ao redor de 120 mil pontos seriam sintomas dessa preocupação.

MAIOR RECEITA??? – Todo o ajuste fiscal previsto pela Fazenda baseia-se não em controle de gastos, mas na premissa de que o governo conseguirá um aumento brutal na arrecadação para diminuir o déficit neste ano e no próximo, recolhendo cerca de R$ 130 bilhões a mais. Nada disso está garantido.

Para 2023, ninguém acredita mais em um déficit de 1% do PIB. Para 2024, a meta depende do aumento de impostos ou de forte aceleração da economia. Se as perspectivas fiscais deteriorarem, não serão as reclamações de Lula que levarão à estabilização duradoura da economia.

Sobre o comportamento de Roberto Campos Neto nesse processo, registre-se que a alta dos juros começou no governo de Jair Bolsonaro (PL). Nos 12 meses até a eleição que o ex-presidente perdeu, a Selic praticamente dobrou, segurando a economia e reduzindo suas chances de vencer.

Omissão do GSI faz governo ser acusado de “armação” para que Planalto fosse invadido

Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense

No seu depoimento à CPMI dos Atos Golpistas, o ex-diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Saulo Cunha, complicou a situação do general Gonçalves Dias, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), quanto à omissão da segurança do Palácio do Planalto em 8 de janeiro. Cunha era o diretor em exercício da agência quando os palácios dos Três Poderes foram invadidos e vandalizados.

Ele declarou que avisou ao então ministro do GSI, general Gonçalves Dias, sobre os riscos de ocorrer a invasão. O ex-diretor da Abin disse que fez o alerta pessoalmente uma hora antes dos atos se concretizarem.

DISSE CUNHA – “Um pouco antes de a marcha começar o deslocamento, nós já tivemos informações de que havia, entre os manifestantes, efetivamente, um chamamento, inclusive estavam fazendo isso no carro de som, há relatórios aí, há fotos, para chamamentos para invasões de prédios, certo? Por volta das 13h, 13h e alguma coisa”, relatou.

O depoente foi contactado por um colega responsável pela segurança de um dos órgãos dos Três Poderes, muito preocupado com a situação, logo após a marcha ser iniciada. “E ele, inclusive, me pede para falar com o general G.Dias, e eu passo o contato do general. E ligo para o general G.Dias por volta das 13h30”, completou.

Cunha revelou que avisou ao então ministro do GSI sobre os riscos de ocorrer a invasão uma hora antes de os atos se concretizarem, mas o general pediu que remetesse diretamente aos seus auxiliares e não fizesse novos contatos com ele.

EXÉRCITO CONFIRMA – Essa informação coincide com o relatório do Exército, que responsabiliza o GSI pela falta de planejamento e pronta reação aos invasores, com o argumento de que a Guarda Presidencial não foi acionada. G. Dias acabou no fogo cruzado entre seus colegas de caserna e a Abin. Sua oposição é, no mínimo, ambígua em relação ao que estava ocorrendo.

Os dois responsáveis diretos pela defesa do palácio em 8 de janeiro eram oficiais indicados pelo general Augusto Heleno, chefe do GSI do governo Bolsonaro, mantidos por G.Dias.

O relatório do Exército responsabiliza o general Carlos Feitosa Rodrigues, ex-secretário de Segurança e Coordenação Presidencial, e o coronel Wanderli Baptista da Silva Junior, ex-chefe do Departamento de Segurança Presidencial, por não terem levado em consideração as informações da Abin e acionado as tropas do Exército.

GENERAL “BOA PRAÇA” – Como há fortes suspeitas de que havia uma conspiração golpista com participação de militares que assessoravam diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro, o depoimento de Saulo Cunha deixou Gonçalves Dias numa saia justa.

 Gozava de plena confiança do presidente Lula, de quem cuidou da segurança na Presidência nos dois primeiros mandatos. Mas sempre teve um espírito de comandante “boa praça”, como ficou demonstrado na greve da Polícia Militar baiana, em fevereiro de 2012, no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.

Na ocasião, comandava a 6ª Região Militar, da qual acabou afastado por fraquejar na operação militar montada para debelar o motim da PM da Bahia. Foi afastado da chefia da operação pelo comandante do Exército, general Enzo Martins Peri, que deslocou para o estado o general Odilson Sampaio Benzi, comandante militar do Nordeste.

LÁGRIMAS NOS OLHOS – O motivo foi sua confraternização com os grevistas em frente à Assembleia Legislativa baiana, ocupada pelos manifestantes, alguns deles com ordem de prisão decretada pela Justiça. Dirigindo-se a um grupo de PMs, com lágrimas nos olhos, Gonçalves Dias disse: “Não vai ter combate, não vai ter invasão, não vai ter nada”.

O general fazia aniversário e aceitara um bolo dos grevistas, em sua homenagem. O choro do general frente às câmeras de tevê foi desmoralizante e convenceu o Alto Comando do Exército de que lhe faltava liderança.

O 8 de janeiro foi outro “case” de falta de liderança. As imagens gravadas pelas câmeras de segurança do Palácio do Planalto mostram uma atuação apaziguadora e até condescendente com os invasores por parte do militar, em meia à desorientação dos responsáveis pela segurança física da Presidência.

ABSURDO TOTAL – Uma discussão entre um oficial do Exército que comandava a guarnição do palácio e um oficial da Polícia Militar, que deu voz de prisão aos invasores, é outra prova cabal de que nada funcionou direito.

À paisana, a maior preocupação de Gonçalves Dias quando chegou ao Planalto parecia ser muito mais com a integridade física dos invasores do que com a proteção do patrimônio público e a defesa da inviolabilidade de um poder constituído democraticamente pelo povo, cujo valor é altamente simbólico.

A omissão do GSI em 8 de janeiro agora é o principal argumento da oposição na CPMI, que acusa o próprio governo de uma “armação” para que o Planalto fosse invadido. O comportamento de Gonçalves Dias, segundo eles, corrobora a tese, o que não é o caso. Mas é difícil acreditar que o então chefe do GSI não soubesse o que aconteceria. Estava suficientemente informado pela Abin.

Lula quer mudar as quatro linhas e limitar ação dos militares em crises no artigo 142

Charge do JCaesar | VEJA

Charge do JCaesar | VEJA

Fabio Victor
Folha

O governo Lula (PT) prepara uma alteração da legislação sobre o emprego das Forças Armadas durante crises de segurança e ordem pública ou de instabilidade institucional. A proposta elimina o atual modelo de operações de garantia da lei e da ordem (GLO).

Embora nos últimos anos o recurso às chamadas GLOs tenha, na maioria dos casos, buscado sanar problemas de segurança pública, os ataques golpistas de 8 de janeiro e a distorção com viés político do artigo constitucional que trata das atribuições das Forças Armadas nessas operações levaram o Executivo a buscar uma resposta política. Na prática, um modo de tentar limitar o poder dos militares em crises domésticas de toda ordem.

NAS QUATRO LINHAS – Pela proposta concebida pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, em parceria com o titular da Defesa, José Múcio, não haveria mudanças no artigo 142 da Constituição, que trata das competências das Forças Armadas, mas na Lei Complementar que o regulamenta (nº 97, de 1999).

A intenção é criar no texto a possibilidade de as Forças Armadas cooperarem eventualmente em crises de segurança e ordem pública sem que seja necessário para isso a decretação de GLOs.

A princípio, haveria mexidas nos artigos 15 (que trata do emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem) e 16 (sobre atribuição subsidiária das Forças Armadas) da Lei Complementar de 1999.

SEM PEC – A alteração teria de passar pelo Congresso, mas sem as exigências de tramitação de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição). Estuda-se a possibilidade de mudanças correlatas serem feitas via decreto presidencial.

Não há apoio político no Congresso para alterar o próprio artigo 142 da Constituição, como propõe uma PEC do deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP).

Para aprovar uma emenda constitucional são necessários três quintos dos votos em dois turnos, tanto na Câmara quanto no Senado – no caso, uma quimera, num Congresso de extração conservadora, com uma Câmara presidida por Arthur Lira (PP-AL), que foi eleitor de Jair Bolsonaro.

SEM BRIGAS – Não há tampouco disposição do governo em comprar uma briga desse porte com os militares, que são frontalmente contra a alteração do artigo 142, em meio a outras prioridades do Planalto, sobretudo a agenda econômica.

As movimentações do Executivo desidratam a PEC de Zarattini, anunciada em fevereiro como resposta aos ataques de 8 de janeiro.

A PEC de Zarattini, que condensou proposta convergente do colega Alencar Santana (PT-SP), propõe retirar do texto constitucional a competência dos militares de garantir os poderes constitucionais e a lei e a ordem (artigo 142).

PODER MODERADOR – Para além do escopo amplo, que dá poder excessivo aos fardados, tais atribuições foram distorcidas nos últimos anos por bolsonaristas para sustentar que as Forças Armadas poderiam atuar como “poder moderador” em crises institucionais – uma interpretação já repelida pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Congresso Nacional.

Pelo entendimento de Zarattini e de boa parte do PT, o artigo alterado diria apenas que as Forças Armadas “destinam-se a assegurar a independência e a soberania do país e a integridade do seu território”.

Para que a PEC comece a tramitar na Câmara, são necessárias 171 assinaturas. Zarattini ainda não as tem e retomou a tarefa de reuni-las a partir desta semana, no reinício dos trabalhos da Casa após o recesso.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Vão mexer no que está correto. É preciso que as Forças Armadas atuem em caso de desordem interna, como já aconteceu nos casos das PMs que entraram em greve a abandonaram o policiamento, irresponsavelmente. Mas quem se interessa? (C.N.)

Carla Zambelli entregou a Moraes a arma que ele precisava para destruir Bolsonaro

Zambelli sinaliza trégua a Moraes e racha com Bolsonaro

Zambelli levantou a bola para Moraes encestar Bolsonaro

Malu Gaspar
O Globo

Assim que surgiram as primeiras informações a respeito da operação da PF que teve como alvos a deputada federal Carla Zambelli e o Walter Delgatti Neto, o hacker da Vaza Jato, os advogados de Jair Bolsonaro enviaram uma ordem unida ao ex-presidente e a Valdemar Costa Neto, presidente do partido: submergir. Na avaliação dos times jurídicos que assessoram o presidente, a operação de quarta-feira é potencialmente mais perigosa do que as anteriores envolvendo Bolsonaro, por dois fatores.

O primeiro é que ninguém sabe exatamente o que Zambelli escreveu em mensagens ou disse a Delgatti Neto a respeito de Bolsonaro, do governo e da campanha eleitoral e ainda, o que ela pode ter feito que poderia levar à sua cassação. O segundo fator de risco é o próprio hacker, que está negociando com a PF uma delação premiada que teria como principal atrativo aos investigadores a possibilidade de comprometer em definitivo o ex-presidente com a trama golpista na eleição de 2022.

TAMANHO DO ESTRAGO – Enquanto não se puder avaliar o tamanho do estrago que a operação deve causar, a orientação é para que nem Valdemar nem Bolsonaro dêem nenhuma declaração e nem participem de eventos públicos. Além disso, a defesa do ex-presidente já decidiu que não vai deixá-lo depor antes que venha a público a versão definitiva de Delgatti Neto a respeito do episódio.

Bolsonaro, aliás, só vai se reunir com seus advogados na semana que vem. Nos bastidores, ele vem dizendo a aliados que não pediu nada ao hacker além de informações e que não fala com Zambelli há meses.

Já a deputada enviou recados nos últimos dias à cúpula do PL de que “não fez nada de errado” e que não teme que surja nenhuma nova prova contra ela ou contra Bolsonaro.

JÁ ERA ESPERADO – A equipe da coluna apurou que Zambelli já dava como certo há meses uma operação da Polícia Federal contra ela, desde que veio à tona o seu papel na articulação de um encontro do hacker com Bolsonaro no Palácio da Alvorada para armar um plano contra Alexandre de Moraes.

Com o fim do governo Bolsonaro e o fracasso dos atos golpistas de 8 de janeiro, aliados do ex-presidente passaram a se sentir mais vulneráveis a investigações de Moraes, o que ajuda a explicar por que os agentes da PF encontraram o gabinete de Zambelli “limpo”, sem computador de uso da parlamentar, conforme informou o blog da jornalista Andréia Sadi, no G1.

“O Daniel Silveira foi preso só por xingar e ofender o Moraes. A prisão dela é só uma questão de tempo”, afirma um interlocutor de Bolsonaro.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
– Vejam bem o que é a certeza da impunidade. O hacker Delgatti, ao invés de ser considerado um criminoso, era cultuado pela classe política por ter destruído a Lava Jato. A tal ponto que Carla Zambelli não teve dúvida de levá-lo ao encontro do então presidente Bolsonaro, que aceitou recebê-lo com todas as honras.

Com isso, Zambelli municiou Moraes para acabar de destruir Bolsonaro. Agora, o hacker fará delação premiada e apenas confirmará o que já se sabe que Bolsonaro e Zambelli pediram que invadisse as urnas eletrônicas. Fim de jogo. A deputada entregou tudo o que Moraes precisava. (C.N.)  

Na nuvem do Banco Central, Selic e inflação descem, mas juros reais sobem

Charge do Sinfrônio (humornanet.com)

Pedro do Coutto

O Banco Central reduziu de 13,75% para 13,25% os juros da taxa Selic que se mantinham elevados há praticamente três anos. O voto de desempate, surpreendentemente, foi de Roberto Campos Neto, que comandava a resistência a qualquer recuo da taxa. Tornou-se assim alvo do presidente Lula e do governo, pois se transformou num verdadeiro líder da oposição no universo monetário no país.

À primeira vista, a decisão foi recebida com alívio, um avanço para facilitar o acesso ao crédito tanto por parte das empresas que querem investir quanto da população que deseja consumir. Entretanto, examinando-se bem a questão, verifica-se que a influência da redução de 0,5% não alcançará efeito concreto na distensão de uma política de concentração de renda. Isso porque vamos comparar os números mais recentes entre a inflação e a Selic fixada pelo BC.

JUROS REAIS – Dentro da relatividade, constatamos que em 2021 para uma inflação de 10,6%, a Selic alcançou 13,75%. Logo, os juros reais estão em cerca de 3%. Em 2022, o IBGE estimou a inflação em 5,7%, e a Selic continuou em 13,75%. Os juros reais foram de 8% ao ano. Agora, na previsão para 2023, a inflação está calculada em 3,2%. A Selic passou para 13,25%. Portanto, os juros reais do mercado subiram e não desceram, atingindo dez pontos percentuais. Não há como negar esse resultado. Continua a ser ótimo para que o pequeno grupo de empresas e pessoas mantenham lucros elevados fomentando a política de concentração de renda.

A posição assumida por Campos Neto, elogiada por Fernando Haddad, é apenas uma cortina de fumaça para ocultar a verdadeira face da questão. Devemos observar paralelamente que o governo Lula não tocou em salários e a remuneração do trabalho humano. Pelo menos numa escala que não perca para o processo inflacionário é fator decisivo para o combate à fome, à insegurança alimentar e para o desenvolvimento social do país.

A compressão social era tão grande que se refletiu no número de 74 milhões de pessoas com dívidas vencidas a pagar. O governo teve que desencadear a operação “Desenrola” para aliviar uma situação que também inclui o risco de se eternizar, pois uma vez reabilitados no crédito, uma tendência inevitável será a de que uma parcela muito grande da população venha a contrair novas dívidas. A propaganda é intensa nesse sentido e os apelos são fortíssimos ao consumo e ao acesso aos cartões de crédito.

OFENSIVA – Os bancos mantêm a ofensiva da oferta dos cartões, não se incomodando muito com o cadastro das pessoas que possam contratá-los. O problema, assim, continua e a nuvem sobre o Bacen, a qual me refiro, assemelha-se às nuvens brancas do inverno que tornam o panorama de rara beleza em que permitem que o sol chegue suavemente nas praias, nas praças e nas ruas das cidades.  

A sensação do sol de inverno assemelha-se à da redução nominal dos juros da Selic, mas é preciso confrontar os juros da Selic com a inflação, uma vez que eles são feitos para remunerar credores e investidores dos títulos que lastreiam uma dívida interna de R$ 6 trilhões. A resolução do problema social brasileiro não avançou com a falsa diminuição dos juros cobrados. Ao contrário, representa um artifício conservador para transmitir uma sensação de falso avanço nas contas públicas.

ASPECTO POSITIVO – As reportagens foram amplamente publicadas na imprensa. Na Folha de S. Paulo, foi de Nathalia Garcia, no O Globo, de Renan Monteiro, e no Estado de S. Paulo, de Thaís Barcellos e Eduardo Rodrigues. Míriam Leitão em seu artigo no O Globo, focaliza bem o tema e destaca como um aspecto positivo a perspectiva de reduções seguidas de meio ponto percentual.

Cada meio ponto percentual, acentuo, equivale a uma redução de R$ 30 bilhões nas despesas do Tesouro com os juros da dívida. A projeção de juros até o final deste ano é observada também por Juliana Causin e João Sorima Neto, O Globo. A perspectiva é favorável, creio, inclusive, que seja a única possível. A força do mercado é muito grande e esse mercado, conforme já me referi, pode ser simbolizado na mão de um tigre.

ZAMBELLI – A deputada Carla Zambelli levou o hacker Walter Delgatti ao encontro do ex-presidente Jair Bolsonaro numa tentativa de fraudar as urnas das eleições de outubro e de preparar uma armadilha para o ministro Alexandre de Moraes. A Polícia Federal, diante das afirmações de Zambelli, quer ouvir novamente o ex-presidente da República.

No O Globo, a reportagem é de Paola Serra, Daniel Gullino, Eduardo Gonçalves e Daniel Saboya. Na Folha de S. Paulo, de Fábio Serapião. No Estado de S. Paulo, escreveram Pepita Ortega e Levi Teles.

ENCONTRO – Walter Delgatti, inclusive, diz ter se encontrado com Jair Bolsonaro no Palácio Alvorada, levado por Carla Zambelli. Delgatti é investigado por vazamento de dados da Lava Jato e outras atividades ilegais na internet. Não conseguiu penetrar nas urnas eletrônicas, principalmente porque elas não estão interligadas ao sistema eletrônico das redes sociais.

Estava tentando, sem conseguir, acessar dados pessoais do ministro Alexandre de Moraes. Como é possível, cabe a pergunta, o então presidente da República receber o hacker no Palácio Alvorada? Surgem novos caminhos que levam à invasão de Brasília e à tentativa de um golpe contra o presidente Lula.

Ricos emprestam a juros ao nosso governo o dinheiro que não pagaram em tributos

Juros

Charge do J. Bosco (O Liberal)

André Roncaglia
Folha

O Brasil é um dos países mais desiguais do planeta. O poder econômico se converte em poder político para blindar a riqueza hiperconcentrada. A influência dos ricos sobre a política econômica busca proteger o valor real de seu patrimônio, enquanto a interferência sobre o processo legislativo visa a isenções tributárias e ao alívio da regulação estatal.

A resistência à reforma dos tributos indiretos (sobre consumo) revela bem a força desses grupos de interesse, os quais impõem regimes especiais que isentem seus negócios da mordida do fisco.

MEXER NO VESPEIRO – Mas é na tributação direta da renda e da riqueza que a temperatura sobe. Equilíbrio fiscal com maior justiça tributária exige “colocar o rico no Imposto de Renda”. Mexer nesse vespeiro aguça os mais selvagens instintos de autoproteção da turma endinheirada.

Ao ameaçar eliminar a isenção dos fundos de investimentos exclusivos, Fernando Haddad desnuda o pilar essencial de uma plutocracia, a saber: os ricos emprestam a juros para o Estado o dinheiro que não pagaram em tributos. Parece exagero, mas não é.

A Receita Federal divulga anualmente os Grandes Números do Imposto da Renda Pessoa Física (IRPF): uma radiografia do topo da distribuição de renda no Brasil. Os números são estarrecedores.

LUCROS E DIVIDENDOS – Recente reportagem de Idiana Tomazelli na Folha mostrou que o acúmulo de lucros e dividendos declarados bateu R$ 555,7 bilhões, um crescimento de 44,6% entre 2020 e 2021. Deste total, R$ 411 bilhões ficaram nas mãos do 1% mais rico, e R$ 117 bilhões, com o 0,01% no topo. Essa fonte de renda representa 36% do total de rendimentos isentos de IRPF em 2021.

O aumento incomum não foi fruto de um surto de lucratividade das empresas, mas uma reação evasiva à retomada da tributação de lucros e dividendos distribuídos à pessoa física, com alíquota prevista de 15%.

Além de não poupar a saúde do trabalhador nem o meio ambiente, a ganância patológica do velho extrativismo investe também contra nossas empresas. Caso exemplar desse movimento foi a Petrobras distribuir mais dividendos que todas as empresas juntas em 2022.

MEDO DO COMUNISMO – Felizmente, para os super-ricos que adoram uma “inconsistência contábil”, a proposta de Guedes morreu antes de chegar à praia. Em tempo: o medo do comunismo deve ter motivado o aumento de 34%, entre 2020 e 2021, nas heranças e doações —R$ 148 bilhões, também isentas de IRPF.

As rendas não tributáveis e aquelas sujeitas à tributação exclusiva representam 95% dos rendimentos do 0,01% mais rico do Brasil. A renda anual dessas 2.342 pessoas varia de R$ 20 milhões a R$ 22 bilhões. Sim, bilhões! O patrimônio declarado desse grupo soma R$ 2,33 trilhões (você não leu errado). Esse valor representa 62% da riqueza do 0,1% mais rico e 40% do total detido pelo 1% no topo.

Como nem todo patrimônio tem valor de mercado atualizado, esses dados estão provavelmente subestimados. Traduzindo: a concentração de riqueza entre os ricos no Brasil é obscena: uma verdadeira plutocracia!

INJUSTIÇA TRIBUTÁRIA – A dissertação de mestrado de Jonathan Vieira Lopes (Unifesp) analisou a progressividade do Imposto de Renda sobre rendimentos do trabalho e do capital. Os mais ricos (R$ 4 milhões por ano) pagaram, em 2020, alíquota média de 2% sobre as rendas do trabalho, ante 10,6% de quem ganha entre R$ 250 mil e R$ 370 mil por ano.

No caso dos rendimentos de capital, os mais ricos pagaram mais impostos, mas com uma alíquota efetiva muito baixa (1,98% em 2020); já o fisco arrecadou R$ 31 bilhões de um total de R$ 3,3 trilhões desse tipo de rendimento.

Enfraquecer a plutocracia brasileira requer ampliar a tributação dos rendimentos do capital. O fim da isenção de lucros e dividendos é o primeiro passo para ter maior justiça tributária e proteger a nossa democracia.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
André Roncaglia é professor de Economia da Unifesp e doutor em Economia do Desenvolvimento pela FEA-USP. Um especialista de tal porte jamais será chamado para ser ministro, por motivos óbvios. O PT diz representar os trabalhadores, mas na verdade representa as zelites, que sabem agradar aos socialistas refinados. É pena. (C.N.)

Aliança com Centrão é compensada por Lula com insensatos acenos à esquerda

TRIBUNA DA INTERNET | Brasil é refém do Centrão, que mantém tudo dominado,  não importa quem seja o “eleito”

Charge do Duke (O Tempo)

Dora Kramer
Folha

Os preparativos para a entrada oficial do Centrão no governo exibem movimentos interessantes. A negativa do presidente Luiz Inácio da Silva, por exemplo, sobre a inexistência do bloco. “O Centrão não existe”, pontificou.

Ora, não apenas existe como detém a maioria dos votos no Congresso, matéria-prima de interesse do Planalto. Trata-se, no entanto, de uma aquisição que demanda compensações à esquerda pela perda de um antagonista de estimação.

TROCAS DE INSULTOS – Na falta desse antagonista, há sempre à disposição Jair Bolsonaro para trocas de insultos (a mais recente acerca de jumentos) com Lula ou um Roberto Campos Neto a quem se pode chamar de “capacho” e “lacaio” do capital sem maiores consequências.

Fica bonito na foto para a arquibancada. Distrai a torcida enquanto se negociam ministérios ao arrepio da qualificação profissional dos candidatos e se jogam ministros na bacia das almas, expostos ao entra e sai de frigideiras sob a alegação de que não têm votos.

Quem os têm é o Centrão, que está mais vivo do que nunca. Daqui deste canto, nada contra deputados e senadores escolhidos de maneira limpa e legítima para representar seus eleitores. Quem se encabula da convivência é quem lhes nega a existência mediante um reposicionamento de marca para justificar a união.

DOIS EXEMPLOS – Dessa espécie de política compensatória há mais dois exemplos recentes. A imposição de Marcio Pochmann para a presidência do IBGE, estranho no ninho da equipe e visto na área econômica como um ideólogo da obsolescência.

Outro, a bravata presidencial sobre a extinção dos clubes de tiro, rapidamente legendada pelo ministro da Justiça em tradução para fechamento dos estabelecimentos “ilegais”. E a direita logo se apropriou de argumento (falso) para combater o pacote das armas.

A arte do equilibrismo de resultados requer destreza para não deixar que o Centrão entre por uma porta e o juízo saia pela outra.